O INESPERADO E
A SURPRESA
Rui Martinho Rodrigues*
A imprevisibilidade dos acontecimentos é parte da condição de
sujeitos, autores da ação expressa pelo verbo. Existissem leis regulamentando nossos
atos não seríamos sujeitos. Tendências representam realidades da condição
humana, mas sem o determinismo das explicações nomológicas. O advento da
imprensa potencializou a influência dos intelectuais. Ao surgimento das
enciclopédias e jornais seguiram-se, não muito depois, a Revolução Francesa e um
período ao qual Eric John Ernest Hobsbawm (1917 – 2012) chamou "a era das
revoluções", de 1789 a 1848. Foi uma tendência, no período aludido, em face de
circunstâncias. Não houve, porém, determinismo histórico. Nas mesmas condições
não houve revolução em muitos lugares.
O rádio, juntamente com a grande crise de 1929, foi contemporâneo
de uma safra de líderes autoritários e totalitários. A era digital, com um
dilúvio de informações, desnudou a falibilidade humana de líderes, pensadores e
formadores de opinião. Partidos, entidades da sociedade civil e até instituições
jurídico-políticas sofreram grande desgaste.
Paul Bede Johnson (1928 – ?), na obra Os intelectuais, apresenta
dezenas de grandes pensadores, revelando graves falhas de caráter de todos
eles. O público não era informado disso antes da era digital. Intelectuais,
especialistas, doutores e formadores de opinião caíram do pedestal. Ficou
evidente que não são sábios, mas sabidos. O argumento de autoridade, que
apoiava as doutrinas de tais personagens, já não intimida alunos e o público em
geral. Ouvi de alguém: “não tenho que acatar o que esses degenerados dizem”.
Mundo afora, eleições consagraram candidatos sem apoio de grandes
partidos, sem a aura de intelectual ou de especialista em problemas econômicos
ou sociais, sem talento de orador e, em ao menos em um caso, sem dinheiro, além
de serem contra todos os formadores de opinião, sendo também inábil. Foi
surpresa.
Alfredo José da Silva (1929 – 2010), nome artístico Johnny Alf, cantou a surpresa dizendo: “Fica, ó brisa, fica pois talvez quem sabe,/ o inesperado faça uma surpresa,/ e traga alguém que queira te escutar” (Eu e a brisa). A opinião pública já não é a opinião publicada, como dizia W. Churchill (1874 – 1965). O povo ouviu o conselho do compositor, esperou o inesperado e veio a surpresa: alguém disposto a escutar e a falar a sua linguagem, com os seus sentimentos, valores, sem os sofismas dos grandes pensadores.
Alfredo José da Silva (1929 – 2010), nome artístico Johnny Alf, cantou a surpresa dizendo: “Fica, ó brisa, fica pois talvez quem sabe,/ o inesperado faça uma surpresa,/ e traga alguém que queira te escutar” (Eu e a brisa). A opinião pública já não é a opinião publicada, como dizia W. Churchill (1874 – 1965). O povo ouviu o conselho do compositor, esperou o inesperado e veio a surpresa: alguém disposto a escutar e a falar a sua linguagem, com os seus sentimentos, valores, sem os sofismas dos grandes pensadores.
Os delírios românticos influenciaram a política e a sociedade, conforme
Isaiah Berlin (1909 – 1997), na obra Ideias Políticas na Era Romântica. O
romantismo não é apenas o doce amor de Romeu por Julieta. É dado ao titanismo,
um voluntarismo exacerbado, que desconsidera os fatos e perde contato com a
realidade. Defende o Estado provedor sem se preocupar com o quanto isso custa, nem de onde sairá o dinheiro.
A Europa, com elevada produtividade econômica, tendo a maioria da
população próspera, criou o "Estado do Bem-Estar", oferecendo assistência aos
poucos necessitados. Já não consegue arcar com os custos dessa volta ao paraíso.
Começa a recuar, forçada pela crise fiscal. No Brasil a parcela próspera da
população é minoritária. O Estado provedor teria de ser financiado por poucos, para prestar assistência à maioria necessitada. Reconhecido este fato, pessoas
inteligentes e cultas respondem simplesmente que “é isso mesmo, mas é preciso seguir
com o Estado do Bem-Estar”. O voluntarismo romântico aí expresso levou ao
desastre, e a resposta foi o inesperado surpreendente.
Os simples são mais permeáveis à razão, porque o conhecimento nos
permite entender melhor algumas coisas, mas, conforme Gaston Bachelard (1884 –
1962), também é obstáculo epistemológico. Alimenta convicções e imuniza contra
a realidade. Isso nos faz lembrar do excerto: “(...) Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas
coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos”, Mt, 11; 25.
Nenhum comentário:
Postar um comentário