terça-feira, 15 de janeiro de 2019

ARTIGO - Analisando o Fenômeno Bolsonaro (RV)

ANALISANDO O FENÔMENO 
BOLSONARO
Reginaldo Vasconcelos*


A eleição de Bolsonaro se deve em grande parte às classes policial e militar, desprestigiadas desde o processo de anistia, por causa de sua participação nas atividades repressivas dos anos de chumbo. As Forças Armadas e as Polícias viram nessa candidatura a redenção daquele período de ostracismo.

De outra parte votaram no Bolsonaro os antagonistas tradicionais do PT, somados aos simpatizantes de primeira hora do partido, que se sentiram frustrados com as políticas adotadas em seus governos – o “conjunto da obra”, como se passou a referir.

De um lado, votaram nele os desiludidos de esquerda, desde quando Lula da Silva divulgou a Carta ao Povo Brasileiro, dando temperamentos às causas socialistas, e depois justificou não ser possível dar “cavalo-de-pau no Titanic”.

O navio de Lula seguiu em frente, favorecendo o patrimonialismo desvairado em paralelo, para o financiamento do partido e de suas campanhas, enquanto ele mantinha o discurso populista e implementava medidas sociais, para garantir um bom lastro eleitoral e conquistar prestígio no concerto das nações.

Também foram seus eleitores os revoltados com os tantos escândalos financeiros, envolvendo o partido do governo e as siglas coligadas, revelados pelo mensalão, e que seguiram com os aloprados, com o suspeitíssimo assassínio de Celso Daniel, por fim, com o saque à Petrobrás – tudo isso coincidindo com o crescimento exponencial da criminalidade comum e o desarmamento da cidadania, anos de ouro para o crime organizado, para as invasões violentas de terras produtivas, para o fortalecimento das facções criminosas, culminando com a anistia presidencial a Cesari Battisti. 

O quarto contingente de votantes se constituiu dos católicos e evangélicos mais conservadores, incomodados com a exagerada liberalidade dos costumes, marcada pela homofilia, pelo casamento gay, e pela tal “ideologia de gênero”, tendência mundial apoiada pela mídia, que coincidiu com o ingresso e com a permanência da esquerda brasileira no poder.

Os governos petistas resolveram surfar nessa onda modernosa – embora com poucos militantes efetivos dessas  causas na política e em cargos públicos – até porque as matrizes do pensamento socialista mundial, cultuadas pelas esquerdas brasileiras, eram moralistas e execravam o homossexualismo.      

Mas, de todos aqueles que apostaram no “Mito”, ninguém está tranquilo realmente no momento, pois é de sabença geral que o Capitão é estouvado, além de intelectualmente limitado para ocupar a curul da Presidência. E ele não se preocupou ao passar a imagem de fascista, de machista, de racista, de autoritário, de intolerante – o que de fato já se tem visto que não é.

Também não é santo. Quem esteve na política brasileira por tantos anos, e nela criou os filhos, que nela inseriu – principalmente no promíscuo caldo de cultura do Rio de Janeiro – não pode ter atravessado esse pântano sem trazer pelo menos alguma lama nos sapatos.

Mas a cabeça, que está no outro extremo do corpo, parece que ele manteve focada nos ideais infundidos pela vida militar – hierarquia e disciplina, ordem e progresso, Brasil acima de tudo. E tudo faz crer que os generais que o acompanham no comando da República estarão a postos para suprir suas limitações e moderar os seus arroubos.

Diferentemente dos militares que ascenderam ao poder durante o regime de exceção, o oficialato de hoje é composto por verdadeiros democratas, gente que veio das classes mais modestas da população, dotados de genuíno espírito público, destituídos de empáfia e arrogância, dotados de elevada sensibilidade social, capazes de chorar durante os discursos, como se verificou nas solenidades de posse em janeiro.        

O ponto alto de desatino de Bolsonaro foi o preito de louvor feito ao General Brilhante Ustra, em pleno Congresso Nacional, na votação para a deposição de Dilma Rousseff, que foi vítima daquele militar torturador. E claro que o então deputado não estava fazendo a apologia da tortura, mas não se incomodou com o fato óbvio de que assim pareceria.

Sã consciência, tendo havido um confronto violento entre os esquerdistas da chamada “luta armada” e as forças do Governo, das quais não tinha idade para participar, é intuitivo que ele quis apenas manifestar solidariedade retórica ao estamento castrense a que veio depois a pertencer – o que não significa aspirar por outro evento do tipo, nem aplaudir seus episódios lamentáveis.

Mas resta aos eleitores de direita ter esperança, e aos de esquerda um pouco de patriotismo, compreendendo que, se oposição política é um saudável componente democrático, “resistência” é ato que só se admite em protesto a ilegalidades e injustiças, a violência e atrocidade, pois  agir contra o que é legal e legítimo tem outro nome: “banditismo”.    

No resto do mundo,  as pessoas acham que o Brasil elegeu seus políticos, nestas eleições, como faz a Venezuela de Maduro, e que Bolsonaro seja um déspota da direita, que vai discriminar minorias, prender adversários políticos – e talvez devorar criancinhas, como se atribuía aos comunistas do passado. Isso ocorre porque o público do Exterior é mal informado por jovens e imaturos correspondentes estrangeiros, que não viveram nem estudaram a História brasileira com denodo, e são induzidos por ONGs nacionais e estrangeiras, de esquerda e da vanguarda libertária.

Internamente, a expectativa e a apreensão assaltam a todos – alguns, escorpiões ideológicos, na torcida do “quanto pior melhor” – outros, como o sapo da fábula, com medo de arrostar a culpa pela ferroada das erronias eventuais do Presidente que elegeram. Declarações desencontradas feitas pelos Bolsonaros e por integrantes da equipe de governo, bem como indicações desarrazoadas de Ministros excêntricos alimentam, muito justamente, esses temores. 



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