sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

ARTIGO - Ensaios de Guerra (RMR)


ENSAIOS DE GUERRA
Rui Martinho Rodrigues*



Os acordos entre as grandes potências evitam guerras generalizadas. O Tratado de Vestfállia, de 1648, selou um entendimento entre Espanha, Países Baixos, França, Sacro Império Romano-Germânico e príncipes alemães, além de Suécia, encerrou a Guerra dos Trinta Anos. Evitou conflito generalizado até a Revolução Francesa, século e meio depois. Teve início então o ciclo de guerras da Santa Aliança contra a França. A paz foi estabelecida por cem anos com o entendimento entre as potências reunidas em Viena, em 1815.


As guerras dos Bálcãs, envolvendo Sérvia, Montenegro, Bulgária, Romênia, Grécia e Turquia anunciavam a falência do entendimento do Congresso de Viena. A decadência dos Impérios Áustro-Húgaro e Otomano, e da unificação da Itália, bem como a Alemanha, modificaram o mundo. Os acordos decaíram. Tivemos a I Guerra Mundial. O Tratado de Versalhes, 1919, proporcionou apenas vinte anos de paz. Veio a II Guerra Mundial, no fim da qual a União Soviética, os EUA e Reino Unido estabeleceram um entendimento em Ialta, 1945, definindo suas áreas de influência na Europa, evitando nova guerra generalizada naquele continente até hoje. A situação atual, neste aspecto, é semelhante aos momentos em que os tratados entre as potências deixaram de existir.

A ascensão de uma nova potência pode contribuir para a guerra. Espanha e Inglaterra guerrearam quando os britânicos começaram a se tornar uma potência capaz de rivalizar com o Reino Ibérico. França e Alemanha lutaram em 1870, 1914 e 1939, quando a unificação dos principados alemães e o desenvolvimento industrial alemão tornaram Berlim uma sede poderosa. A Inglaterra, velha rival da França, aliou-se à tradicional inimiga quando a Alemanha iniciou a corrida naval, rivalizando com a esquadra britânica. Hoje a ascensão da China modifica a balança de poder.


A esperança de vitória é um perigo. Em 1914 o exército alemão esperava derrotar a França em vinte e poucos dias, triunfando sobre a Rússia em 45 dias. O Japão, em 1937, esperava derrotar a China em cinco meses. A revolução tecnológica está ressuscitando a ideia de vitória na III Guerra Mundial. A guerra fria não se tornou quente porque havia a certeza da destruição mútua. Um general chinês afirmou que bastaria destruir dois porta-aviões da VII Frota para o povo americano, que não suporta baixas, pedir paz. É a mesma ideia que levou o Japão a atacar os EUA em 1941. A guerra civil espanhola serviu de teste para armas e táticas antes da Segunda Grande Guerra.

As guerras na Síria, Líbia e Iemem também são amostras de uma guerra mundial. Guerras acontecem quando as democracias estão desarmadas. A Europa desarmou-se. Acabou o serviço militar obrigatório, ficou sem reservistas treinados, cortou orçamentos militares, suas forças ficaram sem capacidade operacional. Ao intervir na Líbia a França precisou pedir bombas e drones aos EUA. Toda a frota de submarinos alemães está inoperante. As democracias estão despreparadas.

A Venezuela poderá tornar-se uma Síria. EUA e Rússia tomaram partido por lados opostos. Guardemos distância do possível conflito, inclusive porque não temos meios para entrar no jogo pesado das grandes potências.



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