ADULTOS FEROZMENTE INFANTIS
Rui Martinho Rodrigues*
Um rapaz matou uma menina que não quis namorar com ele. Não
aprendeu a conviver com as frustrações da existência. Crianças não contrariadas
não aprenderam a aceitar os limites que a vida impõe à vontade e às paixões. A
ética situacional substituiu o dever ser. O relativismo gnosiológico e
axiológico abriu caminho para o hedonismo autocentrado e o solipcismo.
A busca da felicidade como razão de ser da existência afastou o
entendimento da vida voltada para servir, para o cumprir o dever e para a
realização de objetivos das referências culturais mais relevantes. Os mores
foram relegados à condição de folckways e desclassificados como ignorância e
preconceito. As novas gerações foram aculturadas abruptamente. Perderam-se os
paradigmas culturais. Não logramos, todavia, substituí-los por novos
parâmetros.
Analogamente ao que acontece com índios que perdem as raízes
culturais e não assimilam novos balizas da convivência humana, temos a
desorientação de amplas parcelas da sociedade. As instâncias tradicionais de
controle social eram família, escola, igrejas, grupos de vizinhança e os mais
velhos em geral. Tais instâncias estão todas desprestigiadas. Só restou o
Estado, com a polícia, o Ministério Público e o Judiciário. Mas é uma ilusão
pensar que o Leviatã substituirá os controles da própria sociedade.
Na ausência de referência os jovens buscam abrigo nas gangs, depois
nas facções criminosas. A sociedade tenta conter a criminalidade com mais tipos
penais, com mais leis encarceradoras, com mais efetivo policial. Tudo isso
tende a se tornar necessário quando só o Estado responde pelo controle das
condutas antissociais. Hipertrofia do Direito Penal e dos órgãos estatais repressivos,
porém, não substituirá as instâncias da própria sociedade, nem será eficiente
sob o domínio do hedonismo e do relativismo que tende a fragilizar todo o
aparato do Estado.
A violência comparável a uma guerra exigirá cada vez mais controles
dispendiosos cuja eficácia tem fracassado. Não se pense que o enfrentamento
pode ser substituído apenas por suaves políticas públicas de natureza social. A
trágica situação da segurança pública é uma realidade de alta complexidade. Não
existem soluções simples para problemas complexos.
Medidas de curto, médio e longo prazo precisam ser adotadas. A ação
policial e o enfrentamento fazem parte das necessárias ações de curto prazo. As
providências de médio e longo prazo envolvem desde providências que afastam a
impressão de abandono, como limpeza pública, iluminação e tudo que passa a
ideia de presença do Estado e de cuidado produz algum resultado, nos termos da
Teoria da Janela Quebrada.
Educação, política de emprego, combate à corrupção e demais
políticas públicas fazem parte das outras medidas. As iniciativas voltadas para
a criação e reforma das leis penais e processuais penais poderão ter alguma
utilidade, mas diferença dos índices de criminalidade dos estados sob as mesmas
leis sugere que não é este o problema central.
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