PATACOADA FEDERAL
Reginaldo Vasconcelos*
O
Supremo Tribunal Federal tem, sim, atribuição constitucional para decretar medidas
cautelares contra membros do Congresso Nacional. Assim votou corretamente a
maioria dos Ministros, na pantomima encenada na última quarta-feira, dia 11 de
outubro, no plenário daquela Corte Superior.
O
STF deveria, inclusive, ter poder jurídico para impor prisões provisórias a
parlamentares, já que os pode julgar e condenar, e “quem pode o mais, pode o
menos”. Mas, inexplicavelmente, a Constituição Cidadã não o permite, salvo em
flagrante delito, no cometimento de crime inafiançável.
Não
há nenhuma razão plausível para que detentores de mandatos eletivos recebam
tratamento diferenciado da Justiça, o que revela o espírito de corpo dos
parlamentares constituintes de 1988, já que a lei deve incidir de modo idêntico
para toda a cidadania, numa república como a nossa, em que se presume reinar o Estado
Democrático de Direito.
Mas
o fito daquela vergonhosa sessão do STF era apenas contornar a besteira
cometida pela sua Primeira Turma, que resolveu afastar Aécio Neves do mandato
injustamente, e lhe impor recolhimento noturno, sem nenhuma motivação jurídica apresentável.
A
justificativa apresentada pelo relator do julgamento de quarta-feira, o Ministro
Fachin, está entre o ridículo e o absurdo, quando ele timbrou a alvar frase de efeito, de
que “não se pode confundir imunidade
parlamentar com impunidade”.
Pior
ainda a explicação articulada pelo “pai da criança”, o Ministro Barroso, que encabeçara
a decisão contra Aécio, o qual alegou que se outros envolvidos na denúncia
foram presos, não seria justo que Aécio também não amargasse alguma
sanção.
Insistindo
que tomara uma decisão técnica e isenta, logo em seguida Barroso fez um
discurso político e ideológico sobre a necessidade de se dar combate
incondicional à corrupção, e de se romper com a tradição brasileira de se
poupar os peixes grandes.
Ora
bolas! Medidas cautelares não têm escopo punitivo, e o seu cabimento se revela
pelo risco pessoal que cada um eventualmente ofereça ao processo ou à
sociedade, de modo que aquela restrição que se aplica a um, não vincula
necessariamente outros suspeitos.
Por
fim, tendo prevalecido a tese de que a Suprema Corte pode decretar as
cautelares, a Presidente do STF, Carmem Lúcia – obviamente para cumprir
preitesia firmada com o Presidente do Senado, Eunício Oliveira –
inventou aquela saída honrosa de excepcionar essa regra, no tocante à
inafastabilidade do parlamentar investigado.
Esse
entendimento foi ampliado por outro ministro, Alexandre Moraes, no sentido de
que também não caberiam medidas que, mesmo indiretamente e de qualquer maneira,
pudessem dificultar a atividade parlamentar do político acautelado.
Enfim,
resultou que nada sofrerá Aécio Neves, pois se decidiu afinal que as medidas
tomadas em relação a ele serão submetidas ao Senado, que, em querendo – e
certamente quererá – não as precisará obedecer.
Assim, ficam de bem os dois Poderes da República, embora cometendo erros e fazendo
concessões ao Direito da coveniência, nas tais “interpretações conformes” das normas constitucionais, atropelando elementares princípios jurídicos – indo
e voltando sobre as mesmas erronias.
Primeiramente
uma Turma do Tribunal tenta “punir” um investigado por meio de desarrazoadas
medidas cautelares contra ele – que não ameaçava a sociedade nem as
investigações – baseadas em meras ilações fáticas, conjuminando uma série de
condutas penalmente atípicas, para previamente condenar.
O
Ministro Barroso alegou que o acautelado pediu dinheiro a um grande empresário (o que
era conduta comum, e até oficialmente permitida); que em se tratando de um
empréstimo, não foi lavrado um instrumento de mútuo (o que não é obrigatório); e
que recebeu em espécie (o que também não sofre proibição legal).
Sim,
diante de um Delegado de Polícia, tem-se um conjunto de indícios que constituem
“fundadas suspeitas” de corrupção, a justificar o procedimento investigatório
instaurado. Mas não pode motivar um ato judicial e nem fundamentar medicas
restritivas de Direito, com base em arroubos moralistas e patrióticos de um
juiz.
Por
fim, “atirando no que viu e acertando no que não viu”, o Tribunal mantém a
decisão torta, entortando a interpretação da lei, abonando oficialmente a
tolice jurídica da sua Primeira Turma, mas decidindo que ela não precisará ser aplicada pelo Senado Federal. Pobre
Brasil!
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