sexta-feira, 13 de outubro de 2017

ARTIGO - Patacoada Federal (RV)


PATACOADA FEDERAL
Reginaldo Vasconcelos*


O Supremo Tribunal Federal tem, sim, atribuição constitucional para decretar medidas cautelares contra membros do Congresso Nacional. Assim votou corretamente a maioria dos Ministros, na pantomima encenada na última quarta-feira, dia 11 de outubro, no plenário daquela Corte Superior.



O STF deveria, inclusive, ter poder jurídico para impor prisões provisórias a parlamentares, já que os pode julgar e condenar, e “quem pode o mais, pode o menos”. Mas, inexplicavelmente, a Constituição Cidadã não o permite, salvo em flagrante delito, no cometimento de crime inafiançável.

Não há nenhuma razão plausível para que detentores de mandatos eletivos recebam tratamento diferenciado da Justiça, o que revela o espírito de corpo dos parlamentares constituintes de 1988, já que a lei deve incidir de modo idêntico para toda a cidadania, numa república como a nossa, em que se presume reinar o Estado Democrático de Direito.

Mas o fito daquela vergonhosa sessão do STF era apenas contornar a besteira cometida pela sua Primeira Turma, que resolveu afastar Aécio Neves do mandato injustamente, e lhe impor recolhimento noturno, sem nenhuma motivação jurídica apresentável.

A justificativa apresentada pelo relator do julgamento de quarta-feira, o Ministro Fachin, está entre o ridículo e o absurdo, quando ele timbrou a alvar frase de efeito,  de que “não se pode confundir imunidade parlamentar com impunidade”.

Pior ainda a explicação articulada pelo “pai da criança”, o Ministro Barroso, que encabeçara a decisão contra Aécio, o qual alegou que se outros envolvidos na denúncia foram presos, não seria justo que Aécio também não amargasse alguma sanção.

Insistindo que tomara uma decisão técnica e isenta, logo em seguida Barroso fez um discurso político e ideológico sobre a necessidade de se dar combate incondicional à corrupção, e de se romper com a tradição brasileira de se poupar os peixes grandes.

Ora bolas! Medidas cautelares não têm escopo punitivo, e o seu cabimento se revela pelo risco pessoal que cada um eventualmente ofereça ao processo ou à sociedade, de modo que aquela restrição que se aplica a um, não vincula necessariamente outros suspeitos.

Por fim, tendo prevalecido a tese de que a Suprema Corte pode decretar as cautelares, a Presidente do STF, Carmem Lúcia – obviamente para cumprir preitesia firmada com o Presidente do Senado, Eunício Oliveira – inventou aquela saída honrosa de excepcionar essa regra, no tocante à inafastabilidade do parlamentar investigado.

Esse entendimento foi ampliado por outro ministro, Alexandre Moraes, no sentido de que também não caberiam medidas que, mesmo indiretamente e de qualquer maneira, pudessem dificultar a atividade parlamentar do político acautelado.

Enfim, resultou que nada sofrerá Aécio Neves, pois se decidiu afinal que as medidas tomadas em relação a ele serão submetidas ao Senado, que, em querendo – e certamente quererá – não as precisará obedecer.

Assim, ficam de bem os dois Poderes da República, embora cometendo erros e fazendo concessões ao Direito da coveniência, nas tais “interpretações conformes” das normas constitucionais, atropelando elementares princípios jurídicos – indo e voltando sobre as mesmas erronias.

Primeiramente uma Turma do Tribunal tenta “punir” um investigado por meio de desarrazoadas medidas cautelares contra ele – que não ameaçava a sociedade nem as investigações – baseadas em meras ilações fáticas, conjuminando uma série de condutas penalmente atípicas, para previamente condenar.

O Ministro Barroso alegou que o acautelado pediu dinheiro a um grande empresário (o que era conduta comum, e até oficialmente permitida); que em se tratando de um empréstimo, não foi lavrado um instrumento de mútuo (o que não é obrigatório); e que recebeu em espécie (o que também não sofre proibição legal).

Sim, diante de um Delegado de Polícia, tem-se um conjunto de indícios que constituem “fundadas suspeitas” de corrupção, a justificar o procedimento investigatório instaurado. Mas não pode motivar um ato judicial e nem fundamentar medicas restritivas de Direito, com base em arroubos moralistas e patrióticos de um juiz.

Por fim, atirando no que viu e acertando no que não viu, o Tribunal mantém a decisão torta, entortando a interpretação da lei, abonando oficialmente a tolice jurídica da sua Primeira Turma, mas decidindo que ela não precisará ser aplicada pelo Senado Federal. Pobre Brasil!

     

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