São Francisco de Assis e Dona Pobreza
na Crônica Maior de
Socorro Lima Mesquita
Révia Herculano*
Achamos um livro de devoção e comovemo-nos; achamos outro
galante e impressionamo-nos. Não será o coração o único habilitado a conciliar
coisas contrárias e admitir incompatibilidades?
(JEAN
DE LA BRUYÉRE,moralista francês. Paris, 16 de agosto de 1645; 10 de maio de
1696).
Escrito com clareza e inovador sob vários aspectos, este
livro – Francisco de Assis – Alegria e Santidade na Pobreza – Abordagem Teológica
Franciscana, de Socorro Lima Mesquita, responde a um projeto ousado: percorrer
e investigar o caminho do SantAssisense, uma demanda que parte da fé professada,questiona
a força motivadora e participa de todos os desafios de Francisco, um jovem
burguês,inculto e “devasso” dos séculos XII e XIII,sua conversão e a impulsiva
necessidade de conhecer e imitar o Cristo.
Com a certeza de que Teologia requer experiência de vida
e nela a reflexão rigorosa se une espontaneamente à espiritualidade, a autora
nos chama a penetrar o universo do Homem Santo de Assis, fundamentada numa
teoria com dimensões filosóficas, religiosas, históricas e também morais.
Desse modo, compreende conhecimentos, enquanto aponta
para o fascínio de seguir as pegadas do Santo ora meditado, o que faz, venturosamente,
referenciando plurais hagiógrafos e comentaristas de vertentes franciscenses,
bem como, e especialmente, louvando-se nos escritos dos evangelistas do Novo
Testamento.
Primeiramente, adentra o contexto medieval, identificando
usos e costumes de uma sociedade dualista, fincada em pilares cristãos, mas
encardida pelos prazeres humanos, constatando ser praticamente obrigatório que moços
abastados apreciem e disputem modalidades vis de exercer maldades.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgq5475O1X6KcaUbz0IVcRs0CDbpW2ezQpbMPjIvnetOS9qaTO061AZqJ4l_Ua6sYkVg-7_jUoUNMmOhd3sk0iCgCRcZUM2eF3wi03V5Y5t2vemiJARfuU0-Np3aisgv5Fo-gT1iQnq7_oW/s200/POMBA.jpg)
Neste momento, também se inscreve como leitora e se espanta
com o processo de conversão do Santo, radicalmente simples e exaustivamente
desafiador.
“Vai e vende tudo o que tens e distribui aos pobres, e
terás então um tesouro no céu. Depois vem e segue-me.” (Mt,19-21).
No assombro deste convite, a libertação!
Libertar-se, agora, é seguir apenas vestígios, mergulhar
no invisível, sofrer angústias lancinantes.
São Francisco guarda o drama da alma que se redime cuja
missão é proclamar Jesus Cristo em sua opção pelos pobres; não aqueles marginais
da religião ou da moralidade, mas do ponto de vista sociológico e – seja expresso rápida e
circunstancialmente – numa região
onde excediam mendigos, doentes, aleijados e leprosos, todos pessoas
desprezadas por grande parte da
sociedade.
João Pedro Bernadone ou Francisco de Assis dinamiza e
consolida o Reino de Deus ao longo da história, seguindo a máxima de nada
desejar e coisa alguma possuir.
Há, na espiritualidade franciscana, a divulgação de um Reino
que não se implanta por imposição, mas por intermédio de um coração convertido,
escolha que ilumina o cotidiano,sobrepondo-se atemporal.
Para retratar esse cotidiano, Socorro Lima Mesquita
dispõe de estilo simples, incisivo. Recorre a algum paralelismo entre o
objetivo de Francisco e versículos neotestamentários, reproduzidos,
principalmente, por Mateus, percebidos claramente não apenas no Sermão da Bem-Aventurança,
quando Jesus exaltou os “pobres de coração”, mas também em outras expressões evangélicas
referentes à pobreza.
Existe, ainda, na parceria com tais versos, certa abstração
destinada a fazer eco ou a pontuar a mais difícil tarefa cristã:despojar-se dos
bens materiais.
Com efeito, nossa autora aponta para uma Metafísica da
Virtude, quando observa a fidelidade de São Francisco de Assis a Deus, na
oportunidade em que mostra a transcendência do temporal para o divino neste
projeto iniciado nesta cidade da Umbria-Itália, incompreendido no princípio, mas
depois iluminado pela ação submissa à vontade do Pai Celeste.
Ela também reconhece no Santo aliado de Dona Pobreza, conforme ele próprio
chamava, um artesão no estabelecimento de comunidades afeitas ao amor, à
misericórdia, e encarregadas de edificá-lo mundo afora, na lida diária com
famintos, despojados, prisioneiros e sedentos.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjUYrMaKjCccNiiHM5NuIhePZhyFjwqZmcb8iIsMNra1xGHsutrIjZkTgOE0qycdaitVyD98D1CkFTE6_9KYyRGD80hu3OiLwDW-56zRyn8qMt3AD_I8ThtJL-w1j7e18UMPh4mdMyEFpW4/s320/Vila+Adriana+-+Tivoli+-+It%25C3%25A1lia.jpg)
Por tais razões, portanto, as compreensões
aqui esposadas podem ser lidas e descodificadas de imediato, alcançando
incontinenti os seus propósitos de achegar aos consultantes os alteados exemplos
de São Francisco de Assis, aqui generosamente imprimindo substância, em não
avultada edição física, e com clareza e cobertura sintética meridiana, uma
trilha de 835 anos de literatura são-franciscana, desde o nascimento do Santo
de Assis, ocorrido no ano de 1.181.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgNfdwxoelteW0uL0aA3D3p00Kcgv-3oOf5j3OChINTlZO661jsiBpRKG-lAg_4Lv3C2S1-_gWyplF2ZP722BDns4kArFGJOWBQu9OLIZZGfvwW4z4UglXn7Dc4kMdmF43EkH-HZM5xtdtZ/s200/Maria+C%25C3%25A9lia+Molinari.jpg)
Evoque-se, pois, a atitude franciscana do atual Santo
Padre, o Papa Francisco, que adotou o nome do Santo de Assis, como bem referiu
a árcade nova Célia Molinari (Cleonice Danae, na Arcádia), no seu excelso
escrito de acesso a este estudo.
Texto restaurador, este volume destina-se a nos fazer refletir
sobre a reconstituição do Reino. E a Novel Teóloga o reveste de tal tessitura,
que se percebem, a cada palavra, a leveza e a bondade de que é capaz.
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