Folhas Mortas
Inspirações em Versos Ecléticos (II)
Vianney Mesquita*
Só há poesia no desejo do impossível ou na dor do
irreparável. (Calos
Maria LECONTE DE LISLE. Poeta e sábio francês. Saint-Paul – Reunião, 22 de
outubro de 1818; Voisins-le-Bretonneux, 17 de junho de 1894).
3 APARELHAMENTO
INTELECTUAL DO AUTOR
Embora
nem sempre seja fácil apreciar analiticamente arte poética, em Folhas Mortas ressai, de imediato, a
manifestação da apreciável prontidão intelectiva do seu compositor, com
trânsito livre pela História, Geografia, Historiografia Literária, Artes,
Ciências Físicas, História Natural, além de outros saberes, exemplos dos quais
são os quartetos do soneto decassilábico português Protogênese, onde se vislumbram parecenças com os versos
naturalistas de Augusto dos Anjos, antevendo-se, instantaneamente, a
escolaridade de Vasques Filho, no concernente, também, aos recursos métricos.
Protogênese
No turbilhão de épocas
passadas,
Que foste tu? Um protoplasma?
Um fruto?
Portanto, protogínico ou um
bruto
Estrugindo feroz nas
madrugadas?
Das eras ancestrais, nas
cavalgadas
De monstros colossais fostes
produto
De micronúcleos vegetais,
tributo
Do despertar de feras
alvoradas?
Mas, afinal, que foste tu? Que
encerra
De mistério o conjunto do teu
ser,
Que em parto horrendo produziu
a terra?
Quem sabe no telúrico Nirvana,
Não foste em protandria, sem
querer,
O primitivo embrião da raça
humana?
Aliás,
eu evocava – no livro Reflexões sobre
Augusto dos Anjos, do acadêmico Antônio Martins Filho (MESQUITA, 1996, p.
141) – o fato de Augusto, como, ainda, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela,
Casimiro de Abreu e outros atingidos pelo mal
do século, haver influenciado bastante a maneira de versificar daqueles
seus cultores e cultivadores, feito uma das maiores expressões da literatura
poética do País, não apenas pela temática naturalista chocante e bela, bem
assim em razão de sua cultura científica manifesta em seus cadenciados e
sonoros versos.
Escrevia,
ainda (permita-me o leitor esta digressão), noticiando o fato de, ainda muito
jovem – com 15 anos – haver feito pasticho dos versos de Augusto dos Anjos,
provindo do cosmopolitismo das moneras,
com os decassilábicos intitulados Morbidez,
meramente imitativos e com defeitos de consonância, sem qualquer valor
artístico ou literário.
Morbidez
Tomam-me por inteiro as
mialgias,
Na arteriosclerose das
matérias,
E o bater pressuroso das
artérias
Pareço escutar todos os dias.
Seguir calado, acalentando
sonhos,
Já não resisto de tal modo
insano.
Extravasa-se o fluido
raquidiano,
S’esvaema cada dia meus
neurônios.
É a cefaleia ultradolorosa!
Ela agride, me açoita e me
anquilosa ...
Como se me fendesse um
parietal.
O bisturi meu cérebro não
cinde
Porque o doutor da epífise
imprescinde...
Pois já findou: partiu-se a
pineal.
Fortaleza, outubro de 1961.
Não
é razoável asseverar ter ocorrido influência do Poeta da Vila do Espírito Santo
sobre o Protogênese, como no meu
caso, em exercício feito de adrede, de intenção preparado, para imitar o estilo
de Augusto dos Anjos, em tarefa didática na antiga Escola Industrial de
Fortaleza, hoje Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Ceará.
Não
apenas na literatura, desses valimentos a história é repleta.
Tencionei
somente, pois, em breve exemplo, fazer denotar a erudição do Autor de O Grande Mártir, no concernente ao
repertório das Ciências Naturais. Assim o mostra, com relação à História Antiga
e Medieva, à mitologia (desta se vale a literaturamundial), conforme acontece
com Para uma Escrava (de Dario,
persa), exempligratia, comentado em
passagem ulterior deste artigo. Indiscutíveis são, portanto – e o leitor há de
comprovar – a prontidão intelectual e o preparo ecumênico deste escritor
admirando.
Nenhum comentário:
Postar um comentário