OS HOMENS DO ANO
Muita gente tomou por ironia a nossa
indicação do palhaço Tiririca como “O Homem do Ano no Ceará em 1996”. Bem… foi ironia, e não foi. Quer dizer – se foi, não foi de nossa parte.
De fato, durante o ano passado, nenhum
cearense teve mais destaque no País do que aquele artista circense, para
desespero de uma certa ala de sudestinos, dos mesmos que abominam Ciro Gomes, e
que procuraram por todos os meios dinamitar o sucesso do Tiririca, conseguindo
apenas fazer o oposto.
Agora… que de fato faltou um nome de maior
destaque entre os pró-homens do Estado, lá isso também é verdade.
E talvez isso
se deva à esmagadora força da dinastia Jereissati, convertendo os grandes
líderes locais em meras balizas semafóricas, para orientar com bandeirolas o
seu imenso trator de obras, que conta, inclusive, com impulso federal. Porto do
Pecém, Castanhão, aeroporto internacional, energia eólica, tudo tem a mesma
assinatura.
Mas, para que não haja ressentimentos,
vamos mencionar alguns cearenses que se destacaram durante 1996, em suas áreas
respectivas de ação.
Temos o mérito do Procurador da República,
Dr. Francisco Araújo de Macedo Filho, que inaugurou prédio próprio (e muito
próprio) na Aldeota, para o funcionamento da Procuradoria, a qual era instalada
(e mal instalada) em imóvel improvisado para os lados do Jacarecanga.
Temos ainda Anselmo Mororó, jovem que há
pouco tempo era surfista e que fundou um canal doméstico de televisão, a TV
COM, para castigo das outras emissoras locais, repetidoras das grandes redes, e muito
infensas a dar espaço aos valores regionais. Ele divide o mérito com o
jornalista Nelson Faheina, que tem sustentado com heroísmo e poucas condições
técnicas um jornalismo decente, e com a professora Adísia Sá, a qual avaliza a
seriedade da emissora.
O prefeito Juraci Magalhães, que obteve das
urnas maioria aclamadora nas eleições municipais. Este certamente merecerá um
título de homem do ano se resolver em Fortaleza o apocalíptico problema do lixo
e não esculhambar a Praia da Iracema com projetos faraônicos. A palavra
“esculhambar” no seu sentido culto, o mesmo que “castrar”. A castração, ainda
que cruel, mutiladora e aviltante, sempre encontrou justificativas éticas,
estéticas e econômicas.
O mestre em jornalismo Ricardo Guilherme,
fazendo o “Diálogo”, melhor show de personalidades da TV Cearense, que não
comete nenhum dos dois tipos tão comuns de auto- entrevistas: aquele em que o
entrevistador pergunta o que ele mesmo pretende responder, interferindo nas
respostas, discordando delas, ou emitindo pareceres, e aquele em que o
jornalista só pergunta o que o convidado precisa responder, para se justificar
ou promover.
De resto, citamos o presidente do BEC, José
Alencar, e o bancário Erotildes Teixeira, presidente da Associação dos
Funcionários, que se digladiaram em praça pública, através da imprensa, na
defesa de suas posições. No calor da refrega, excessos foram cometidos de parte
a parte, o que produziu mágoas e contramarchas. Na verdade, ambos
demonstraram-se aguerridos no cumprimento de suas missões, cada um visualizando
método diverso para a defesa da Instituição. O que é fato é que a atividade
bancária, como um todo, enfrenta percalços no momento e “em casa em que não tem
pão, todos gritam e ninguém tem razão”.
Fica aqui também uma referência póstuma ao
imortal da Academia Cearense de Letras, intelectual de peso e jornalista
apaixonado, Geraldo Fontenele, que, em parceria com Maurício Xerez, fundou o jornal
alternativo ABC Fortaleza, de muito boa qualidade, e que veio a falecer no
último dezembro, vítima de um infarto fulminante.
Reginaldo Vasconcelos - JORNAL SCANDALUS - 1996
NOTA DO EDITOR:
A matéria foi publicada quando Francisco Everardo Oliveira Silva, o palhaço Tiririca, despontava no cenário nacional com a canção burlesca "Florentina". Everardo é hoje deputado federal por São Paulo.
O Jornal Scandalus o elegeu o cearense do ano de 1996, para demonstrar que os grandes personagens do Estado, mesmo os que brilhavam internamente, não tinham projeção Brasil a fora. Era um tempo em que ainda não existiam a telefonia celular, a fotografia digital, e em que o computador pessoal ainda não se popularizara.
O Banco do Estado do Ceará ainda não fora extinto, mas Ricardo Guilherme já tinha seu programa de TV, em que aparece entrevistando o pesquisador, musicófilo e historiador Cristiano Câmara, falecido no dia 22 de maio último.
Enfim, a Praia de Iracema seria "esculhambada" anos à frente, pela prefeita Luizianne Lins, que aterrou a célebre "Piscininha" e transformou um espaço histórico, boêmio, romântico e acolhedor em um mero e despersonalizado calçadão para um mafuá de bicicletas e skates.
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