O ORTÔNIMO,
OS HETERÔNIMOS E
A OUTRA COISA, NA CALIGRAFIA
DO POLÍGRAFO LINHARES FILHO
Vianney Mesquita*
O que penso do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.
[Alberto Caeiro – heterônimo
de PESSOA, FERNANDO Antônio Nogueira de Seabra
– *Lisboa, 13.06.1888; +Lisboa (Jerônimos), 30.11.1935].
Procedia
a uma regulagem nas minhas (como eu)
desorganizadas estantes, quando divisei A
Outra Coisa na Poesia de Fernando Pessoa, do escritor polimático Linhares
Filho, professor titular de Literatura Portuguesa da U.F.C. mestre nesta linha
investigativa (Pessoa) e doutor no mesmo veio (Miguel Torga).
José
Linhares Filho, de quem experimentei o prazer de assistir ao lançamento do
broto intitulado Junto à Lareira
Invisível, há poucos meses, é lavrense (da Mangabeira), como ocorrem ser
Dimas Macedo, Batista de Lima, Josafá e Joel Linhares e Joaryvar Macedo, bem
assim muitos autores de renome, procedentes desta fonte prolígera de pessoas de
letras, cultura e ciência.
Tanto
em razão de sua diversa e qualificada produção na poesia, ensaio e noutros
gêneros de escritura, como, em particular, em decorrência dos estudos
empreendidos em profundez acerca de Pessoa e Miguel Torga (Adolfo Correia da
Rocha), LF é produtor apreciado, estudado e policitado no Brasil, Portugal e nas
várias nações lusofônicas, razão por que constitui nome de referência terciária
no ecúmeno literário nacional e mesmo ultrapassando os limiares patriais do
idioma português.
Na
releitura do mencionado clássico da ensaística literária, restou mais
cristalina ainda (a leitura repetida tempos após é procedida sempre noutra
perspectiva) a ideia de que descobrir lances novos, por exemplo, na produção de
literatos da grandeza de Machado de Assis, Eça de Queiroz, José de Alencar,
Fran Martins ou Fernando Pessoa não constitui labor no alcance das pessoas
comuns, porquanto, se pensa, desarrazoadamente, suas obras já restam
eficientemente dissecadas pelos mais eminentes analistas.
Desta
sorte, depreende-se a noção de que a Arte, na sua acepção melhor, não é tão
estreita ao ponto de se esgotarem valores latentes, e sempre haverá no seu
recôndito entretons ainda intocados e que somente poderão ser devassados pela
argúcia do estudioso exigente e fiel à pesquisa para descodificação perfeita da
mensagem.
A Outra Coisa na Poesia de
Fernando Pessoa,
ora apreciada com visão renovada, diversa da leitura inaugural, não constitui,
decerto, um livro a maior na bibliografia passiva do Lisbonense notável,
conforme se poderia erroneamente supora
priori, pois LF percorre intimamenteo discurso admirável do Poeta luso e, sine ira et studio, no frasear de Públio
Cornélio Tácito, imagina, supõe, fotografa, conclui e explica, com a clareza do
bom tradutor, as diversas facetas da obra do Autor de Mensagem.
Linhares
Filho estabelece as relações entre o ortônimo e os heterônimos Alberto Caeiro,
Álvaro de Campos e Ricardo Reis; exprime singularmente as posições de Caeiro e
Reis, bem assim o relacionamento de Campos-Caeiro; formula coerentemente as
soluções idealista e realista no contexto pessoano, explicando, no que chamou
solução realista, o infinito de Pessoa, o impossível de Reis e o realismo de
Campos.
Linhares
Filho, pois, no volume sob comento, deu continuidade ao seu fado de excelente
escritor de ensaios, garantindo um lugar de destaque no concerto da crítica
especializada; e, ao demostrar a personalidade multíplice
do Escritor de Primeiro Fausto, arremata
com o enfeixe maior de Pessoa – o empenho deste em compreender o mundo e
atingir o ser.
O
experimento literocientífico sob exame, por conseguinte, malgrado assunto
espreitado amiúde por teóricos de toda parte, é uma vertente exata para quem
tencionar proceder a incursões mais demoradas pela obra de Fernando Antônio
Nogueira de Seabra Pessoa, em decorrência da absoluta originalidade das suas
proposições.
Glória
e paz e parabéns e vida longa ao excelso ensaísta e enorme cristão, ocupante de
uma cadeira (a de Luís Antônio da Rocha Lima) na Academia Cearense de Letras, o
lavrense José Linhares Filho!
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