sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

ARTIGO - O Monopartidarismo Discreto (RMR)


O MONOPARTIDARISMO
DISCRETO
Rui Martinho Rodrigues*


O pensamento socialista tornou-se hegemônico. Até os seus críticos se impregnaram com as suas teses. Defende a igualdade sem distinção de mérito, o bem-estar sem necessidade de esforço e propugna por justiça, cujo entendimento polêmico nem sempre é captado pelos seus admiradores. 

Os nossos Fracassos e culpas imputamos à sociedade (Rousseau   1712 / 1778) expressou esta absolvição universal dizendo que o homem nasce bom e a sociedade o corrompe. Não disse, porém, quem corrompeu a sociedade. Podemos ser virtuosos sem fazer o bem, considerado assistencialismo desprezível. A luta é por “um mundo melhor”, que se faz apontando e castigando culpados, sem o ônus de socorrer necessitados, mas pela mudança das estruturas sociais.

Somos virtuosos e sábios. “Sabemos o que está por trás das aparências”; temos a ambição de poder “só para fazer justiça”; os nossos fracassos e crimes são culpa da sociedade. Temos a quem odiar e jogar todas as responsabilidades: o “sistema”. Podemos ser incoerentes: a dialética nos socorre com a unidade dos contrários.

Somos pela cultura da paz e financiamos o crime violento comprando e usando drogas ilícitas. Somos internacionalistas ou nacionalistas conforme a conveniência da luta pelo poder. Desqualificamos os nossos críticos como “serviçais dos opressores”. Escapamos da crítica porque somos do “lado do bem”. Os nossos críticos são “do mal”. Fazemos pose de intelectuais porque temos a companhia de quase todos eles, nas posições que assumimos   ou até somos um deles.

Prometemos emancipação. Obediência só às normas em cuja elaboração participamos. Desfrutamos da solidariedade de irmãos de fé, digo, de camaradas ou companheiros. Transcendemos a nossa finitude sendo parte de um todo orgânico que pode ser a classe social, um partido ou um movimento político. Não precisamos de família, Igreja ou pátria. Estas até atrapalham, principalmente as duas primeiras, com as quais convivemos de perto, exigindo de nós o exercício da tolerância.


Seguimos a deusa Bem-Aventurança pela estrada macia que leva ao bem-estar, assegurado pelo Papai Noel, digo, pelo Estado. Bem-estar não precisa ser conquistado. Não pensamos em esforço nem no campo intelectual. Seguimos comodamente o pensamento hegemônico. Citamos autores que não lemos, repetimos chavões e odiamos as injustiças sociais. Simples assim. Não há sedução maior.

Intelectuais são românticos como os poeta são mentirosos. Quem vende livro, escreve roteiro de filme ou novela e quer aplauso precisa seduzir, explorar emoções, vender fantasia. Engenheiros nucleares e físicos geniais e estudiosos não são intelectuais. Poetas e teóricos da cultura é que são assim qualificados. Os modernos meios de comunicação difundiram as fantasias dos românticos havidos como sábios. Chegamos ao declínio do dever, à cultura do Direito sem obrigação (LIPOVETSKY, Giles. A sociedade pós-moralista. O crepúsculo do dever e a ética indolor dos novos tempos democráticos. Barueri: Manole, 2005).

Todos os partidos têm programas com forte influência socialista, configurando um monopartidarismo discreto. Todos os erários, por outro lado, estão endividados. A solução, pretende-se que seja indolor. Até as Igrejas têm sido influenciadas pelo projeto análogo à Torre de Babel (OAKESHOTT, Michael. Sobre a História. Rio de Janeiro: Topbooks 2003), que consiste em chegar ao céu sem precisar morrer, esquecidas de que após a queda o homem foi expulso do Éden, o Senhor colocou dois querubins armados de espada flamejante na porta do Paraíso para que o homem não volte a desfrutar dele sem precisar morrer. A França do pós-guerra muito contribuiu para tal hegemonia ideológica. Mas Igrejas e influência francesa são temas para outras reflexões.


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