A
queda dos HERÓIS
e a ASCENSÃO dos vilões:
o
que representa
um
Oscar à Coringa.
João Pedro Gurgel*
Cansamos dos heróis. Eles não mais nos representam. Suas virtudes e
perfectibilidade de vida não mais nos inspiram a ser melhores. Em fato, insuflam
nossa revolta por não conseguirmos ser tão tão. Tão inteligentes. Tão
bem-sucedidos e tudo mais.
O Coringa (2019), peça de cinema de Todd Phillips, leu bem isso.
Nele, nos deparamos com o desafortunado Arthur Fleck. Sua desgraça o acompanha
em todo lugar. Sua mãe porta incontáveis problemas e segredos que o atingem.
Seus amigos o traem. Seus flertes não vingam. Sua conta bancária inexiste,
mesmo diante da necessidade de seu tratamento de saúde. A única coisa que
lhe cai bem é o papel de palhaço.
Doutra banda, o príncipe de Gotham, Bruce Wayne, tratado na versão
da trama como seu possível irmão, é digno das maiores benesses do mundo. É um
afortunado. Tem tudo, menos os problemas do pobre Fleck. Bruce nasceu para ser herói.
O que restou para o palhaço Arthur? Com qual deles nos parecemos mais?
A ascensão do Coringa se torna óbvia no desenrolar da trama. Nosso
carisma se somatiza ao vilão porque também somos imperfeitos. Sofremos traição.
Fracassamos no flerte. Não temos conta bancária e sofremos as perversidades do
sistema de saúde. Somos palhaços. Não bilionários.
Por isso, o prêmio vai para o Coringa. Ele descortina nossos
problemas. Sua revolta sincera é uma injeção cavalar de realidade no mundo amotinado
por fantasias insossas de virtude. No Século XXI, já não podemos nos dar ao
luxo de criar vilões para criar heróis para resolver modestos problemas.
Precisamos de alguém que sinta o que sentimos. Mesmo que seja um vilão.
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