O BUMERANGUE
IDEOLÓGICO
Rui Martinho Rodrigues*
A concepção de
Estado trata, entre outras coisas, dos seus fins. Thomas Hobbes (1588-1679)
entendia que o poder político maior tinha origem em um contrato social e o seu
fim seria oferecer segurança na convivência do homem lobo do homem, o próprio
homem, com ele mesmo.
Nicolau Maquiavel
(1469 – 1527) afirmou que o primeiro dever do príncipe é preparar a guerra. A
modernidade enfatizou a “promoção do bem-estar geral e a manutenção da ordem
social” como os fins do poder Estatal e da política (Dicionário de Ciências
Sociais da FGV). Tal concepção inspirou a carta de Weimar de 1919, seguida
desde então por muitas constituições em todo o mundo.
As liberdades
negativas, sob a forma de obrigação de não fazer, (não violar o domicílio, não
condenar sem o devido processo legal etc) cederam lugar às obrigações de fazer,
promovendo a melhoria das condições de vida. Estas significam custos crescentes.
Pessoas vivem mais tempo como aposentadas. Necessitam de mais assistência na
velhice. Acrescentam “novas conquistas” às suas reivindicações.
Os cuidados têm
custos crescentes com os avanços tecnológicos da medicina. A reserva do
possível limita a promoção do bem-estar geral. Mas ganhou status de
torpeza. Os meios do Estado são vistos como ilimitados. “Basta majorar
tributos”.
A Torre de Babel
representa a conquista de um paraíso existente que não precisa ser construído pelo
esforço. Foi comparada por Michael Oakeshott (1901 – 1990) com o sonho do
paraíso proporcionado por meio de reivindicações políticas.
Raoul Girardet (1917
– 2013) comparou algumas doutrinas políticas com a mitologia. Vislumbram o
paraíso perdido na comuna primitiva. Percebem a propriedade como o pecado
original e a realização da igualdade e da justiça como a volta ao paraíso.
Caberia também a analogia com a “Terra sem males”, utopia guarani, onde não
havia fome, guerras ou doenças, herança atávica do patrimônio cultural
macunaímico.
Não ter fé nos mitos
políticos parece insensibilidade e ignorância. Utopias, porém, não falam nos
meios necessários ao bem-estar; no esforço para a produção da abundância; na
existência de oposição ou dissidência. São armadilhas.
A estimulação da
economia pelos gastos, alegadamente inspirada em John Maynard Keynes (1883 –
1946), como defesa o déficit público, esquece que para o autor citado isso
seria na circunstância da existência de capacidade instalada ociosa e em
caráter provisório.
Aqueles a quem
Roberto de Oliveira Campos (1917 – 2001) nomeou como “estatólatras” aderiram a
busca de investimento privado. O bumerangue ideológico inflou o Estado e exauriu
a sua capacidade financeira. China e Vietnam viram-se obrigados a estimular
investimentos privados estrangeiros. Seguidores moderados da Torre de Babel
moderna estão tentando retroceder. França, Itália, Portugal, Espanha, Grécia
são exemplos disso. No Brasil o Estados gastador tornou-se insolvente e tenta
retroceder da armadilha utopista.
Aliança entre
grandes empreiteiros e bancos, de um lado; e estatólatras do outro, desmentiu a
falácia do antagonismo entre os adoradores do Estado e o grande capital. Os
primeiros passos da aliança citada datam de 1921, com a “Nova Economia Política”,
de Vladimir Ilyich Ulyanov, Lênin, (1970 – 1924), que limitou-se ao uso da
capacidade gerencial de empresários.
A China de hoje e o
Brasil do passado recente mostraram que a aliança entre o capital privado e os
seus supostos inimigos é real. Um lado paga propina e recebe benesses do Leviatã.
O outro recebe propina e usa a eficácia da iniciativa privada. Quem perde? Consumidores
e pequenos e o médios empresários. A fé na superioridade moral e intelectual
dos burocratas, tecnocratas e políticos permanece forte louvando o Leviatã e,
indiretamente, os seus dirigentes e executores de suas políticas.
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