quarta-feira, 30 de julho de 2014

ARTIGO (RMR)

A CONQUISTA DA HEGEMONIA II
Rui Martinho Rodrigues*


A hegemonia ideológica se relaciona com a tradição libertária: pensadores clássicos e a Igreja.

O pensamento libertário é sedutor. Promete emancipação. Declara a nossa racionalidade. Lisonjeia. Promete superar o freudiano mal-estar na civilização. Infelicidade é culpa dos limites opressivos. É o mundo em preto e branco. Tem mocinho e bandido, vítima e algoz, identidades bem definidas, certezas, verdadeira consciência e a promessa messiânica: emancipação. 

É bom ser mocinho, combater vilões, ser “esclarecido”. Quando oportuno, nega-se a existência da verdade (não a “verdadeira consciência”); e da identidade (não a de “esclarecido”). É a dialética, “senhora de costumes cognoscitivos fáceis”. Pulsão de vida e de morte, passionalidade e outras coisinhas são desconsideradas. Alega-se que “o homem é um animal político”. Não importa que a nossa sociabilidade seja forçada pela necessidade.

Pensadores clássicos muito citados, pouco lidos e menos compreendidos, ensejam pose de sábio. Basta aludir a um renomado autor, alguns chavões e se obtém aplausos. Não é Gramsci. Já havia sofistas entre os gregos, reduzindo tudo à retórica relativista. Os helenos sucumbiram aos romanos. Aqueles viviam de retórica, estes da solução de problemas. A conquista da hegemonia pelos libertários é a vitória da deusa Bem-aventurança (Preguiça, para os desafetos), que prometia colher sem plantar. É a derrota da deusa Virtude, que dizia: “Você só vai colher o que plantar”.

O Vaticano e o Clero influenciavam o Brasil. A maioria dos cardeais da cúria metropolitana era italiana e francesa. Nestes países o partido comunista crescia a cada eleição. A América Latina parecia a beira da revolução. A corrida espacial favorecia a URSS. O Vaticano II veio para aderir aos vencedores. O Clero, anticomunista, tinha tendência fascista, celebrara um acordo com Mussolini, apoiara a Ação Integralista Brasileira.

Comunofascistas acham que o homem não se pertence, formam partidos orgânicos, adotam o culto à personalidade dos líderes, são messiânicos, representam o bem contra o mal, são disciplinados, têm um inimigo a quem odiar, são irmandades, fazem pose de superioridade moral e intelectual, tratam o homem como animal de rebanho, dizem que os fins justificam os meios (abrindo a caixa de Pandora), negam a escolha livre e consciente. São iguais. A Igreja adota tudo isso. A conversão dos integralistas ao “esquerdismo” confirma a unidade comunofascista. O Vaticano II foi a passagem de uma coisa para o que parece ser outra.

O cristianismo é teocêntrico. O marxismo é antropocêntrico e cosmocêntrico. A dialética concilia. Confundiram fazer o bem com a luta por um mundo melhor (isso é outra reflexão).

Gramsci é obscuro. Burlava a censura dos carcereiros e do PCI. Pregava a “guerra de trincheira” (reformismo?), sem repudiar a revolução. Ambiguidade dos astrólogos é receita de sucesso. Todos podem se ver na obscuridade do texto. 

Gramsci e a hegemonia por ele pregada se beneficiaram disso.


*Rui Martinho Rodrigues
Professor - Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
  

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