terça-feira, 7 de abril de 2020

ARTIGO - E Depois? (RMR)


E DEPOIS?
Rui Martinho Rodrigues*



Napoleão Bonaparte (1969 – 1821) tomou Moscou. George Walker Bush (1946 – vivo) tomou Bagdá e comemorou o fato, a bordo de um porta-aviões, como vitória. Era cedo demais para festejar, em ambos os casos. Guerras exigem a definição de objetivos. Alcançá-los pode ser necessário. Não significa, porém, que seja suficiente.

Durante a guerra de guerrilhas na República de El Salvador houve, nos EUA, quem pressionasse por uma intervenção militar. Os chefes do Pentágono foram contra. Diziam que era preciso ter objetivos bem definidos para depois da ocupação do país, lembrando o Vietnã.

Vivemos uma peste medieval, caracterizada pela falta de vacina ou antiviral específico e a grande infectividade do agente etiológico, propiciando rápida propagação da enfermidade. A baixa patogenicidade enseja portadores assintomáticos que espalham o vírus.

A letalidade é baixa, mas a imensa quantidade de infectados faz da relativamente, pequena parcela de casos fatais, uma tsunami de óbitos, quando expressos em números absolutos. Serviços de saúde e o setor funerário têm colapsado. É preciso tomar a capital inimiga. Isto é: recorrer ao isolamento social. Seriam insuportáveis as consequências, se não o fizéssemos.

Tomar a capital inimiga é modificar a “curva de Gauss” –  o famoso gráfico da distribuição normal dos dados de um fenômeno, desacelerando a propagação da pandemia, dando tempo aos serviços de saúde para que se preparem. Assim teremos vitória.

As perdas humanas serão menores com o distanciamento social. Nada é mais importante do que isso. Bagdá será tomada, ou Moscou. E depois? Não devemos hesitar em planejar o amanhã. Comecemos pelas indagações norteadoras das providências. Quanto tempo poderá Napoleão permanecer em Moscou, esperando a rendição dos Russos? Qual é o tamanho do problema posterior a tomada de Bagdá? Quanto tempo podemos esperar que passe o pico da pandemia? Qual problema social e econômico virá depois?

Haverá inadimplência generalizada, insolvência de empresas, famílias (consumidores) e entes públicos? Caso fortuito e força maior ou fato superveniente serão argumentos inafastáveis na defesa dos devedores inadimplentes e da quebra de contratos.

Como reorganizar a vida pós-peste? Falidos e descapitalizados poderão fazê-lo? O Leviatã assumirá tudo, seguindo o modelo soviético? Ou a dinamicidade da iniciativa privada se tornará ainda mais necessária, a exemplo do ocorrido após o desmoronamento do Império Romano, quando poderes particulares deram origem aos feudos? As moedas nacionais se esfacelarão em decorrência do gigantesco desequilíbrio fiscal e da hiperinflação consequente? Ou haverá algum equacionamento das dívidas públicas e privadas?

Os estados nacionais serão fortalecidos ou a necessidade de coordenação de esforços dará lugar a um poder supranacional, semelhante a um governo mundial? A preocupação com novos eventos semelhantes ou sucessivas ondas da atual pandemia promoverá limitações draconianas da liberdade de locomoção, de expressão do pensamento (no resguardo de uma ciência havida como dogmática), com ativos financeiros controlados pelo Grande Irmão da ficção de Eric Arthur Blair (George Orwell, 1903 – 1950)?

Os que confiam no Leviatã (encarnado em funcionários públicos e comissários políticos) estão esfregando as mãos. Libertários se dividem. Há os que têm esperança do enfraquecimento do Estado, como ocorreu após a queda do Império Romano.

O estabelecimento de uma nova ordem, porém, passa por um período tumultuado, quando aparecem os senhores da guerra, que são bandidos poderosos, conforme exemplo recentemente da Somália, Uganda e Haiti. Correntes totalitárias podem se fortalecer, como tantas vezes se viu após crises profundas, não esqueçamos.


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