E DEPOIS?
Rui Martinho Rodrigues*
Napoleão Bonaparte (1969 – 1821) tomou Moscou. George Walker Bush
(1946 – vivo) tomou Bagdá e comemorou o fato, a bordo de um porta-aviões, como
vitória. Era cedo demais para festejar, em ambos os casos. Guerras exigem a
definição de objetivos. Alcançá-los pode ser necessário. Não significa, porém,
que seja suficiente.
Durante a guerra de guerrilhas na República de El Salvador houve,
nos EUA, quem pressionasse por uma intervenção militar. Os chefes do Pentágono
foram contra. Diziam que era preciso ter objetivos bem definidos para depois da
ocupação do país, lembrando o Vietnã.
Vivemos uma peste medieval, caracterizada pela falta de vacina ou
antiviral específico e a grande infectividade do agente etiológico, propiciando
rápida propagação da enfermidade. A baixa patogenicidade enseja portadores
assintomáticos que espalham o vírus.
A letalidade é baixa, mas a imensa quantidade de infectados faz da
relativamente, pequena parcela de casos fatais, uma tsunami de óbitos, quando
expressos em números absolutos. Serviços de saúde e o setor funerário têm colapsado.
É preciso tomar a capital inimiga. Isto é: recorrer ao isolamento social.
Seriam insuportáveis as consequências, se não o fizéssemos.
Tomar a capital inimiga é modificar a “curva de Gauss” – o famoso gráfico da distribuição normal dos
dados de um fenômeno, desacelerando a propagação da pandemia, dando tempo aos
serviços de saúde para que se preparem. Assim teremos vitória.
As perdas humanas serão menores com o distanciamento social. Nada é
mais importante do que isso. Bagdá será tomada, ou Moscou. E depois? Não
devemos hesitar em planejar o amanhã. Comecemos pelas indagações norteadoras das
providências. Quanto tempo poderá Napoleão permanecer em Moscou, esperando a rendição
dos Russos? Qual é o tamanho do problema posterior a tomada de Bagdá? Quanto
tempo podemos esperar que passe o pico da pandemia? Qual problema social e
econômico virá depois?
Haverá inadimplência generalizada, insolvência de empresas,
famílias (consumidores) e entes públicos? Caso fortuito e força maior ou fato
superveniente serão argumentos inafastáveis na defesa dos devedores
inadimplentes e da quebra de contratos.
Como reorganizar a vida pós-peste? Falidos e descapitalizados
poderão fazê-lo? O Leviatã assumirá tudo, seguindo o modelo soviético? Ou a
dinamicidade da iniciativa privada se tornará ainda mais necessária, a exemplo
do ocorrido após o desmoronamento do Império Romano, quando poderes
particulares deram origem aos feudos? As moedas nacionais se esfacelarão em
decorrência do gigantesco desequilíbrio fiscal e da hiperinflação consequente?
Ou haverá algum equacionamento das dívidas públicas e privadas?
Os estados nacionais serão fortalecidos ou a necessidade de
coordenação de esforços dará lugar a um poder supranacional, semelhante a um
governo mundial? A preocupação com novos eventos semelhantes ou sucessivas
ondas da atual pandemia promoverá limitações draconianas da liberdade de
locomoção, de expressão do pensamento (no resguardo de uma ciência havida como
dogmática), com ativos financeiros controlados pelo Grande Irmão da ficção de
Eric Arthur Blair (George Orwell, 1903 – 1950)?
Os que confiam no Leviatã (encarnado em funcionários públicos e comissários
políticos) estão esfregando as mãos. Libertários se dividem. Há os que têm
esperança do enfraquecimento do Estado, como ocorreu após a queda do Império
Romano.
O estabelecimento de uma nova ordem, porém, passa por um período
tumultuado, quando aparecem os senhores da guerra, que são bandidos poderosos,
conforme exemplo recentemente da Somália, Uganda e Haiti. Correntes
totalitárias podem se fortalecer, como tantas vezes se viu após crises
profundas, não esqueçamos.
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