quinta-feira, 16 de abril de 2020

ARTIGO - Andarilho sem Passaporte (AS)


ANDARILHO 
SEM PASSAPORTE
 Arnaldo Santos*
   

Seu nome é Covid, sobrenome 19 – viajante sem passaporte. Para o vírus que a causa não existem fronteiras ou distâncias que não possam ser ultrapassadas. 

O roteiro da sua viagem tem escala planetária. Os satélites em órbita da Terra registram sua passagem por 104 países, e ele segue viagem em velocidade supersônica. Nas condições atuais, um vírus pode abrir caminho de Paris a Tóquio e ao México em 24 horas; é o que afirmam os pesquisadores. 

Nos países que visitou colapsou o sistema de saúde público e privado, do oriente ao ocidente, paralisou as maiores economias do mundo e mandou para a UTI alguns dos grandes líderes políticos mundiais, como o Primeiro-Ministro britânico Boris Jhonson. 

Como afirmou o historiador e filósofo Noah Harari, “na batalha contra o coronavírus, a humanidade carece de líderes”.

Referindo-se ao fechamento das fronteiras, medida adotada por alguns países visitados pelo senhor coronavírus, Harari completa: “O antídoto contra a pandemia não é a segregação, e sim a cooperação”. E arremata: “A história indica que a proteção se obtém com a solidariedade mundial”. A julgar pelo que estamos observando por parte das grandes potências mundiais, estamos longe dessa cooperação – muito pelo contrário. 

O poder de destruição do senhor coronavírus não é bélico, nem tecnológico, mas seus efeitos criam um ambiente de guerra em todas as nações por onde passa.

A precisão e a velocidade com que dispara suas armas virais e atinge seus alvos não escolhe classe social, cor, raça, religião ou ideologia. 

Por ironia, o efeito destrutivo disseminado por esse viajante é absolutamente democrático, até mesmo entre aquelas nações de regimes autoritários, como China, Rússia, e Irã – para citar alguns fortemente atingidos por esse viajante.

Seu maior legado são milhares de cadáveres, muitos deixados até na via pública em decorrência da saturação dos serviços funerários em algumas cidades mundo afora, por onde tem passado. 

Ainda assim, a Covid-19 teve quem apelidasse de “gripezinha e “resfriadinho”.

Para agravar ainda mais essa situação mundial desalentadora, o indesejado viajante já está grassando no Brasil, onde as condições para disseminação do seu potencial destruidor são ainda mais favoráveis, tanto do ponto de vista político, quanto pelas condições econômicas e sociais. 

Sua primeira incursão por aqui foi pelos endereços nobres das grandes cidades onde mora a classe média-alta brasileira, mas já chegou às comunidades urbanas, aos povos indígenas e ribeirinhos nas densas florestas da Amazônia, e prossegue, avançando! 

No momento em que eu escrevia essas maus traçadas linhas o último relatório epidemiológico do Ministério da Saúde do Brasil informava que já eram mais de 28 mil infectados, se aproximando dos 30 mil (é possível que, enquanto você lê esse artigo, já tenhamos atingido esse número), e já eram quase 2 mil o número de mortos. 

Por essas bandas dos trópicos o andarilho sem passaporte encontrou altíssima densidade populacional, elevados índices de pobreza e  desigualdade, onde falta até água para higiene das mãos, precário sistema de saúde pública e privado (felizmente temos uma equipe de profissionais de saúde de elevada capacidade e formação técnica, e altíssima dedicação), a despeito de um Governo Federal pouco eficiente e de um ambiente político onde quem deveria liderar e proteger o cidadão, especialmente os mais pobres, desorienta e divide a sociedade em razão de interesses políticos menores, assumindo uma postura maniqueísta sem precedentes na história recente do País.

Por isso fique em casa. Evite contato com esse viajante!


6 comentários:

  1. Um dos poucos ensaios literários que eu li e foi rico, a partidário e com uma reflexão suave e completa. Parabéns amigo.

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  2. Um dos poucos ensaios literários que eu li e foi rico, apartidário e com uma escrita suave e reflexão completa.
    Parabéns amigo.

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  3. Parabéns Arnaldo. Excelente artigo.

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  4. Parabéns pelo texto. Todas as reflexões propostas partem de uma sensibilidade que a poucos toca. Uma escrita intelectualmemte lúcida e brilhante.

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  5. Parabéns, Arnaldo Santos! Por sua habilidade de transcrever tão bem o contexto histórico que estamos vivendo.

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