sábado, 29 de fevereiro de 2020

CRÔNICA - Essa Outra (ES)


ESSA OUTRA
Edmar Santos*


Cerveja é substantivo feminino. Para mim isso diz muita coisa, no que concerne a por que gosto tanto dela.

Pshu, a tampa reclamou quando largou do gargalo. O líquido amarelo dourado que derramava lembrava a princesa que, da torre, escorria seus longos cabelos até embaixo. No copo, a espuma branca reluzia a luz do sol, como um sorriso de quem acaba de fazer clareamento dental.

Ela me apetece. O prazer de degustá-la ao fim do dia, após uma jornada de trabalho, parece entorpecer a mente, enquanto o cérebro se prepara para o outro dia.

Em casa, certa vez, notei que minha mulher reparou na relação que eu tenho com a cerveja. Prestou atenção em cada ato do ritual que eu realizava para preparar um momento de degustação: aconchego das garrafas no congelador; taças específicas para o tipo lager; cumbucas com amendoim e castanhas de caju; cubos de queijo coalho ao azeite de oliva; linguiças toscanas que fritavam numa air fryer. Acho que o ciúme bateu!

Ela me indagou o porquê de tudo aquilo que eu estava fazendo; eu, com meu jeito de desentendido, disse que iria tomar uma cervejinha pra relaxar. Ela me olhou como quem estava sendo substituída por outra e disse imperiosa: “Coloque uma taça pra mim. Vou ver que gosto tem essa outra aí”. Essa oura aí? A ficha caiu!

Entendi que o problema não era comigo; era entre elas. Para mim, se a experiência com uma companhia feminina já é boa, imagina com duas. Bebi com mais prazer!


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