quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

ARTIGO - Honra ao Mérito (VM)


HONRA AO MÉRITO
DA
ACADEMIA CEARENSE
DE
ODONTOLOGIA*
Vianney Mesquita**



A Odontologia é um mister a exigir do seu  oficiante o senso técnico de um artista, a destreza de um cirurgião, os conhecimentos científicos de um médico e a paciência de um monge. (São Pio XII).


A Escolástica, linha do pensamento cristão da Idade Média, sugere a quem for estabelecer contato com um circunstante, para cuidar de qualquer assunto, a ideia configurada no dístico “Sê breve para ser agradável” (Esto brevis et placebis).

Como, porém ser rápido, atendendo a este juízo da Filosofia medieva, se outro valor mais alto se alevanta? (L.V de Camões, n’Os Lusíadas).

Sucede-me, pois, agora um dos incontáveis instantes especiais da vida, diuturnamente repetidos, que me oferece as delícias da felicidade, pois, talvez até sem corresponder em merecimentos, sou uma pessoa sobejamente feliz, em todos os aspectos da existência.

Por tal pretexto, nova ária componho, celebrando a vida, na ocasião em que, pela inexcedível benevolência dos imortais dessa Academia, recebo, juntamente com o Presidente da Academia Cearense de Medicina, meu amigo – Prof. Dr. Aprígio Mendes Filho (UFC-óbito em 11.01.2016) – o diploma de Honra ao Mérito deste Silogeu.

Ramalho longínquo daquela sociedade onde Platão prelecionava, nos jardins de Academo (rei lendário da Ática), esta umbela seleta abriga doutos mestres cearenses da Odontologia, Ciência cujas origens mais remotas são iluminadas apenas por suposições de pesquisadores. Reúne, então, o que há mais de expressivo em matéria de representação de suas cátedras, para dar como regalo ao Ceará uma sociedade científica mais viva, atuante, moderna, em dia com o estado d’arte da atividade, e que se estende à comunidade, a fim de serem cultivadas e cultuadas, também, as manifestações das coisas do espírito.

A Academia Cearense de Odontologia ostenta-se, com raro sucesso nos resultados, como instituição plural, privilegiando a Ciência, a Tecnologia, as Artes e a Cultura de modo geral.

Sendo assim, é lícito proclamar para todos os quadrantes da Terra o fato de que esta Casa constitui, das do seu gênero, a maior operadora em nosso meio, o que já a fez ultrapassar os umbrais do Ceará e do Brasil.

Sem pretender importunar a assistência, nem ralar a paciência dos confrades e confreiras deste Sodalício, tampouco desobedecer à Ordem de Santo Tomás de Aquino e Guilherme de Occam, não será ocioso, para informação aos leigos e memento dos facultativos, delinear a larga seara onde mourejam os profissionais da Ciência do médico francês Pierre de Fauchard.

Ao campo odontológico pertencem os dentes, sua articulação e os aparelhos que os sustêm; a mucosa da cavidade bucal; lábios e partes salientes da face; a língua e o assoalho da boca; os palatos duro e mole, os maxilares e as mandíbulas; os músculos da mastigação e articulação de têmporas e mandíbulas; as glândulas salivares; a fluidez sanguínea e a drenagem linfática.

Não se há de esquecer de que todas as relações das mencionadas partes com o restante do organismo também se compreendem no âmbito da Odontologia. Consoante ocorre, ainda, com as estruturas limítrofes da boca, seios maxilares como os de todas as cavas humanas, é a boca a mais suscetiva a traumas e infecções, sendo sede frequente da manifestação de muitas doenças.

Por esta razão, as universidades e centros de ensino e pesquisa da Dentística procuram, como fazem os cursos de Odontologia das Universidades Federal do Ceará, e de Fortaleza – UNIFOR, fornecer ao estudante, ao profissional e ao professor uma compreensão adequada do organismo humano, com o emprego da qual estes poderão colaborar com os demais agentes científicos da saúde.

Evidentemente, não se há de postergar a importância plástica da boca, sendo que os variados aspectos da Ciência-Arte de Sá Roriz são muito bem delineados por São Pio XII, conforme está na epígrafe, tudo isso, digo, adicionado a uma compreensão holística do ser, do cliente como pessoa humana, com problemas transpostos às moléstias orgânicas.

Em decorrência de todo esse espectro de atuação do cirurgião-dentista, é que hoje são objeto de risco e mofa as denominações antigamente conferidas aos profissionais do Brasil e d’alhures.

Imaginemos, hoje, uma Academia Cearense de Barbeiros, Cabeleireiros, Sangradores e Dentistas... Proh pudor!
Seria realmente risível!

Bem mais do que barbeiros e sangradores, denominações ingênuas do empirismo da Ciência Odontológica, temos, aqui na Casa, cientistas dos diversos sub-ramos odontológicos (incluindo-se a implantodontia), doutos de seu ofício, ecléticos do conhecimento global, homens e mulheres cultos, com alçado padrão de preparo intelectual também noutras esferas do saber.

Comprovam esta prontidão espiritual seus invejáveis curricula-vitae, haja vista a atuação vigorosa de cada qual, na perseguição do conhecimento, por meio de cursos, seminários, congressos, conferências e assemelhados.

Testemunha esta grandeza o vigor da Academia, traduzido no seu patrimônio físico e intelectivo, com maciça comparência a cada evento – seja ele ligado direta ou indiretamente à Ciência Odontológica – na excepcional Revista que edita, na biblioteca, museu, casa de artes, nas múltiplas promoções do seu Núcleo Feminino, nos natais, festas de Páscoa, nos cursos de pós-graduação que oferece, nas iniciações de acadêmicos e nas multivariadas ações institucionais.

Muito me comprazo, pois, com fazer referência ao bom número de colegas professores e amigos da Universidade Federal do Ceará, componentes desta Academia Científica, adiante dos quais, por motivo de gênero, menciono a minha mais ilustrada conterrânea, de Palmácia, a Professora Doutora Maria Grasiela Teixeira Barroso, gente da mais alta estima e ab imo corde.

Seguem-se os professores-doutores José Dilson Vasconcelos de Menezes, José Mário Mendes Mamede, Manuel Perboyre Gomes Castelo, Aldo Frota Nogueira, Flávio Prata Crisóstomo, Haroldo Beltrão, Augusto Mota Borges Filho e outros, os quais – malgrado não privar estreitamente de suas amizades – conheço seus perfis humanos e acadêmicos, seja por meio de funções que desempenhei da U.F.C. ou os acompanhando pela leitura da Revista da A. C. O.

Os demais árcades, que não abraçaram o sacerdócio pedagógico, são todos grados partícipes da sociedade fortalezense pela missão que exercem de minimizar, com o máximo de competência e visão holística, os problemas bucais e periféricos em uma terra de edêntulos, conforme é o Ceará, cientes de que fazer cessar a dor corporal e espiritual é trabalho de Deus, que nos quer à Sua imagem e semelhança.

Exprime uma sentença corrente: Àquele que julga com amor ocorre de enxergar um corvo branco. Talvez tenha sucedido com o Dr. Dilson Menezes, ao me saudar nesta solenidade, pois carregou um pouco nas tintas do sentimento.

Recebo, pois, humilde, do mais recôndito da alma, a dignidade que a Academia Cearense de Odontologia me confere nesta oportunidade. Dela farei troféu. Transformá-la-ei em lauros nobilis, aquele ramo de Dafne – a ninfa mitológica – que, perseguida por Apolo, invocou a Terra, sua mãe, e foi por esta transmudada nos louros da vitória.

Então, invito a sabedoria de Lao-Tsé, para quem o agradecimento é a memória do coração.



*In MESQUITA, Vianney. Fermento na Massa do Texto. Sobral: Edições UVA, 2001, pp. 123-6. Texto, modificado e atualizado, de conferência proferida em 13 de setembro de 1999, quando da recepção do Diploma de Honra ao Mérito, conferido pela Academia Cearense de Odontologia, por sugestão do presidente, na época, Prof. Dr.Francisco Wilson de Vasconcelos Dias (falecido). 




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