PEGA-VARETAS
Reginaldo Vasconcelos*
Acreditei
em Fernando Henrique Cardoso até que ele deu um jeito de duplicar o próprio
patrimônio mandatício, patrocinando a Emenda Constitucional que permitiu a sua
própria reeleição. Independentemente de ser contra ou a favor da possibilidade de
recandidatura de executivo, é obvio que ela não deveria valer para quem a
instituiu.
Quando
Lula da Silva foi eleito a vez primeira todos exultamos, acreditando que enfim
se combateria a corrupção, o nepotismo, o marajalato no serviço público, que
Collor de Mello, sob profunda "reserva mental", prometera falsamente que faria.
Pessoalmente, acreditei que Lula tentaria moralizar a República – mas não me
convencera de que conseguiria.
Em
face dessa minha suspicácia sobre a capacidade de Lula de fazer a faxina
político-administrativa necessária e prometida pelo partido que fundara,
conversei com o meu amigo Artur da Távora, velho jornalista e então Senador da
República, sobre as minhas crenças e sobre as meus receios em relação ao futuro
do País dali avante.
Lembro
que lhe manifestei a minha preocupação com Marisa Letícia, que sabia eu ser uma
pessoa de origem muito humilde, e que por isso mesmo iria sofrer muito o
fracasso do marido, pois é muito melhor permanecer no solo que ser guindado ao
topo da palmeira social, para ser arrancado de lá, voltando violentamente ao
rés do chão.
Mas,
como visto, Lula nem tentou moralizar coisa nenhuma, centrando-se em
implementar boas políticas sociais de melhoramento econômico das faixas mais
humildes, com uma melhor distribuição de renda, mas sem conseguir promover a
sua real evolução intelectual. A escola pública foi universalizada, mas não
melhorou em qualidade de ensino.
Essas
duas circunstâncias – a promoção de um melhor padrão de vida para a pobreza,
deixando de investir pesado em educação de qualidade (ao contrário do que fizeram os países asiáticos para se desenvolverem), foi se revelando a
fórmula mágica para manter os partidos do Governo no poder.
Conquistando
a maioria carente do povo por meio de políticas paternalistas, sem procurar
dotá-lo de descortino para exercer o genuíno espírito crítico, se perpetuariam
no poder por meio do escrutínio universal – assim imaginavam. E tal estratégia
funcionou por 15 anos – mas por fim implodiu, matando finalmente de aneurisma a
inditosa “Galega” de Lula, cujo calvário eu previra anos atrás.
O
resultado de tudo isso é a profunda crise econômica que vivemos, a falência de
muitos estados federados, o desmantelo ético deflagrado, o império absoluto da
sociopatia na vida brasileira. As vísceras da Nação expostas ao mundo, trazendo
descrédito e desprezo, vergonha para todos nós ante o estrangeiro.
A
desmoralização das grandes empresas estatais, como a Petrobrás, o BNDES, o BNB,
o Banco do Brasil – por fim, o
estabelecimento definitivo do estado paralelo no País, por meio do empoderamento
do crime organizado estabelecido nos presídios, enquanto as polícias militares
se aquartelam e se amotinam.
No
Palácio do Governo o Presidente, ele mesmo suspeito de ilícitos, não consegue
nomear ministros probos, no sensível pega-varetas de delações à Operação Lava
Jato da Justiça Federal, que traz a lume, não uma série de delitos isolados,
mas a corrupção sistêmica e generalizada que alimentava o processo eleitoral e
enriquecia os políticos brasileiros, que se mancomunavam com as grandes
empreiteiras.
Diz-se
que houve um “golpe parlamentar” contra a Presidente da República que foi alvo
de um impeachment, sem considerar que
ela vinha de uma dinastia política hegemônica de uma década e meia, formada por
uma grande coalizão de apoiadores desonestos – que enfim a abandonaram ou se
voltaram contra ela – e o fizeram quando ela precisou praticar um evidente
“estelionato eleitoral”, vencendo a reeleição com base numa plataforma falsa e insustentável.
Fala-se
que o PSDB, grande antagonista do então partido do Governo, e que perdera a
eleição presidencial, seria o artífice da derrocada posterior da candidata
vencedora. Contudo, como no jogo de futebol há o time que perde porque o outro
vence (por jogar bem), e o time que ganha porque o outro perdeu (por jogar
mal), o PT não soçobrou por ação do adversário, mas pelos erros dele mesmo, que
o levaram a perder sua base política no Congresso.
Alguém
saberia dizer por que Michel Temer era o Vice-Presidente por duas legislaturas
do PT? Creio que a razão é ambidestra. Dilma o queria lá para garantir o apoio
do maior partido do Congresso, a que ele pertence, tendo em vista aprovação de
todas as matérias de interesse do Governo; e, na outra mão, ele queria estar lá
para garantir que os seus correligionários obtivessem benesses, assaltando as
verbas públicas – dentre eles Eduardo Cunha, hoje demonizado e encarcerado.
Agora
o País vai à deriva, de déu em déu, com a cúpula da política toda ela fustigada
pela cavalaria implacável dos pretores federais. Mas, a esta altura, trabalhar contra as
instituições, tão enfraquecidas, e contra os poderes constituídos, que estão em
frangalhos, é trabalhar contra o País. Naufragamos, e não podemos abandonar a
precária tábua de flutuação, se não temos nenhuma outra à vista. Temos que seguir em frente. O “Fora Temer”
é a volta ao nada. Não há mais para onde voltar. Que Deus se apiade de nossas almas!
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