MENSALÃO - ENTENDENDO A CONDENAÇÃO DOS DOIS JOSÉS
No processo do
mensalão, o petista cearense José Genuíno Neto é menos culpado de fato, porém
mais culpado de direito que o ex-ministro José Dirceu.
A explicação é
simples: Genuíno não concebeu e arquitetou o plano criminoso, nem coordenou a
sua execução, como tudo indica ter feito o outro José. Tampouco manipulou
pessoalmente as verbas utilizadas nas propinas.
No entanto, era o presidente
oficial do partido, em nome do qual o tesoureiro oficial operava o esquema, o
que o compromete como autor intelectual, segundo a “teoria do domínio do fato”.
Ademais, ele assinou
documentos que simulavam operações financeiras lícitas, mas que serviam apenas
à lavagem de dinheiro.
Quanto a José Dirceu,
a controvérsia sobre a sua condenação gira em torno da tosca lição jurídica do ministro Dias Toffoli – que se fosse juiz de fato se teria declarado suspeito
para julgar seus ex-clientes, seus ex-chefes, seus amigos íntimos do PT.
Em uma das sessões de
julgamento Toffoli se travestiu de advogado dos réus e saiu-se com o “brilhante”
raciocínio segundo o qual “a acusação é quem tem que fazer a
prova. A defesa não tem que provar sua versão ”.
Com essa pérola, Toffoli
produziu um sofisma perfeito, ao sustentar uma tese falsa, utilizando um
argumento correto. De fato, a acusação tem que produzir provas, enquanto a
defesa não tem nenhuma obrigação de provar nada.
Pelo contrário, produzir provas em seu favor é um direito da defesa, e não um dever. Em não exercendo esse direito, ou não o fazendo satisfatoriamente, faz prevalecer a acusação.
Pelo contrário, produzir provas em seu favor é um direito da defesa, e não um dever. Em não exercendo esse direito, ou não o fazendo satisfatoriamente, faz prevalecer a acusação.
Vale notar que a máxima
jurídica original, que Toffoli quis manipular
para iludir os circunstantes, não fala em acusação, nem em defesa, senão
vejamos: “O ônus da prova cabe a quem alega”.
Ora, quem alega que alguém é
culpado, deve provar o alegado. Do mesmo modo, quem alega que é inocente cumpre
provar sua inocência – e para tanto a lei lhe garante amplo direito de defesa. Pronto.
A regra jurídica resta incólume.
O Ministério Público Federal
alega que José Dirceu era o líder da quadrilha que operava o mensalão,
apresentando uma cadeia de indícios lógicos, que vão compor robustas evidências.
Diz ao final que provas documentais e testemunhas isentas são impossíveis de se obter em delitos desse tipo.
Cabia, pois, à defesa de José
Dirceu desconstituir as evidências e indícios contra ele apresentados, já que
estes costumam ser tão débeis e frágeis. Em vez disso, a defesa se limitou a cobrar
à acusação provas concretas. Por mais frágeis e débeis, provas não refutadas
tomam foro de verdade.
Por acaso, existe algum
documento oficial assinado pelo Ministro Dirceu desautorizando alguma operação
suspeita? Não existe. Há algum bilhete pessoal do petista Dirceu prevenindo o
Presidente da República sobre alguma manobra estranha do seu partido? Não há. Tem
algum artigo publicado por Dirceu repudiando interferências do partido nos
negócios do Governo? Não tem.
Resultado: a acusação cumpriu
o seu múnus de provar as alegações, mesmo sem elementos concretos, enquanto a
defesa não aproveitou bem o seu direito de defesa, já que não apresentou
contraprova nenhuma. Por essa razão José Dirceu foi condenado. Simples assim.
Também não vigora repristinar
os alegados méritos antigos de quem já esteja condenado, pois o currículo pessoal
dos réus só tem peso para aliviar suspeitas, na fase investigatória – não para elidir
penalidades cominadas.
Mesmo o Papa, por exemplo, se acusado de crime, em princípio terá a
seu favor a dúvida da culpa, por se tratar do Santo Padre. Mas, uma vez
confirmada a autoria do crime, o que ele seja ou tenha feito de bom no passado
não o poderá inocentar. Quem sabe, mais ainda o incrimine.
Por Reginaldo Vasconcelos
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