quinta-feira, 4 de outubro de 2012

ENSAIO


JUIZ NÃO ACUSA. JUIZ NÃO ADVOGA.


Pode até ser que José Dirceu seja inocente, no escândalo do mensalão. Como tudo na vida acontece, é sempre possível que ele esteja nisso como aquele sitiante da anedota, injustamente acusado de zoofilia, por sua própria mulher, que o encontrou no estábulo de cuecas, em situação inexplicável.

Como a vaca mexesse muito enquanto ele tirava leite, e derramou o leite do balde sobre ele, ele tirou as suas calças molhadas e amarrou as pernas dela com uma corda. 

Depois, o azarado homem da anedota subiu no banquinho da ordenha, bem atrás do animal, e amarrou sua cauda nos caibros do estábulo com um barbante, para que o bicho, ao espantar as moscas enquanto ele ordenhava, não abanasse a sua cara. Foi nessa situação que a mulher dele o encontrou.

José Dirceu, como Ministro Chefe da Casa Civil, era como um vice-rei da república brasileira. Ou como um primeiro-ministro no presidencialismo do PT. Homem vivido e viajado, esperto e experiente. Acreditar que Delúbio e Valério fizessem um salseiro daqueles, em nome do partido dele, em nome do Governo, com cinquenta milhões de reais, sem que ele percebesse, é um exercício de boa-vontade gigantesco.  Mas... quem sabe... pode até ser.

Quanto a José Genoíno, acredito sim que ele não tenha tido uma participação ativa na materialidade dos fatos, muito menos que esteja entre os autores intelectuais dos crimes, pois se trata de um asceta ideológico, um patriota, um ex-guerrilheiro, jovem idealista preso e torturado durante o regime militar, homem sem luxo e sem ambições maiores, tipo de gente que não gosta de lidar com dinheiros e que não cuida de negócios.

Acredito mesmo que José Genuíno esteja nisso como Pilatos no Credo. Mas acontece que ele está no Credo, e dele não tem como sair. Era o presidente do partido, assinou empréstimos fictícios, afiançou operações fraudulentas. Somente uma tese de incapacidade civil por demência o livraria desse fardo.

O que não se pode admitir, nem com a maior boa-vontade, é que um ministro do Supremo Tribunal Federal formule seus votos acusando a arraia miúda da quadrilha com a virulência de um jovem Promotor de Justiça, e que faça a defesa dos prováveis mandantes dos mesmos crimes com todos os cacoetes dos velhos advogados de defesa.

É claro que um juiz vogal, componente de um colegiado, membro de um tribunal, tem todo o direito, e até a obrigação, de posicionar-se pela condenação de um acusado, ou pela sua absolvição, caso esteja convencido de sua inocência, considerando a prova dos autos e examinando a lei penal. Mas ele não pode muito mais do que isso.

Um ministro do Supremo deve expor sua tese absolutória, e pode defendê-la com unhas e dentes. A tese. Não as pessoas. Ele não pode dar testemunhos pessoais do caráter dos réus, nem daquilo que sobre eles traz a imprensa, como faria, com muita propriedade, um bom advogado de defesa.

Ele não pode insistir com os demais ministros de maneira irresignada, resistir, gesticular com as mãos trêmulas, dramatizar, desqualificar as teses da acusação, como faria um bom advogado, na sustentação oral da defesa.

Exposta a tese, com a máxima riqueza de argumentos, mas sem nenhuma paixão, o membro de um colegiado tem que esperar e se resignar aos votos dos demais, sob pena de inescusável suspeição.

Esta república ainda está muito doente. Que Deus continue se apiedando de nossas almas!

Por Reginaldo Vasconcelos       

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