EMPODERAMENTO
Rui Martinho Rodrigues*
Empoderar é dar poder. O léxico político o direciona aos oprimidos.
Acredita que problemas se resolvem pelo conflito. Pretende modificar costumes e
valores que considera injustos. Supõe que padrões culturais infelicitam pessoas
por serem fruto da assimetria de poder, favorecendo os dominantes.
A opressão pode ser sentida em circunstâncias diversas, conforme a
pessoa. Alguns aspectos, porém, podem ser considerados objetivamente, segundo
critérios explícitos. Assim, oprimido pode ser quem sofre restrição nas
escolhas que não afetam a alteridade. Regular masturbação é opressão, para o
liberal que concebe o autopertencimento da pessoa. Mas o empoderamento não é
liberal. O jusnaturalismo vê opressão no que contraria o Direito Natural, não inspira
o empoderamento antropocêntrico, que não é jusnaturalista.
Opressão pode ser delimitada pelo imperativo categórico (Immanuel Kant,
1724 – 1804), princípios que adotados por todos seriam benéficos por serem
compatíveis com a natureza humana. Não é a inspiração do empoderamento, que é
voltado para a historicidade, não para a natureza humana. Opressão é, para o
empoderamento, a crueldade do sistema social e político. Repudia a experiência
histórica como injusta, não se inspira na experiência empírica. Também não é teocêntrico.
Nem é a razão falseável de Karl Raymond Popper (1902 – 1994). É elucubração
filosófica e propõe uma reengenharia social. Mudança cultural forçada gera
conflito, que historicamente solucionou alguns problemas. Roma destruiu
Cartago, solucionou a convivência com uma potência concorrente. Destruição
semelhante nem sempre é possível e não é desejável.
Escravos sudaneses no Brasil tinham escrita, técnicas de navegação
e fundição de metais. Fizeram dezenas de rebeliões na Bahia, entre a década de noventa
do Século XVIII e as quatro primeiras décadas do Século XIX. Eram muçulmanos,
mas não deixaram nenhuma mesquita na Bahia. Os bantos, ágrafos, sem técnicas
sofisticadas, influenciaram profundamente a cultura brasileira. Pacíficos,
seguiram, sem saber, Sun Tzu (545 a. C. – 470 a.C.). Aproximaram-se do inimigo,
ao invés de odiá-lo.
A mudança cultural forçada exacerba conflitos. A catequese
“esclarecida” está falhando. O interativismo, não o conflito, é a solução. O
significado do justo é parte da cultura. Culturas são incomensuráveis, são
totalidades, não podem ser comparadas. Historiadores consideram errado
interpretar o passado com valores do presente, designando tal conduta como
anacronismo. A consideração do injusto envolve referências culturais distintas.
É etnocêntrico. Comparável ao anacronismo. Foi a conduta dos missionários do
período colonial. A sensibilidade política preserva as culturas dos índios (multiculturalismo
diferencialista), mas não é sensível diante da cultura tradicional, praticando
assimilacionismo que se presume esclarecido.
Padrões culturais são naturalizados. O “natural” é aceito. Não
infelicita, salvo quando a mudança cultural forçada desnaturaliza as práticas
culturais e provoca infelicidade induzida. O conflito resulta em violência
contra o mais fraco. Só os pescadores de águas turvas ganham com isso.
Democracia é o reino das leis, não das pessoas. Norberto Bobbio (1909 – 2004)
ressalta que as duas primeiras gerações de Direito eram contrapoder. Diziam ao
mais poderoso: não mate, não roube, não tome a mulher do outro, limitando o
poder do mais forte. A segunda geração disse ao governante: não cobre imposto
sem lei que o autorize, não prenda sem culpa formada. Contrapoder é norma boa.
Empoderar enseja abuso e conflito.
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