AÇUDE
CASTANHEIRO NO VALE DO JAGUARIBE
Por
Cássio Borges*
No auge das discussões em torno da construção ou não da Barragem
do Castanhão, no ano de 1986, o DNOCS foi acusado de ser “contra” a referida
obra, motivado por “ciúme” dos seus técnicos às incursões do Departamento
Nacional de Obras de Saneamento - DNOS em sua tradicional e exclusiva área de
atuação no semiárido nordestino, uma repetição da situação atual às mesmas pretensões da CODEVASF - Companhia de
Desenvolvimento do Vale do Rio São Francisco.
Era o início de uma luta do tipo “vale-tudo” para minimizar uma questão até então vista sob o prisma “sócio/econômico/ambiental” e
transformá-la numa tese “político-partidária”.
Para isso, mobilizou-se a opinião pública com avassaladora propaganda e
marketing na mídia (nunca visto), para persuadir a opinião pública, leiga em
assuntos de engenharia, à aprovação
desta mega barragem no Estado do Ceará.
Desde então, criou-se um
clima eufórico favorável à construção
desse empreendimento que tinha como objetivo principal a implantação de 75.000
hectares de irrigação na Chapada do Apodi. Naquela ocasião, entre outros argumentos falaciosos para
justificar essa obra, diziam “tratar-se de uma reivindicação de 80
anos da população cearense”, numa ardilosa referência a um acidente geográfico,
denominado, Boqueirão do Cunha mapeado pelo geólogo Roderic Crandell, em 1911,
a serviço do IFOCS - Inspectoria Federal de Obras Contra as Secas, quando foi
publicado o primeiro mapa geológico da região nordestina.
Até o ano de 1985, quando a Barragem do Castanhão surgiu no
cenário cearense, o DNOCS jamais havia previsto qualquer reservatório de acumulação no Boqueirão
do Cunha. Até então, não existia nenhuma bibliografia, seja do
DNOCS ou da SUDENE, ou de qualquer outra entidade federal ou estadual que
fizesse referência a qualquer obra de açudagem no referido local indicada
pelo DNOS (não confundir com o DNOCS).
Ademais, o DNOS, com
sede no Rio de Janeiro, não tinha
nenhuma experiência em questões do semiárido nordestino e acabou sendo extinto no governo de Collor de
Melo.
A prova mais evidente do que acima foi dito é o que se vê no
ESTUDO GERAL DE BASE DO VALE DO JAGUARIBE (12 volumes), no tomo POLÍTICA DAS ÁGUAS, publicado pelo
GRUPO DE ESTUDOS DO VALE DO JAGUARIBE-GVJ/SUDENE, em 1967 (considerado a bíblia
do Vale do Rio Jaguaribe), cujo trecho do Capítulo II transcrevo a seguir:
“Os açudes Orós, Banabuiú e Castanheiro constituirão a estrutura
básica do sistema de regularização do potencial hidráulico do Vale do Jaguaribe
e assegurariam um descarga utilizável de 34,5 m3/segundo, permitindo
a irrigação de 72.500 há efetivamente
irrigados. Essa estrutura deverá
ser complementada por uma série de obras interanuais que permitirão irrigar
140.000 hectares.”
Pelo
visto, ao contrário do que diziam os seus idealizadores e promotores, não é verdade que o açude Castanhão se “constituiu” numa reivindicação de
80 anos da população cearense.
Deste
estudo da SUDENE tiram-se as seguintes
conclusões:
1)
O Açude Castanheiro, no Rio Salgado, afluente principal do Rio Jaguaribe por
sua margem direita, estaria na cota do
RN= 239m e teria uma área de abrangência
sobre o Vale do Jaguaribe bem maior do que a do Açude Castanhão, na cota 50m, próximo do litoral;
2)
O Castanheiro ficaria distante cerca de 326 km do mar (pelo talvegue do
rio), enquanto o Castanhão está, de
fato, a apenas 150km;
3)
Caso a opção fosse pela construção do açude Castanheiro esse teria uma largura de apenas 40 metros de
comprimento, enquanto o Castanhão foi
construído (pasmem!) com 10.500 metros;
4)
No Castanheiro praticamente não haveria
espelho de evaporação exposto ao sol;
5)
O Açude Castanhão não acrescentou um só centímetro à perenização do Rio
Jaguaribe, pelo contrário, “destruiu”
ou “inutilizou” com a inundação de sua
imensa bacia hidráulica 70 km da
regularização de vazões promovidas pelo
açude Orós e 40 km da perenização promovida pelo Açude Riacho do Sangue.
Por
fim, é lamentável que os
10.000 hectares de férteis solos da Planície de Icó, referido nos estudos do
DNOCS e da SUDENE , ficarão sem possibilidade de utilização porque é uma área
sujeita a inundações periódicas,
problema que seria solucionado pelo Açude Castanheiro. Além disso, sua irrigação dependeria principalmente das
águas acumuladas nesse reservatório.
Os
açudes Orós, Banabuiú e Castanheiro, considerados “Obras Chaves” ou “Barragens
Mães” do Vale do Jaguaribe, teriam também, entre outras, a importante função de amortecer as enchentes em toda aquela importante Região
do Estado do Ceará, conforme enfatiza o
citado estudo da SUDENE.
* Cássio Borges
Engenheiro Civil
Especialização em recursos hídricos e barragens
Membro Honorário da ACLJ
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