O
HOMEM ABSTRATO
Rui Martinho
Rodrigues*
Fórmulas políticas são concebidas para o homem. A Antropologia Filosófica está presente nelas, nem sempre de modo explícito. A modernidade, mormente na vertente contratualista, adotou o pressuposto do estado de natureza, anterior ao contrato social. Nela as relações sociais seriam a expressão da natureza humana. Thomas Hobbes (1588 – 1679), John Locke (1632 – 1704) e Jean Jacques-Rousseau (1712 – 1778) formularam diferentes concepções políticas considerando tal concepção. Peculiaridades culturais, geográficas, econômicas, confessionais, políticas ou de outra ordem foram olvidadas por eles.
As constituições analíticas e programáticas, dirigentes ou totais atendem à inspiração dos intelectuais ironicamente classificados por Thomas Sowell (1930 – vivo) como ungidos. O homem abstrato, criticado por De Maistre, está na base das concepções universalistas, de democracia e organização social, alheias às peculiaridades das sociedades. A ampliação do interesse público, a publicização do direito privado, a exemplo da obra “Direito civil constitucional”, de Anderson Schreiber e Carlos Nelson Konder restringindo a liberdade negocial. É fruto da tutela dos ungidos sobre os cidadãos havidos como incapazes.
No direito privado o que não é expressamente proibido é permitido. No direito público o que não é expressamente permitido é proibido. Luís Felipe de Cerqueira e Silva Pondé (1959 – vivo) denunciou repetidamente em seus escritos a ampliação do interesse público como liberticida. A representatividade, na forma de governo consentido, exerce uma função moderadora do dirigismo fundado em elucubrações criativas, mas distanciadas da realidade. Ganha força, todavia, a ideia de um saber superior, de uma elite intelectual dirigente, que dispensa o consentimento popular para o exercício do poder político, conforme proposta de Vladmir Iliych Ulianov (Lênin, 1870 1924), na obra “O que fazer”. Muitos seguem esta orientação sem relacioná-la com o autor na obra citada.
O ativismo judicial pretende fazer justiça. Atenta
para a singularidade do caso concreto, livre dos limites da norma escrita,
tendo por base princípios tais como a razoabilidade e a dignidade da pessoa. Não
da dignidade peculiar ao caso concreto, mas do homem abstrato. O vanilóquio das
doutrinas que, embora proclamem desprezo pelo abstracionismo idealista, são
eivadas de voluntarismo, titanismo romântico e abstracionismo dos idealistas. A
práxis apregoada não reconhece o erro das teorias da pauperização e do exército
industrial de reserva, bases da inconformidade com a ordem espontânea descrita
por Friedrich August von Hayek (1899 – 1992). O romantismo e o idealismo de
tais cogitações são desnudados por Isaiah Berlin (1909 – 1997), nas obras
“Ideias políticas na era romântica” e “Limites da utopia” respectivamente.
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