A INVEJA
Humberto Ellery*
O fato de eu não fazer parte do time dos “Bolsonáticos”, isto é,
não sou seu eleitor de primeiro turno (votei nele no 2º turno para evitar o que
julguei ser um mal maior), esse simples fato não faz de mim alguém que o
odeia ou, o que é pior, sinta inveja dele.
Sou crítico de suas atitudes, as que julgo estúpidas, mas jamais
critico o homem (que respeito). Apenas atos, atitudes e pronunciamentos
que, a meu juízo, estejam errados. Sou muito rigoroso na apuração dos
fatos a criticar, e nunca me aproximo de calúnias, injúrias ou
difamações, a par de utilizar sempre um linguajar respeitoso,
civilizado e bem educado.
Considero-me um cidadão bem informado e participante da vida
política do meu País, daí ter feito diversas críticas ao Presidente Bolsonaro, “O
Mito”. Nas réplicas que tenho recebido sempre vem o comentário de que assim o
faço porque o odeio, e tenho inveja do seu “sucesso”.
Não pretendo com minhas críticas “fazer a cabeça” de ninguém, muito
menos tentar “abrir os olhos” dos “Bolsonáticos”, mesmo porque “não adianta ter
olhos abertos se a mente é cega” (Oscar Wilde).
Quanto à inveja, não pretendo aqui produzir um ensaio sobre o
assunto (embora pudesse fazê-lo, mas o espaço é pequeno). No
entanto gostaria de elencar algumas considerações
para demonstrar o quanto é absurda a suspeita de que sinto inveja.
Logo de quem!
A primeira coisa a ser dita sobre a inveja é que esse estado mental
não é um sentimento, nem uma patologia, é um desvio de caráter. E quem me
conhece sabe do meu caráter, reto e inatacável.
Para que a inveja se aposse do caráter frágil e maleável de uma
pessoa, e possa então dominá-la, é mister em primeiro lugar que essa
pessoa não tenha amor próprio, não se respeite, reconheça-se inferior e
desprovido de virtudes e qualidades que ele enxerga no objeto de sua
inveja. Seguramente foi pensando nisso que François de La Rochefoucauld afirmou
que “a hipocrisia é o tributo que o vício presta à virtude”. Posso assegurar
que não é o meu caso.
Resisti o quanto pude a escrever sobre este assunto, tendo em vista
que o invejoso vê no invejado qualidades e virtudes que lhe faltam,
portanto terei que falar sobre minhas qualidades e virtudes, com o máximo
cuidado para não ser cabotino, e não maltratar minha humildade, que
considero a mãe de todas as virtudes.
Por falar em humildade, como posso eu, que sou “manso e humilde
de coração”, admirar, respeitar e invejar alguém que com tanta arrogância e
soberba diz: “A Constituição sou eu, pôrra”, “quem manda aqui sou eu,
pôrra” e “cala a boca, pôrra”. Apenas en passant, que fixação
estranha o “Mito” tem pelo sêmen, pois de seu linguajar rasteiro e vazado
em palavras de baixo calão vaza pôrra prá todo lado.
Como posso eu, cultor da “última flor do Lácio”, admirar e invejar
uma pessoa que quando fala temos que fazer um tremendo esforço para
entender frases cheias de anacolutos, desrespeito às mais simples regras
gramaticais de concordâncias, regências verbal e nominal, fora o resto?
Sobre inteligência e cultura eu me recuso a tecer comentários,
fazer comparações, pois fatalmente pareceria cabotinismo de minha parte. Apenas
pergunto aos seus seguidores quantos e quais livros o “Mito” já leu? O que
ele já demonstrou saber sobre a literatura russa, a francesa, a literatura
universal? Conhece ao menos os grandes brasileiros? O que ele sabe de
Música Erudita, de Ópera, de Teatro, de Escultura, de Pintura, de qualquer
manifestação artística?
Com seus parcos conhecimentos de História, falando sobre a
Escravidão, afirmou que “os Portugueses nunca puseram os pés na África”. É
o caso de perguntar sobre a origem dos PALOP – Países Africanos de
Língua Oficial Portuguesa: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São
Tomé e Príncipe (alguém avisa pra ele que, apesar do nome, é um só país)
e, por último a Guiné Equatorial que recentemente adotou o Português como
língua oficial.
Foram vários dias pensando em como abordar uma comparação entre
minhas qualidades e virtudes vis-a-vis as qualidades e virtudes do “Mito”,
sem resvalar para uma inaceitável fatuidade, uma jactância que não guarda
nenhuma relação com a modéstia que tem me acompanhado por toda a
vida. Recuso-me a esse papel.
Prefiro responder como fiz certa vez a um amigo apaixonado pelo
Lula (como são politicamente parecidos o Bolsonaro e o Lula! um
é a imagem especular do outro). Aquele amigo me disse, cheio de empáfia: “Ellery,
você tem é inveja do Lula, porque você com toda sua inteligência e cultura é
apenas um servidor público, e o Lula, mesmo sendo um analfabeto, é
Presidente da República!”.
Respondi que, se fosse para sentir inveja de alguém o escolhido não
seria o Lula, mas um cidadão que por três vezes se candidatou a Presidente e
não foi eleito, perdeu duas eleições e desistiu da terceira, quando percebeu
que seria derrotado novamente.
Era um político baiano que foi Ministro da
Fazenda, Senador, Deputado, e eu critico sua atitude de ter participado do
primeiro e mais pernicioso “Golpe de Estado” de nossa História,
quando ajudou a derrubar do trono o nosso maior estadista, que nos legou
49 anos de Democracia (1840-1889), golpe que a História batizou de forma
grandiloquente de Proclamação da República.
Pois bem, este homem, alguns anos depois da perpetrada a estupidez,
numa demonstração de grandeza e humildade, fez questão de visitar o Imperador
em seu exílio em Paris, e, contrito, reverentemente beijou as mãos do
Monarca e disse: “Perdão, majestade, eu não sabia que República era isso!”.
Desse homem José do Patrocínio disse que “Deus colocou um vulcão dentro de sua
cabeça”.
Se um dia eu resolver ceder à inveja, pela grande admiração e respeito
que lhe devoto, seria desse gigante de pouco mais de metro e meio, feio e
cabeçudo, que eu teria inveja. Seu nome é Rui Barbosa.
COMENTÁRIO
Como escreve bem Humberto Ellery! É de um talento escritário
invejável. E que bem nutrida cerebração, instruída por muita literatura, e de erudição
intelectual refinadíssima.
Ler seus textos causa as vertiginosas e agradáveis sensações de
quem assistia aos espetáculos circenses do passado: o malabarista habilidoso, o
dúctil contorcionista, o lábil equilibrista, o ágil trapezista... Ah! O
capcioso ilusionista!
Nesta sua crônica o título refulge, e o texto evidencia o que ele
signifique exatamente. A peça é um tratado de contradição, de antítese, de
ironia, quando parece querer negar o que afinal ela confirma.
Ellery diz, já nos exórdios, que não julga o homem, mas os seus
atos, e sai de texto afora fazendo comparações pessoais entre si mesmo e a sua vítima.
Ellery sabe, e os psicanalistas mais ainda, que quando alguém diz
de si o que presume ser, no que ele afirma e no que nega, trai o que realmente ele é e o que sente.
Veja-se nesta frase o ato falho, talvez proposital: “...é absurda a suspeita de
que sinto inveja” – ele afirma. E, bem em seguida, se desmente: “Logo
de quem!” – desqualificando impiedosamente o seu antípoda.
De fato Bolsonoro é, como Ellery, um ex-militar, ambos capitães,
mas, no caso deste, um imaculado lacticolor e bem engomado oficial Cisne Branco
de Marinha, e o outro um reles infante do Exército.
Como se sabe, a Marinha é a rainha das Forças Armadas, muito mais
prestigiosa em todo mundo que os enlameados “pés-de-urubu” da infantaria do Exército
a que Bolsonaro pertenceu. Bolsonaro, filho de um agricultor, neto de imigrante; Ellery, de tradicional família, filho de um General e vice-governador do nosso Estado.
Ademais, Ellery, engenheiro químico, é doutor formado, como alegou
aquela desvairada carioca que destratou e humilhou um agente de saúde do Rio de Janeiro – enquanto
Bolsonaro seria apenas um inculto “cidadão”.
Na sequência, a bordo de sua alegada modéstia – Ellery faz comparação
atroz entre a estante de livros que cada qual andou devorando, e com o linguajar
que cada um emprega – ele, muito polido, o Presidente, desbocado.
Mas ele sabe que a maneira rude de falar de Bolsonaro é característica
do jargão militar – e nós sabemos que designar de “bolsonáticos” os
bolsonaristas não é exatamente elegante e delicado, nem dizer que o outro vaza líquido seminal pra todo lado.
Os quarteis incorporaram no discurso, inclusive, a palavra “porra”, como figura
de ênfase, meramente retórica, sem qualquer literalidade, despida de sua
conotação fisiológica e pornofônica, sem relação alguma com a sua acepção original.
Pois se não é inveja, nem despeito, nem aquilo que os alemães
chamam schadenfreude – nem revolta
odiosa por ter Bolsonaro batido nas urnas os seus ídolos da velha política, de direita
e de esquerda – pois que Ellery releve os consabidos cacoetes pessoais do Mito, que não prejudicam a Nação, e
lance as suas lentes analíticas sobre a Equipe de Governo.
Que prenote, note e anote os avanços que, apesar da pandemia, e
inclusive em relação a ela, a Equipe de Governo vem fazendo, com o auxílio
luxuoso das Forças Federais e do Exército Brasileiro, e que a mídia mal-intencionada não divulga.
Considerando que os bons resultados são o que desejam os patriotas,
repito aqui o brocardo que eu lancei outro dia a outro confrade recalcitrante neste Blog: “Não importa a cor do gato; o que interessa é
que o gato mate o rato”. E sob este Governo os ratos, de todos os matizes, quando já não estão mortos estão realmente em polvorosa.
Reginaldo Vasconcelos
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