OS PARTIDOS
POLÍTICOS
Arnaldo Santos*
Os partidos surgiram, pela primeira
vez, naqueles países que adotaram a modalidade de governo representativo, com
suporte na organização dos seus processos civis e sociais. Esse modelo – bom
que se expresse – previa uma gestão do poder por parte dos representantes do
povo.
Em essência, o nascimento dos
partidos tem origem na busca pela criação de organizações de caráter
participativo, é dizer, em razão do crescente aumento da demanda por
participação nos processos das decisões políticas pelas diversas classes e
estratos da sociedade.
Ainda no Século XVII encontramos
registros da existência de dois grandes partidos pertencentes à aristocracia,
atuantes no Parlamento inglês, e de representação política, mas sem relevância
ideológica.
Segundo Weber, não eram mais do que
séquitos de poderosas famílias aristocráticas. É tanto que, sempre que um lord,
por alguma razão, mudava de partido, tudo o que dependesse de sua ação
transmudava para o grêmio de oposição.
Nos registros mais recentes, na
primeira metade do Século XIX, encontramos, na Europa e Estados Unidos, o partido dos notáveis. Esse é o período de afirmação do poder da classe
burguesa, com a difusão das ideias e instituições parlamentares, bem assim a
superação do conflito político pela sua constituição.
No período que precedeu e se seguiu
o final do Século XIX, conforme afirma Norberto Bobbio, em (Dicionário de
Política – Vol.2), essa realidade começou a mudar, quando aflorou o
movimento operário baseado nas transformações econômicas e sociais, resultantes
da industrialização, levando à “ribalta política as massas populares, através
dos movimentos inicialmente espontâneos para logo a seguir dar lugar aos protestos, até a criação do partido dos
trabalhadores”.
Ainda segundo ensina Norberto
Bobbio, “[…]”, é precisamente com o surgimento dos partidos socialistas – na
Alemanha em 1875, na Itália em 1892, na Inglaterra em 1900, e na França em
1905”, que os partidos assumiram configurações completamente novas.
No itinerário malsão da política
brasileira, historicamente, os partidos são a nossa primeira referência de
negação da política, como instrumentos de constituição do bem-estar social
coletivo, no contexto dos ideais de partidos programáticos e representativos de
uma sociedade democrática.
A rigor, os partidos deveriam ser a
porta de entrada para o efetivo exercício de uma práxis política,
segundo nossas ideações, como organizações defensoras das reivindicações
coletivas dos representados, nos oferecendo como opções eleitorais cidadãos
vocacionados para o nobre exercício do poder político, entretanto, sob o
aspecto ético e moral dos candidatos, o que se verifica é uma aguda deterioração,
com graves impactos na qualidade da representação política, e para a democracia.
Para a consecução desse fim, aos
grêmios partidários impõe-se a adoção de critérios no processo de formação dos
seus quadros, mediante o estabelecimento da exigência de um padrão moral e
ético, bem como de um perfil democrático, aos seus filiados, como precondição
para se conceder legendas aos postulantes que disputarão mandatos eletivos;
deveria, mas, na prática, o que prevalece é, tão-só, a “má” intenção daqueles que
buscam se servir da política, em detrimento do bem societário.
As explicações para essa distorção
podem ser encontradas na famosa definição de Marx Weber, onde ele ensina que
“[...] os partidos têm caráter
associativo, obedecem a um fim deliberado, seja ele de ‘objetivo’, a realização
de um plano com intuitos materiais ou ideais, seja ‘pessoal’, isto é, destinado
a obter benefícios, poder, e, consequentemente, glória para os chefes”!
Ainda na trilha de Weber, essa
definição põe em relevo “[...] o caráter
associativo do partido, a natureza da sua ação essencialmente orientada à
conquista do poder político dentro de uma comunidade, e concretamente tem
motivações à consecução de fins, ‘objetivos’ e/ou pessoais”.
No Brasil, essa definição foi
interpretada, e é exercida pelos chefes (donos dos partidos), ao pé da letra,
haja vista o caráter personalista em nossa cultura político-partidária. Não é
por acaso que quase todos os políticos buscam ter um partido para chamar de
seu, o que levou a essa profusão de legendas, consideradas de aluguel. As
eleições do ex-presidente Collor (PRN) e do atual (pelo PSL) são emblemáticas
dessa realidade.
A existência e o desenvolvimento dos
partidos, na teoria política, se fundam ou deveriam se fundar, ancorados pelo
princípio democrático da participação cidadã, e da representação política da
sociedade, para afirmação de um Estado autônomo e soberano, assegurando a
participação do cidadão nas decisões políticas.
Como é consabido, nos períodos de
crises políticas e de transformações econômicas e sociais, com influxo direto
na ordem tradicional da sociedade, como a que vivemos agora no Brasil, a
demanda por participação fica ainda mais intensa, na defesa, especialmente, da
democracia, e aos partidos caberia o
papel de mediador dos conflitos e dessas transformações, mas não é o que
ocorre, pelo menos na realidade fluente.
O antirrepublicanismo da cultura
partidária, no Brasil, se materializa, e tem negativo registro na História
recente do País, no escândalo protagonizado pelos “anões do orçamento”, no
período imediatamente após a redemocratização. Este vergonhoso moto teve
destacada participação, notadamente, dos grandes partidos, visto que alguns dos
pequenos eram, como ainda sucede, da oposição, e pertenciam ao “baixo clero”,
sem qualquer poder e influência.
No referido escândalo, há uma
maneira de associativismo, não no sentido weberiano, em sua definição de
partidos, e sim na modalidade predatória para a prática de crimes contra o
Erário, em que deputados e senadores formaram um conluio, e, durante mais de
uma década, desviaram trilhões do orçamento do Governo Federal.
O método utilizado para essa prática
antirrepublicana foi pela alocação de recursos no orçamento da União, uma das
funções dos congressistas, que formaram uma “associação” de paridos, para, por
via dos seus parlamentares, desviar recursos da saúde, educação, segurança,
habitação, saneamento básico (35 milhões de brasileiros, ainda hoje, não têm
água tratada, e mais de 100 milhões não têm esgotamento sanitário), para o financiamento dos seus projetos de interesses
particulares, (eleições e perpetuação no poder) e dos chefes de suas
agremiações.
Nessa contextura de negar a função
de representação dos interesses políticos da sociedade que deveriam ter os partidos,
é imperioso lembrar, ainda, os mais recentes, e não menos famosos, que foram os
escândalos do “mensalão” e da “lava-jato”, ainda bem acesos na memória.
Com tal ação, os partidos
brasileiros, à extensão da história, não só foram perdendo a legitimidade
intrínseca da representatividade política do País, como legaram às gerações de
hoje o desestímulo à participação política, levando o cidadão de bem,
vocacionado a servir na vida pública, a ter vergonha de participar.
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