DECLÍNIO OU CRISE
DE CRESCIMENTO
Rui Martinho Rodrigues*
Vivemos tempo de incerteza. O ceticismo dos sofistas está em alta.
A dúvida metódica, de Renê Descartes (1596 – 1650) não alimenta a perplexidade e
a dificuldade de entender o mundo e nós mesmos, nem tampouco o relativismo
crítico de Karl Raymond Popper (1902 – 1994). Pode haver correlação fraca entre
a incerteza aludida e a escola do racionalismo crítico que tem como ícone
Thomas Samuel Khun (1922 – 1996). O que temos é desorientação por perda de
referências. Tornamo-nos livres e o preço da liberdade é a solidão. Depressão,
dependência química e suicídio são pandemias em curso. Vivemos a decadência da
civilização ocidental, hoje globalizada? Ou estaríamos iniciando um grande
salto para um patamar mais elevado?
Oswald Arnold Gottfried Spengler (1880 – 1936) diagnosticou o
declínio do ocidente, suscitando polêmicas. Arnold Joseph Toynbee (1889 –
1975), que compreendia o processo histórico como marcado pelo nascimento,
ascensão e queda das civilizações, recusou a ideia spengleriana de declínio da
nossa civilização naquele momento.
O diagnóstico requer o exame de sinais e sintomas. Os primeiros são
objetivos e parecem favoráveis. Ciência e tecnologia avançam vertiginosamente e
a tendência secular para a melhoria universal de todos os indicadores de
qualidade de vida, ao lado do aperfeiçoamento de instituições jurídicas e
políticas, se juntam aos longos anos sem conflagração mundial e proporcionam um
saldo positivo quando cotejados com os sinais negativos, tais como depressão,
suicídio, dependência química, desemprego estrutural e aparente tendência para
a instabilidade política?
Os fenômenos aludidos se relacionam com o mal-estar na civilização (Sigmund Schlomo Freud, 1856 – 1939), tais como a depressão, suicídio e dependência
química citadas e outras disfuncionalidades, embora sejam dados objetivos, têm
relação com a subjetividade dos sujeitos acometidos, guardando íntima relação
com a sensibilidade.
São, portanto, sintomas, não sinais. Estes são de revigoramento da
civilização. Contrastam com os sintomas de decadência. Quais deles seriam
preponderantes: sinais ou sintomas? As civilizações crescem e fenecem. O que
causa a decadência depois do progresso tem relação de ambos os fatores. O
declínio da agricultura teria sido apontado como fator importante na
determinação do ocaso de Roma. Mas a erosão das instituições e a perda de
valores também estiveram presentes naquela decadência.
Faltam, hoje, lideranças capazes no mundo inteiro. Avanços
objetivos, expressos nos indicadores de qualidade de vida, não satisfazem.
Olhamos para a desigualdade, que é a pobreza comparada, não para o bem-estar
objetivo. Renê Noel Theophile Girard (1923 – 1915) formulou uma antropologia
filosófica segundo a qual o homem não tem uma identidada definida, como os
animais. A coruja nasce para ser um caçador noturno de pequenos mamíferos. O
homem não sabe o que será. Construímos uma identidade mimética. A imitação,
todavia, enseja uma competição na forma de um conflito mimético. Inveja leva ao
conflito.
Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.) descreveu o declínio dos regimes
políticos. A república (hoje diríamos democracia) é, para o estagirita,
susceptível de transformar-se em demagogia. A infelicidade e a revolta, a
despeito dos avanços objetivos na qualidade de vida, são induzidas e reforçam o
mal-estar na civilização. Sinalizam a metamorfose da democracia em demagocia. A
desorientação de que fala Theodore Dalrymple (1949 – vivo) guarda relação com a
exploração demagógica.
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