AVANÇOS E TROPEÇOS
Rui Martinho Rodrigues*
Temos abundância de crises. Indicadores econômicos, porém, apontam
importantes sinais de recuperação. Reformas parecem seguir avançando como nunca
em tempos de normalidade democráticas. Só as reformas promovidas por Getúlio
Dornelles Vargas (1882 – 1954) e Humberto de Alencar Castello Branco (1900 –
1967), sob regimes de exceção, se comparam em profundidade e amplitude ao que
temos em andamento hoje. Temos avanços e tropeços.
Crises desnecessárias; declarações polêmicas; ausência de negociações
republicanas e atitudes ásperas entre aliados, levando a constantes rompimentos
são os abundantes tropeços.
São avanços a mais baixa inflação em décadas sem que isso se deva ao
quadro recessivo, pois já tivemos hiperinflação com recessão; índice de emprego
em recuperação antes do esperado; arrecadação a mais alta, em setembro, desde
2014; juros mais baixos da série histórica, afastando suspeita irrogada ao
ministro da economia, que alegadamente estaria a serviço de banqueiros; déficit,
em setembro, o mais baixo dos últimos cinco anos; encomendas de bens de capital
subiram mais de 6%, indicando revitalização da economia; índice Ibovespa se
mostra animador, consideradas as variações positivas e negativas; reformas
importantes parecem caminhar; crimes letais caíram; a apreensão de drogas
ilícitas cresceu; a infraestrutura de transporte começa a ser recuperada,
especialmente ferrovias.
Avançamos apesar das crises ou surpreendentemente elas podem circunstancialmente
promover avanços? As contribuições das circunstâncias para o avanço das
reformas certamente é a necessidade. Todos os entes federativos estão
quebrados. Sem as reformas todos seguirão o caminho trilhado pelo Rio de
Janeiro, Rio Grande do Sul e outros. “A ausência de alternativa clarifica a
mente” (Henry Alfred Kissinger, 1923 – vivo).
A aspereza em geral e no trato com aliados, o excesso de partidos e
a falta de agremiações autênticas; o deserto de lideranças, a mudança cultural
que se inclina para os maus modos e a falta de uma unidade em torno de projetos
estratégicos certamente atrapalham. O efeito paradoxal dos conflitos pode ter
sido forçar o protagonismo do Legislativo, que atacado, apontado como
responsável, diante do desastre tem a mente clarificada do modo aludido por Kissinger.
As negociações republicanas encontram obstáculo na falta de civismo
da tradição macunaímica. Franklin Delano Roosvelt (1882 – 1945) teria dito: “em
política nada acontece por acidente. Se acontece, pode apostar que foi
planejado para acontecer”. Não existem leis, em sentido científico, no campo
das ciências humanas. O determinismo da frase citada é apenas uma hipérbole
para enfatizar o papel da ação finalista na política.
Frases polêmicas, alianças instáveis e outros tropeços podem ser
acidentais, mera expressão de temperamento ou condições emocionais. Pode se
tratar, todavia, de ação planejada, expressão da visão de administração por
conflito. Entendimento de que o trato com a tradição patrimonialista, vícios da
velha política e ardis de inspirações as mais diversas só pode ser conduzido
pela via do conflito, seguindo o conselho de Nicolau Maquiavel (1469 – 1527),
para quem o príncipe deve ter a perspicácia da raposa, para evitar os laços, e
a força do leão, para afugentar os lobos.
O ordenamento jurídico e as condições políticas oferecem a força do
leão aos protagonistas do momento? Eles são dotados da perspicácia da raposa?
Ou a iminência do desastre é a única variável favorável às decisões sensatas?
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