DESABAMENTOS
SILENCIOSOS
Humberto Ellery
32 [...] ali alguma pessoas Lhe trouxeram um homem que era
surdo [...] 34 [...] então voltou os olhos para o céu e, com um profundo
suspiro disse-lhe: ¨EFATÁ!¨, que significa ¨abre-te¨. 35 Com isso os ouvidos do
homem se abriram. (Marcos, capítulo 7,
versículos 32 a 35)
Em meados de outubro desabou em Fortaleza o edifício Andréa,
com grande repercussão na Cidade. Em que pese o reduzido número de vítimas, a população
quedou entristecida, pois enquanto alguns perderam patrimônio, outros perderam
o próprio lar, e uns poucos perderam o valor maior – a vida.
O troar do desabamento ainda ecoava nas ruas da Aldeota, a poeira
ainda não se assentara, quando se ergueu espontaneamente no meio do povo um
formidável movimento de solidariedade e apoio aos atingidos pela tragédia.
Desde o gesto generoso e importante dos mais ricos, até o gesto
singelo, mais simbólico que eficaz, dos mais humildes, a cidade inteira se deu
as mãos e tratou de amenizar o sofrimento das vítimas. Foi comovente, foi
grandioso, foi o meu povo!
E é a este povo maravilhoso, de minha heroica Fortaleza, que me
dirijo para falar de outros muitos desabamentos que estão ocorrendo diariamente
nas periferias mais pobres de nossa querida cidade.
Diariamente dezenas de crianças estão morrendo no desabamento de um
triste prédio chamado “Doenças Infantis Facilmente Curáveis”. Dezenas de jovens
estão morrendo esmagados pelo assustador desabamento de um prédio chamado
“Guerra do Tráfico de Drogas”. Mulheres também estão sendo impiedosamente
dizimadas, abatidas pelas mãos que deveriam antes protegê-las, no desabamento
de um grotesco edifício chamado “Feminicídio”.
Trabalhadores estão sendo atingidos, alguns conseguem escapar com
vida, mas assistem à morte de seus sonhos, de sua dignidade, de sua esperança,
esmagadas nos escombros de um tenebroso edifício chamado “Desemprego”.
Aproveito então esse tempo de Natal, quando, mais que nunca, nossos
corações estão transbordando de ternura, compaixão e amor, para conclamar o meu
povo: Vamos juntos, mais uma vez, nos dar as mãos, e em uníssono gritarmos, em
alto e bom som: EFATÁ! Vamos destampar nossos ouvidos para o terrível ribombar
do derruimento cotidiano desses prédios que, miseravelmente, desabam em
silêncio.
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