RITINHA E RICARDINHO
Totonho Laprovitera*
Em sua deserta vida, nutria o sonho de namorar pra valer, na paixão de se entregar de corpo e alma. Em uma tarde de mormaço, Ritinha avistou Ricardinho, jogador de futebol. De compleição física seca, suas cambotas cambitas indicavam a sua vocação para a prática do esporte bretão.
Quando espiou Ricardinho caxingando, com um par de botinas debaixo do braço e um boné, com a aba virada pra trás, a candidata a maria-chuteira gamou na hora!
Desde então, Ritinha se agarrou à fantasia de ser a esposa do príncipe dos gramados. Já se via morando no Estrangeiro, com os cabelos estirados, tingidos de loiro, e uma reca de filhos falando em inglês. E quando chegassem de férias, em Mucunã, certamente desfilariam na caçamba de uma cabine-dupla pelo distrito, sob os gritos de “urrus” e palmas e assobios do povo.
Nas entrevistas Ricardinho fazia tipo, puxando um forte sotaque carioca e o dedo indicador zanzando pela orelha de abano. Diziam que ele era um ala esforçado, no esquema tático do “professor”. Vivia contando sobre grandes propostas recebidas, mas que não podia revelar, dada a cláusula de sigilo posta em pré-contrato.
Arreada por Ricardinho, Ritinha decidiu abordá-lo no bar do “seu” Doca. Toda nos trinques, vestiu-se de Marisa, perfumou-se de Avon e carregou no encarnado do batom. Chegou de moto-táxi, sentou-se à mesa, pediu uma dose de Campari e uma porção de torresmo para tira-gosto.
Ricardinho já havia entornado sete geladas e umas cinco canas, mordendo um único e enfarofado espetinho de carne de gato. Aí, avistou Ritinha, grelou os olhos na reluzente e recheada carteira de cédulas dela e, em ato de puro interesse, dirigiu-se à beldade:
– Boa noite, broto! Estou vendo que está desacompanhada. Aguarda alguém?
– Boa noite, moço. Não, não aguardo. Estou de passagem, pra me distrair um pouco... sei lá.
– É como digo no Rio de Janeiro, broto: nada como refrescar a mente, num dia de bobeira.
– Pelo sotaque, já vi que você não é daqui. Acertei?
– Na mosca! Nasci em Flores, Russas, mas fui criado em Ramos, Rio de Janeiro.
– E o que você faz da vida?
– Bem, eu bato na redonda pra descolar um troco. Sou atleta profissional de futebol. Ah, eu me chamo Ricardo Augusto, mas atendo por Ricardinho.
– Rita de Cássia, mas pode me chamar de Ritinha...
E assim foi o primeiro capítulo da novela Ritinha e Ricardinho.
Daí por diante, o falatório foi geral em torno do grude do casal. Avexada, Ritinha se entregou à Ricardinho e por um triz não embuchou.
Quanto ao romance, ele durou o suficiente para o onzenário Ricardo Augusto descobrir a situação financeira de Ritinha. Na realidade, o “dinheirão” que ela fingia possuir era fruto de um seguro desemprego, somado à merreca de uma indenização trabalhista.
Quer dizer, de fato, Rita de Cássia era lisa e desempregada. Por sua vez, Ritinha descobriu que Ricardinho era jogador sem-futuro e figurinha carimbada no ofício de ludibriar pequenos e bem intencionados clubes de futebol. Aí ela pegou abuso dele, que além de viver bichado, não tinha habilidade para dar três míseros pezinhos.
Restou
ao casal, o que sempre articula o professor Carlinhos Analfabético: “Don’t cry because it’s over, smile because
it happened”, ou seja, “Não chore porque acabou, sorria porque aconteceu”.
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