REPÚBLICA
BOLSONARISTA!
Arnaldo Santos*
Com fulcro no melhor direito, especialmente na
ação de julgar e decidir, a que os magistrados em todas as instâncias do seu Poder
são instados a fazer diariamente, também na política, os governantes, nos três
níveis do Executivo, são chamados a tomar decisões complexas, com repercussão
direta na vida de milhões de pessoas.
Assim também ocorre, ou deveria suceder, no Poder
Legislativo – União, Estados e Municípios – quando os parlamentares são
acionados para formular, debater e aprovar as leis, que terão rebatimentos
econômicos, políticos, sociais e jurídicos, para toda a população.
Numa sociedade de desenvolvimento tardio como a do
Brasil, que acumula défice primário também na área do saber, convivendo com altos
índices de pobreza e desigualdades, nem uma decisão de ordem política, levada a
efeito por aquele que esteja no exercício da Presidência da República, pode
prescindir de fundamentação nas Ciências Políticas e Jurídicas, na Psicologia e
na Sociologia, para que os efeitos produzidos venham ao encontro das
expectativas da sociedade.
Nas democracias modernas com sociedades em
movimento, guiadas pelos valores e costumes do Século XXI, respeitadas as
competências específicas, inerentes a cada um dos tomadores de decisão no
âmbito dos três poderes, visando à preservação e à tutela dos melhores
interesses coletivos, todos, sem exceção, devem fazê-lo tendo como fim a paz
social, razão por que é esperado que o façam ancorados nas teorias da
interpretação e da decisão, além de motivadas e justificada sua fundamentação.
Na senda jurídica, Aristóteles preconizou a noção
de que o juiz, para decidir adequadamente, necessita da combinação de
capacidades intelectuais, bem assim de sólida formação moral para entender as
consequências dos seus julgados.
Na política contemporânea, hajam vistas as complexidades
próprias de cada regime, os legisladores e os governantes, além das capacidades
referidas pelo Sábio de Estágira, prerrequisitos para que sejam capazes de
compreender e avaliar o largo espectro de valores e interesses que envolvem as
decisões de um chefe de Estado, devem ainda expressar a soberania do povo, o
que exige total impessoalidade.
Examinando o governo do Presidente Bolsonaro,
constata-se que as decisões de maior repercussão para o País se fundam, tão-somente,
em seus valores, vontades e preferências pessoais, na sua ideologia e visão de
mundo negacionista em relação às ciências. No âmbito da sua ideação de
República, reedita o patrimonialismo e tenta situar as instituições do Estado a
serviço dos seus familiares e amigos, como sobrou demonstrado nas denúncias de
interferência e tráfego de influência na Polícia Federal. Isto evidencia de modo
maiúsculo a existência de uma cisão entre o governante e os governados.
Ainda analisando as políticas efetivadas no
governo, a sociedade assiste, estupefata, a uma série de decisões “intuicionistas”,
deliberadas pelo Presidente Bolsonaro, tanto em relação ao enfrentamento à Covid-19, como na relação com seus ministros (os ex-ministros Mandetta e Teich,
da Saúde, e Moro, na Justiça, são emblemáticos).
Assim também acontece em
relação à imprensa, bem como aos outros dois poderes da República, observando-se
atitudes intensivamente influenciadas por suas subjetividades – e convicções
não justificadas – desprovidas de quaisquer dos fundamentos teóricos das Ciências
Sociais, que devem orientar o ato de decidir para bem governar, buscando o bem-estar
coletivo desta Nação.
A explicação para esse comportamento errático do
Presidente em seus processos decisórios repousa na literatura que cuida das
várias teorias da Psicologia da Justificação da Decisão, e da Psicologia
Cognitiva Social, que oferecem vários estudos sobre “cognição dissonante”,
“conforto cognitivo”, “heurísticas”, “vieses”, dentre outros. O exame dessa
literatura permite compreender os fatores de suas ações dissonantes.
Daniel Kahneman (Israel) Nobel de Ciências
Econômicas em 2002 (dividido com Vemon L. Smith – EUA), pelo estudo que
desenvolveu em Economia Comportamental, no livro Rápido e Devagar,
cuidando das “heurísticas” e dos “vieses”, também explica os dois sistemas que
conduzem e estruturam o pensamento, assinalando a ideia de que um é rápido,
intuitivo e emocional, e o segundo é mais lento, mais deliberativo e mais
lógico, mediante os quais as pessoas orientam e estabelecem julgamento,
avaliação e decisão. Nesse sentido, é válido acentuar que o primeiro sistema é
o que motiva e orienta as escolhas e definições das políticas pelo Presidente
Bolsonaro.
Ainda ancorado no pensamento de Kanheman, com
amparo em suas pesquisas sobre decisão comportamental, constata-se que, na
limitação da racionalidade, pessoas com escassos recursos mentais rejeitam os
processos complexos que envolvem uma decisão racional, a ser sempre precedida
de minuciosa avaliação das repercussões resultantes daquele ato, especialmente
quando o tomador dessa ou daquela decisão é o chefe de uma Nação.
Seguindo essa linha teórica, sabe-se que o
raciocínio é suscetível ao que se conhece como “atalhos cognitivos”, e “desvios
sistemáticos”, levando muita vez o tomador de decisão a agir premido pelo tempo
e baseado em informações incompletas, deixando-se influenciar por palpites dos
poucos íntimos que o cercam, mas que confirmam sua intuição e convicções já consolidadas,
ainda que sabedor de que todos esses ignoram a necessária engenharia mental que
articula os interesses e valores que envolvem o ato em decurso de deliberação.
Esse conjunto de influências impede que a decisão
seja tomada objetivamente, respeitando a impessoalidade e a neutralidade
exigidas nos processos de definição das políticas de governo – livres dos
chamados “vieses”. O exemplo mais contundente foi a recomendação editada
pelo Ministério da Saúde para o uso da cloroquina, um fármaco sem comprovação
científica de eficácia para tratamento da Covid-19, a despeito de todas as
opiniões em contrário da comunidade médica e científica, do Brasil e do Mundo, submetendo
a risco a saúde e o bem-estar da população! Na “nova política bolsonarista”, o
Presidente – que não é médico – prescreve a medicação que deve ser usada.
A propósito de bem-estar coletivo, remontando a
história ao início dos anos de 1980, a Nação Brasileira, duas vezes por mês,
tinha um encontro marcado com a emoção e a alegria, proporcionada por Ayrton
Sena, seu último ídolo!
Nos dias atuais, a emoção é diária, mas de outra
natureza, pois não tem vitória, tampouco alegria. Muito pelo contrário, a Nação
vive a tristeza pelos milhares de cadáveres enterrados diariamente em covas
coletivas por todo o País, vítimas do coronavírus, bem como pelos solavancos
que abalam a República, resultantes das decisões do Presidente Bolsonaro, que
não obedecem a qualquer regramento jurídico-político, menos, ainda, ao conjunto
de sistemas das Ciências Sociais, que devem orientar os tomadores de decisões,
especialmente quando se trata de um chefe de Estado.
Os brasileiros comuns, e alguns milhões de bolsomínios,
termo cunhado para rotular os apoiadores do Presidente Bolsonaro – defensores
do “mito” da cloroquina – o qual, como um Messias, disse que levaria a Nação à “terra
prometida”, edificada sobre o que chamou de “nova política”, livre da corrupção
e da velha política (representada pelo “centrão”, um consórcio de partidos que
representam as mais repudiadas práticas políticas malsãs brasileiras), hoje são
recepcionados nas amplas salas do Palácio do Planalto, nomeados para altos
cargos do governo.
O Brasil já teve a República das Alagoas, e
agora vive a República da Cloroquina...
COMENTÁRIO
Se sobrevivemos a 15 anos de PT (a Petrobrás quase
não sobreviveu), sobreviveremos também a esse momento de perseguições e
preconceitos (sem que a Petrobrás vá à falência), de uso político de uma
pandemia por pré-candidatos à Presidência da República – e a grande imprensa se importa menos em informar, e mais em
formar opinião, para influir nos destinos da Nação, ao seu bel prazer – ou ao sabor do desespero
das empresas de comunicação desmamadas de polpudas verbas públicas.
Arnaldo Santos é um grande sociólogo e muito hábil analista político, e
portanto sabe exatamente o que está dizendo. Certamente sabe que o Presidente
apenas falou em um fármaco barato, utilizado no Brasil há mais de 80 anos,
vendido nas farmácias sem obrigatoriedade de prescrição médica, que uma
corrente da medicina brasileira abona como possível auxiliar no combate à
Covide-19 – e, como se diz no sertão, “afogado não escolhe barranco”. Bolsonaro
não obrigou médicos a prescrever, e não obrigou ninguém a tomar.
O que Bolsonaro defende é que a Cloroquina, em
coquetel com outros medicamentos, seja utilizada em dose modesta desde os
primeiros sintomas, e até preventivamente, como ele mesmo tem feito, assim como
o Presidente Trump – e como muitas autoridades mundiais e locais fizeram com sucesso, e por
razões políticas não revelam – mas que pessoas muito credenciadas têm dado o
seu testemunho pessoal de uso e êxito.
A soldadesca
do Exército Brasileiro, por exemplo, que presta serviços pelas selvas, toma
meia pílula de Cloroquina todo dia, de forma preventiva à malária, e a nenhum dos soldados ela faz mal. Doentes crônicos de lúpus, ou de doenças reumáticas graves,
fazem uso de cloroquinas durante anos, sem sofrerem nenhuma consequência
negativa.
Mas a Cloroquina é combatida agora porque, em
algum lugar do mundo, tentaram usar uma dose três vezes maior do que o
recomendado, em pacientes graves, o que provocou efeitos adversos, como era
mesmo de se esperar.
Ora, todo remédio – todo ele – tem algum efeito colateral, de maior ou menor gravidade, a depender da dose e da suscetibilidade de quem toma – e eu tenho certeza de que o Arnaldo Santos sabe disso muito bem, de modo que não precisava jogar um caminhão de argumentos científicos sobre uma simples bicicleta, com fatos apodíticos e evidencias claras na garupa.
Ora, todo remédio – todo ele – tem algum efeito colateral, de maior ou menor gravidade, a depender da dose e da suscetibilidade de quem toma – e eu tenho certeza de que o Arnaldo Santos sabe disso muito bem, de modo que não precisava jogar um caminhão de argumentos científicos sobre uma simples bicicleta, com fatos apodíticos e evidencias claras na garupa.
Se formos ler a bula de um analgésico qualquer
ficaremos cabreiros com os efeitos ruins que seu uso já provocou em alguém
alhures, e os laboratórios são obrigados a informar. No caso da Cloroquina, ela
deve ser evitada por doentes cardíacos, porque, no caso deles, a depender da
dose, pode causar arritmia, e por isso mesmo só deve ser administrada por
prescrição e com acompanhamento médico.
Reginaldo Vasconcelos
https://www.youtube.com/watch?v=vo2Ed1PD1uQ&feature=youtu.be
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