segunda-feira, 1 de abril de 2013

NA CEGUEIRA DA JUSTIÇA


TIRO NO PÉ Nº 1

Ninguém, em sã consciência, pode se manifestar contra a inovação legislativa, recentemente promulgada, conferindo amplos direitos trabalhistas aos empregados domésticos brasileiros. Essa é uma merecida conquista de uma classe profissional numerosíssima.

O efeito imediato disso vai ser o advento de uma realidade que já impera na parte rica do Planeta: as pessoas doravante vão ter que lavar suas próprias meias, e preparar suas próprias refeições, como diz que estava habituado a fazer o Papa Francisco, quando cardeal na Argentina, porque a rigor todo mundo pode fazer isso, e pagar alguém para essas tarefas se tornou dispendioso.

Acontece que o outro lado da moeda tem uma efígie tenebrosa: a nova legislação vai fazer encolher drasticamente um mercado de trabalho que acolhia os tantos brasileiros pobres que não dispunham de uma melhor qualificação profissional. Ou seja, pessoas do interior dos estados e das periferias das cidades não vão mais dispor da possibilidade de trabalhar informalmente nas residências, com casa e comida garantidas.

E ninguém imagine que acordo de gaveta e camaradagem patroa-empregada serão jeitinho brasileiro seguro de contornar as novas exigências que a lei estipulou. Em fazendo isso os patrões ficarão nas mãos dos seus serviçais, que a qualquer tempo, e mesmo até dois anos após o fim do vínculo, podem cobrar o novo e o velho na Justiça, com absoluta certeza de ganhar. Não faltará quem os oriente e os instigue a esse desfecho – sejam amigos, sejam sindicatos, sejam intermediários de advogados trabalhistas.


TIRO NO PÉ Nº 2

O juiz titular do 5ª Vara da Infância e Juventude da Comarca de Fortaleza, Manuel Clístenes de Façanha e Gonçalves, observou, em recente programa de TV, que o ECA não prevê maior rigor na detenção de menores reincidentes em homicídios, acrescentado que, pelo contrário, legislação mais recente frisa que a gravidade das condutas infracionais não justificam exacerbação da custódia correcional do Estado, dos seis meses básicos ao máximo de três anos – desde que as instituições atestem o bom comportamento do menor custodiado.

Ora, assim sendo, basta ao jovem depravado que roubou ou matou muitas pessoas, uma vez detido e internado em estabelecimento correcional, mostrar-se disciplinado nos primeiros meses, que logo estará de volta às ruas cometendo os mesmos delitos. Pior que isso, emprestando suas imunidades legais a quadrilhas de maiores, aproveitando assim da impunidade.

Ouvidos pelo juiz, esses menores jamais colaboram, jamais apontam os comparsas, jamais dão detalhes de seus atos, pois sabem que isso em nada alteraria a sua situação jurídica, já que a eles, ao contrário dos adultos, não cabe o benefício da delação premiada.  

O que o magistrado não disse, mas nós acrescentamos, é que, mutatis mutandis, o mesmo acontece com a legislação penal vigente. Bem comportados nos presídios, criminosos monstruosos em pouco tempo conquistam prisão semi-aberta, livramento condicional, saídas temporárias, indultos natalinos, e uma vez livres voltam a atacar a sociedade.   


TIRO NO PÉ 3

O uso de etilômetros, nas blitz de trânsito, assim como a tolerância zero de alcoolemia, não fazem nenhum sentido, principalmente agora que a lei legitimou o uso de provas testemunhais e imagiais contra o eventual guiador embriagado.

Os Detrans andam aplicando sanções administrativas contra os que se negam a soprar o bafômetro, o que é ilegal, pois essa recusa em si não pode ser tomada como infração de trânsito, tampouco se pode presumir alcoolemia, em razão dessa recusa – pois em matéria penal, administrativa ou criminalmente falando, nada pode ser presumido, tudo tem que ser provado.

Os agentes podem parar qualquer um em suas blitz, pelo poder discricionário do ente público, e todo cidadão está obrigado a se deixar fiscalizar. Mas a lei não o obriga a fazer prova contra si, de modo que não soprar o bafômetro é um direito – e ninguém pode ser multado pelo exercício de um direito.

Uma vez multado por se ter recusado a soprar o bafômetro, sem testemunhas e imagens de que estivesse bêbado, aí sim o cidadão pode providenciar prova técnica imediata de que não bebera, agora em sua defesa, e arrolar provas testemunhais de que é abstêmio, para que o agente público autuador explique na Justiça em que embasou a sanção que lhe impôs.

Tanto imputação criminal quanto autuação administrativa requerem pelo menos fundadas suspeitas de que o guiador houvera consumido álcool, preferivelmente as provas de sua embriaguês que são admitidas, de modo que prender ou multar apenas porque o fiscalizado recusou o bafômetro caracteriza abuso de autoridade e excesso de exação, delitos funcionais pelos quais os agentes podem ter que responder.

Assim sendo, de que adiantou o critério da alcoolemia zero, se o agente público não dispõe de meio lícito e compulsório de aferir álcool no sangue do guiador – mas apenas meios de prova de que ele esteja visivelmente embriagado?

Por Reginaldo Vasconcelos

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