O FIM TAMBÉM É PROSAICO...
Geralmente
cultivada com o aumento de fortunas, a soberba faz o homem esquecer a
mortalidade, mas, “desde que o mundo é mundo”, se habituou a ver e ouvir que se
trata de um evento de ordem natural para o qual não há remédio.
A
depender da crença e da filosofia, por que é tão
temível? Aos desafortunados viventes sobram consternação e apuro ante as
despesas funerárias. Todavia, a regra não se
aplica a todos; outros a fazem de degrau para contentar a vaidade, numa
demonstração de luxúria e ostentação.
Talvez,
nessas horas, do outro lado, o falecido acorde do sono profundo, zombeteie e ria do
teatro, das futuras “brigas de foice” entre
herdeiros, até da alegria do suplente político que ocupará a sua vaga.
A despeito
disso, o assunto teve conotação lúdica em um recurso extraordinário interposto
pela Prefeitura Municipal de Pirassununga, em ação que respondia por haver
removido uma placa mortuária a teor do epitáfio:
“Bípede, meu irmão, eis o fim prosaico de um
espermatozoide que, há mais de 80 anos, penetrou num óvulo, iniciou seu ciclo
evolutivo e acabou virando carniça. Estou enterrado aqui. Sou o Chico
Sombração, xingai por mim. Francisco Franco de Souza”, o qual faleceu em
1968.
O de cujus,
enterrado no cemitério local, era um personagem irônico, boêmio, com acurado
senso de humor. A vontade de Chico Sombração não pôde ser respeitada, uma vez
que a inscrição tumular foi considerada incompatível com os “princípios gerais
e éticos”.
Assim, a
retirada da lápide, por conter manifestação irreverente, mas verdadeira,
reconheceu o poder de polícia da municipalidade. O que então era do domínio
privado da cidade, ex vi da decisão do STF, ganhou foros de notoriedade
e mais publicidade com o registro nos anais de sua jurisprudência.
Contudo, o
Sombração alcançou o seu objetivo a respeito da verdade biológica: todos
nascem, mas todos morrem; zombou ainda dos egoístas miseráveis que, reduzidos a
nada, não têm o direito de saber o destino de seus bens post mortem.
Tudo finda
debaixo do Sol. O retorno ao pó da terra não tem exceção. Apenas o amor resiste
à morte e, se cumprida a missão, haverá o merecido descanso. Como nos ensina o
convertido apóstolo Paulo: “Ainda que eu
falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse Amor, seria
como o metal que soa ou como o sino que tine”.
A saga humana,
independente da condição social, termina na sombria e silenciosa campa ou em um
forno crematório.
Por Paulo Maria de Aragão
Advogado e professor
Membro do Conselho Estadual da OAB-CE.
Titular da Cadeira de nº 37 da ACLJ
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