AGONIA EM
RITO DE PASSAGEM
Barros Alves*
O tempo dos homens (kronos)
não é o tempo de Deus (kairós). O
tempo de Deus está no plano do perene, da eternidade. Não há lugar para
cansaços e desesperos nessa intemporalidade. Bem ao contrário é o tempo que
nós, os mortais, medimos com o sentido do efêmero, da finitude.
Daí a melancolia que parece invadir o nosso mundo em ritos de
passagem como é o caso da passagem de um ano para o outro. É como se amanhã
fosse outro dia. Sem choro, sem lamentações, sem as esquivanças que nos são
impostas pelos desequilíbrios cotidianos. Ano novo, vida nova! Tudo regado a
boas esperanças.
Na verdade, o tempo não para e a mudança de um ano para outro é
apenas uma formalidade com página virada no calendário. O ano que mudamos aqui
não muda ao mesmo tempo em países do Oriente. Os calendários ortodoxos,
chineses, dos judeus e muçulmanos marcam fim de ano em datas diferentes da
nossa. Nós, cristocêntricos, não perdemos a mania de focarmos somente em nosso
umbigo. É como se o mundo girasse em torno do Ocidente Cristão. Mas, como dizia
o filósofo francês Roger Garaudy, o Ocidente é apenas um acidente na história
humana.
Nenhum problema que marquemos nosso tempo em antes e depois de Cristo. Ele é o
nosso mestre e guia, Ele ilumina nossa caminhada na história, Ele é o suor e o
sangue daquilo que se convencionou chamar Cristandade, mas que parece
agonizante por estes tempos aziagos. Pode não ser coisa nova. O pensador
espanhol Miguel de Unamuno, na primeira metade do século passado, já falava
numa “agonia do Cristianismo”.
Essa agonia, que indica um abandono do sangue de Cristo que promete
a todos deixar alvo como a neve, sentimo-la por esses dias de neopaganismo e de
exercício pleno de hipocrisia em face desse Cristo, cujos ensinamentos são
repetidos aos gritos em cada esquina, mas pouquíssimas vezes levados a termo na
prática cotidiana. Basta vermos o comportamento das pessoas nesses tempos em
que mais se fala nEle. A festa da natividade do Menino se transformou em
momentos orgíacos de glutonarias e bebedices, desde o casebre ao palácio.
E muito mais se alarga e amplia no tempo em que um ano morre e
nasce o outro. Esse rito de passagem não aponta para um renascimento de valores
éticos e morais da sociedade ocidental e cristã. Aponta para um corpo social
que agoniza. Mas, há uma luz no fim do túnel. É a certeza de que a esperança
não morre.
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