quinta-feira, 2 de março de 2023

CRÔNICA - Fazendo a Diferença (WI)

 Fazendo a diferença
Wilson Ibiapina*

 

No vídeo que meu filho Fábio editou sobre os meus 80 anos de idade, familiares e amigos deixaram seus depoimentos sobre minha trajetória profissional. Como a redação da Globo em Brasília está informatizada, repleta de computadores que substituem as máquinas de escrever, Olavo Denecial preferiu gravar sua fala no arquivo, onde sabia encontrar as matérias do meu tempo de trabalho na emissora. 

E lembrou um episódio que aconteceu na cobertura da primeira visita do Papa Joao Paulo II ao Brasil, em 1980. Na ocasião, fui escalado pela Alice Maria, diretora da Central Globo de Jornalismo, para chefiar uma das duas equipes formadas para acompanhar Sua Santidade pelo País. A outra equipe ficou sob o comando do Tomzé, de Belo Horizonte. 

Depois de receber o Papa em Brasília seguimos para o Rio. Os repórteres Ricardo Pereira e Pedro Rogério, e o cinegrafista Ricardo Straus. Na sede da Globo, toda a estrutura do telejornalismo estava trabalhando na cobertura, e fiquei meio deslocado. Foi quando descobri que uma equipe da RAI, televisão italiana, acompanhava o Papa de perto, colada nele. 

Peguei uma das fitas de vídeo gravadas pelos  italianos, entrei numa ilha de edição e comecei a assistir a visita à favela do Vidigal. Com um forte esquema de segurança, o Papa subiu o morro acenando e cumprimentando as pessoas. 

Depois de ouvir o coral de crianças da favela e abençoar a população, presenteou a comunidade com seu anel episcopal. A TV italiana mostrou o Papa tirando o anel do dedo  e entregando a uma garota. Editei a cena, que passou a ser um dos momentos mais emocionantes da cobertura global. Nas demais visitas que acompanhamos, a Porto Alegre, Salvador, Belém e Manaus, não tirei os olhos das imagens gravadas pela RAI. E isso salvou nossa cobertura em Salvador.

Em seu oitavo dia no Brasil, o João Paulo II foi visitar a favela de Alagados. Quando nossa equipe chegou, toda a área já estava ocupada por uma  multidão, e cercada pela polícia. Foi quando o cinegrafista Ricardo Straus começou a filmar uma menina que tentava enfrentar a multidão para chegar ao Papa. Ricardo virou a câmara e mostrou um repórter de uma rádio baiana, com um microfone cara de gato, enrolado numa flanela amarela, fazendo um apelo:  “Por favor, deixem a menina passar. Ela só quer entregar um presente ao Papa”. 

Até que a garota furou o cerco e mergulhou na multidão.  Na redação, de posse da fita da TV italiana, vi a menina saindo da multidão e correndo para entregar um embrulho ao Papa. O Pontífice abriu e viu que o presente era uma jangadinha, que ele exibiu ao público,  que aplaudiu. 

No avião, o comandante anunciou que o diretor da Globo estava parabenizando a equipe pelo êxito na cobertura em Salvador, sem saber que naquela manhã dormimos demais e chegamos à favela depois do Papa, quando tudo já estava fechado de gente. E eu até pensei: “Deus está nos ajudando”.


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