ATÉ AS PEDRAS SABEM
Reginaldo Vasconcelos*
Até as pedras sabem – embora alguns neguem, e outros prefiram não saber – que houve um concentrado esforço nacional para defenestrar do poder um incômodo Presidente da República – e não exatamente para eleger o ex-presidente, que fora condenado a doze anos e já cumprira 20 meses de cadeia, cuja rota bandeira populista foi lavada, enxaguada e hasteada apenas para que se cumprisse aquele desiderato principal, única possibilidade, sem nenhuma alternativa.
O presidente derrotado é um ex-militar de baixa patente e foi deputado do baixo clero do Congresso Nacional por muitos anos, cuja única plataforma para suas eleições ao Parlamento era o discurso renitente de combate ao status quo da política brasileira. Ele fez campanha à Presidência da República pelas redes sociais da Internet, surpreendendo o stablishment com a sua vitória, improvável e inesperada.
A partir de uma postura disruptiva, prometera e tentou moralizar a vida pública nacional, sem habilidade política para tanto, conquistando por isso o epíteto de “Mito”. Cercado de seguidores, foi afastando violentamente os que fugissem ao seu padrão, produzindo inimizades. Montou um Ministério de notáveis, cujus integrantes substituía bruscamente a qualquer antipatia ou sinal de incompetência, engrossando as fileiras de antagonistas virulentos.
Como um cavalo xucro, foi saltando com ímpeto os obstáculos do destino – punhalada, pandemia, seca, guerra fria, conflito mundial, CPI do Circo – para assim mesmo entregar ao País números melhores, com inflação baixa e alta no produto interno bruto, crescimento do emprego e criminalidade reduzida, enquanto no resto do mundo a economia agonizava e as nações rolavam pelo chão convulsionadas por ideologias paranoicas.
Tosco, falastrão, ingênuo, ferino, foi atacado por toda a caterva nacional, acreditando que a verdade bíblica nua e crua o salvaria do calvário. Imaginou-se um Jorge da Capadócia vencendo o dragão de sobre o ginete, para terminar como um Sebastião de Narbona, amarrado e flechado pela imprensa nacional, que ele não soube acalentar, e por toda sorte de ímpios e pérfidos a que deixou aberto o flanco.
Agora, curada a doença, o remédio começa a se revelar muito mais tóxico que o esperado, um grande Exército de Brancaleone no poder a simular uma loja de louças a que um pequeno símio desastrado tenha acesso – os mesmos erros do passado repetidos, para produzir alta de impostos, ameaça de inflação, invasões de terras, criminalidade crescente – um filme-pesadelo a que o País já assistiu e não esperava uma reprise.
Enfim, todo o estamento que venceu e alcançou o objetivo descobre que teve, ao fim e ao cabo, uma vitória de Pirro. Uma tentativa de controle biológico em que o combatente da praga se descontrole e se torne mais nocivo do que ela. Como alguém que adquirisse gatos para eliminar os ratos do porão, mas estes, cumprida a missão, passassem a trucidar os peixinhos coloridos do aquário e os maviosos passarinhos do quintal.
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