A FÓRMULA DA TRAGÉDIA
Como costuma acontecer,
a mídia nacional ficará preenchendo as pautas da semana com a frenética e maçante
cobertura do incêndio ocorrido na boate Kiss, na cidade de Santa Maria, no Rio
Grande de Sul, na madrugada de domingo, 27.
Todas as emissoras de
TV repetem os mesmos dados da tragédia, cada uma lutando em vão por uma imagem
nova e um relato mais pungente.
Um repórter na frente
do prédio sinistrado, outro no ginásio onde transcorre o velório coletivo, as
mais das vezes sem ter a mínima novidade a oferecer.
O tema é como um bago
exaurido de laranja, que cada um tenta espremer para colher mais alguma mínima
gota de notícia.
Ninguém se conforma
com o fato de que a notícia está completa: um ambiente onde ocorria um show
pegou fogo e vitimou em torno de quinhentas pessoas, jovens universitários em
sua grande maioria, duzentas e cinquenta delas mortas por pisoteio e por
inalação de fumo tóxico.
Divulgar isso seria o
suficiente para que o mundo conhecesse a nossa dor nacional. É o necessário
para que o País lamente e chore, solidário à dor das famílias enlutadas,
elevando preces em sufrágio dos mortos e pela saúde dos feridos.
Foi o que bastou para que
a Presidente Dilma Rousseff, triste, embargasse a voz ao microfone de uma cúpula internacional
e abandonasse a missão no exterior para comparecer ao sítio trágico.
O segundo movimento da
imprensa é procurar os culpados, a fim de demonizar alguém pelo ocorrido, como
se as tragédias pudessem ser revertidas pela via da vingança.
O fato funesto aconteceu, e tudo que há para ser feito de proativo agora é socorrer todos os feridos, sepultar todos os mortos, amparar as famílias, e, após o exame das causas, aperfeiçoar as
normas para prevenir novos infaustos.
Sim, há uma cadeia de responsabilidades a ser apurada, mas esse é um detalhe técnico que, a meu sentir, não interessa tanto ao grande público – até porque nada foi intencional, de modo que todos os culpados também são vítimas do destino.
Sim, há uma cadeia de responsabilidades a ser apurada, mas esse é um detalhe técnico que, a meu sentir, não interessa tanto ao grande público – até porque nada foi intencional, de modo que todos os culpados também são vítimas do destino.
Para sermos bem rigorosos,
precisamos considerar que, neste caso, a
culpa é tão difusa que já começa pelo viés vitimológico. Pessoas sensatas não se
integram a uma multidão de milhar, em ambiente fechado, pois é obvio que essa é
a fórmula perfeita para se envolver numa hecatombe. Desatinos da juventude!
Em segundo lugar, tem
parte maior da culpa a produção do grupo musical, que não atinou para o risco
de usar fogo de artifício em área coberta, quando se sabe que a pirotecnia em
geral é perigosíssima, e que seu uso sempre impõe parecer e assistência de profissionais
especialistas.
Tailândia, 2009 |
Mas se queremos mesmo
esquartejar um Tiradentes, vamos enforcar o Poder Público. Como a Prefeitura de
Santa Maria aprovou uma obra arquitetônica, para aquele específico uso, sem que
o projeto estivesse adequado aos padrões de segurança? Como o Corpo de
Bombeiros gaúcho autorizou o funcionamento da boate, sem que ela estivesse dotada
de todo o equipamento preventivo necessário? Por que cargas d´água não se fiscaliza, com
rigor e regularidade, o funcionamento das casas de shows e das boates?
Malgrado, importante ter presente, como lenitivo emocional, que a causa mortis geral foi a intoxicação, pela inalação da fumaça, que logo provoca inconsciência, de modo que, pelo menos, a moçada inditosa não teve a tortura do fogo, que é dos mais cruéis algozes.
Malgrado, importante ter presente, como lenitivo emocional, que a causa mortis geral foi a intoxicação, pela inalação da fumaça, que logo provoca inconsciência, de modo que, pelo menos, a moçada inditosa não teve a tortura do fogo, que é dos mais cruéis algozes.
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