LUZ
Totonho
Laprovitera*
“A luz é especialmente apreciada após a escuridão.”
(Textos Judaicos)
Na vida, o tempo nos mostra diversas vezes o que
não alcançamos em determinados momentos. Curiosamente, ao inteirar meus 60 anos,
de uma hora para outra, deu-se um estalo na minha cabeça, em reflexões a
respeito da leitura da história de minha existência.
Quando há pouco o número do meu telefone era
um milhar, lembro da vovó Marianna – muito apegada a mim – diversas vezes,
tomando-me o rosto inquieto e, para ler as minhas feições com o quase nada de
sua vista e as mãos trêmulas
e curtidas de tantas fornadas de saborosos manjares que preparava. Eu, inquieto
adolescente, ficava impaciente com aquela vontade dela. Na pressa do nada, eu
não alcançava a importância da percepção da minha avó em busca de olhar meu
rosto.
De uns tempos para cá, dos olhos venho
sofrendo mal impiedoso, silencioso e traiçoeiro. Então, valho-me dos
saberes dos doutores e da fé em Santa Luzia – incluindo as orações da querida
amiga e colega arquiteta Thelma. Daí, eu
passei a entender mais do que nunca o valor de ver e enxergar o que nos é mais
precioso.
Aí, quando dou fé, leio Clarice mostrar-se: “Minha
alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita,
prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade.
Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se
chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros”. Bonito e verdadeiro,
né?
Como é bom ver! Eu procuro ver tudo e de
todos os jeitos. Até no escuro. Sim, já experimentei desenhar no escuro e
não me acanho em dizer: foi uma experiência artística das mais intensas. A
escuridão nos remete a múltiplos universos. Será por isso que quando se
beija, a gente fecha os olhos?
Bem, quando menino velho, para mim, “Fiat Lux” era apenas uma marca de fósforos de segurança, bastante famosa e de inesquecíveis propagandas, que passavam na televisão e no cinema – quem não se lembra da marcha dos fósforos, em desenho animado? Mas, graças a Deus, não custou muito para eu aprender que se tratava de uma expressão bíblica, em latim, contida no texto do Génesis, em que Deus pronunciou “faça-se a luz”, e a luz se fez.
Pois é, alencarinos e nova-iorquinos, seja noite, seja night, ser de luz, ser de light, ser em toda parte, mas no mundo o bom mesmo é viver com arte! No mais, que venha ao caso, por acaso, à espera do ocaso, até chegar à noite para o dia começar, prestemos bem atenção, em céu de lua clara é difícil chover, e jamais esqueçamos que o bom da vida é o dom da vida.