Na reunião virtual da ACLJ desta segunda-feira os participantes conversaram sobre a realização da versão definitiva da letra do Cântico Acelejano, música composta para a ACLJ pelo grande e saudoso Evaldo Gouveia, Membro Fundador Benemérito da entidade, para ser a "Canção da Academia", com letra do acadêmico Reginaldo Vasconcelos, em parceria com os maestros Potyguar Fontenele e César Barreto, aquele ainda o seu arranjador, e este também o seu interprete. Ouça abaixo.
A Canção da Academia vem compor a identidade musical da ACLJ, ao lado do hino da instituição, a "Ode Alencarina", música do artista plástico e sônico Descartes Gadelha e da musicista Inês Mapurunga, ambos da ACLJ, com letra de Reginaldo Vasconcelos e Paulo Ximenes – originalmente em ritmo de maracatu, tendo recebido arranjo e partitura marciais elaborados pelo Tenente Henrique Lopes, antigo regente da Banda de Música da 10ª Região Militar – a Região Soares Moreno.
Wilson Ibiapina trouxe à baila a importância de bem se falar a nossa língua portuguesa, tão massacrada hoje pelos novos integrantes da imprensa profissional, em face da má formação, do baixo nível do ensino no Brasil, a começar pelo primário – dito hoje "básico". A propósito disso, Ibiapina exibiu um obra que ele reputa bem escrita e interessante, "Antologia Nossos Escritores", uma coletânea de crônicas, poesias e contos de ótima qualidade. A editora é a Scortecci, de São Paulo.
Na sequência houve uma longa sessão de saudosismo em relação a Fortaleza, puxada principalmente pelos acadêmicos que residem fora do Ceará. Stênio Pimentel puxou o assunto perguntando ao Paulo Ximenes, nascido e criado na Aldeota, se ele já havia bebida água da "Pirocaia", provocando estranheza e vigorosa negativa do confrade perquirido, que fez interpretação maliciosa da palavra. Sua reação provocou uma gargalhada no Presidente Reginaldo, que conhecia bem a palavra e a sua relação com a História da Cidade.
Paulo Ximenes nunca ouvira falar no poço de água pura que dessedentava Fortaleza no início do Século XX. Aliás, segundo o sitio virtual Projeto Batente, dos arquitetos Aryane Lima, Ricardo Lionn e Jade Maranhão, o livro de um parente do Paulo, Raimundo Ximenes, explica a respeito, que "Antes de possuir o seu nome atual, o bairro do Montese era chamado de Pirocaia, que, provavelmente, fazia referência a alguma tribo indígena que morava nas terras que hoje se encontram dentro da mesma delimitação". Era o ponto primitivo de extração e venda da água potável, depois reproduzido em outros locais próximos, das Damas à Gentilândia.
Bem, "piroca", palavra que no jargão chulo do Brasil alude ao pênis, em tupi, corresponde ao verbo "esfolar", em português, e talvez haja relação com o fato de que o velho bairro era perpassado pela "Estrada do Gado", pela qual as boiadas vinham do interior para o Matadouro Público de Fortaleza, que se localizava ali, onde eram mortas e esfoladas.
O Presidente Reginaldo lembrou de quando a Cidade não tinha supermercados, nem granjas de criação intensiva de porcos e galinhas, de modo que as carnes eram adquiridas dos açougues de bairro, com sua característica bandeira vermelha à porta, ou por vendilhões que corriam o meio urbano com peixes e aves pendentes de cambões, frutas em caçuás de jumentos, miúdos bovinos em caixões sobre cavalos, reminiscências compartilhadas por todos. Até os pães da manhã eram adquiridos na porta de casa, trazidos por vendedores a cavalo, lembrou o Adriano.
Na fase das performances literárias Pedro Araújo lembrou uma frase do escritor alemão Johann Wolfgang Goethe (1749-1832), "todos os dias devíamos ouvir um pouco de música, ler uma boa poesia, ver um quadro bonito, se possível, dizer algumas palavras sensastas". Na mesma linha, Ipiapina registrou uma frase de Georges Bernanos (188-1948), escritor e jornalista francês, grande crítico da burguesia de sua época: "O pobre prefere um copo de vinho a um pão, porque o estômago da miséria necessita mais de ilusões que de alimentos".
Aluísio Gurgel, por fim, leu uma crônica sua inédita, "A Porta", abaixo reproduzida.
A PORTA
Era um policial militar bastante
comunicativo. Veio prestar depoimento em um processo criminal. Encerrada a
audiência de instrução não me contive e lhe perguntei qual foi o caso mais
estranho em que já havia atuado. O caso mais estranho…, pensou em voz alta.
Sim, acrescentei, não necessariamente ligado à violência. Uma ocorrência
estranha na sua vida de policial.
Houve uma vez o
chamado de uma senhora idosa que estava com problema. Éramos em três e eu
estava no comando. Estacionamos bem defronte da porta dela e fomos gentilmente
atendidos. Ela, visivelmente nervosa, relatou que estava no quarto fazendo
tricô, quando sentiu uma ventania esquisita e logo depois ouviu a porta do
banheiro bater com força.
Minha senhora, não
há nada demais em uma porta de banheiro bater. Mas seu guarda, eu fui conferir.
Tentei abri-la e ela não abre, por isto chamei vocês. Venham, venham ver. Nos
levou de imediato ao local, no fim do corredor e apontou para a porta: — É aí.
A senhora mora com alguém? Não senhor, somos eu e Deus! Agarrei o trinco com
decisão e forcei uma, duas, três vezes e nada.
Do banheiro vinha o
mais absoluto silêncio. Nos olhávamos desconfiados e, para piorar, a senhora
nos disse que não havia tranca pelo lado de dentro. Como é, minha senhora? Sim,
seu guarda, a única tranca da porta é esta aqui pelo lado de fora. Cansei de
pedir ao carpinteiro para vir colocar a tranca pelo lado de dentro, mas ele
sempre me dá uma desculpa e não vem. Cansei!
Pois então me mostre
onde fica a janela do banheiro. Não há janela no banheiro, seu guarda. Veja,
doutor. A estas alturas eu realmente precisava organizar direito as ideias pois
a situação de fato era muito estranha. Será coisa do outro mundo, seu guarda?
Ou será um ladrão? Sinceramente não sei, minha senhora. Mas seja o que for, se
senhora autorizar eu arrombo a porta para verificar.
Com a autorização
dela, determinei aos meus comandados que empunhassem os respectivos revólveres
(naquela época ainda não usávamos pistolas) e gritei a plenos pulmões: — Seja
quem for, se prepare pois eu vou entrar na marra! Ato continuo, tomei
distância, fiz carreira e entrei energicamente com o coturno pelo meio da
porta. Foi uma pancada feia.
Após o arrombamento,
ficou apurado que a ventania bateu a porta e que uma vassoura se deslocou,
travando-a por dentro.
Aluísio Gurgel
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