domingo, 31 de agosto de 2025

REFLEXÃO - A Sublime Fase das Memórias (PN)

  A SUBLIME FASE
DAS MEMÓRIAS
Pierre Nadie*

 

Pare de reclamar se seu pai, mãe ou parente idoso lhe contam a mesma história várias vezes. Ao envelhecermos, o círculo de amigos vai diminuindo, em geral pelos coevos que se vão, e a extensão de relacionamentos se estreita. Alguns ainda remanescentes permanecem fiéis à amizade sincera d’outrora. Uns poucos podem também surgir nas encruzilhadas sociais.

Mas, são diminutos e, nem sempre, como dantes. Aqui entra um entrevero da solidão depressiva – estar solitário não sinonimia solidão – mas isto é para um outro capítulo. 

Pois bem, em toda a travessia, fomos escrevendo a nossa história, ora com alegria, ora com percalços ilusórios, ora com lágrimas de amor, de raiva e de dor inglória, ora com o fervor da fé, ora com a dúvida da esperança, que o viver, muitas vezes, nos lança. 

Saudades foram ingressando em nossas mentes e tomando assento em nossos corações, umas mais cativas que outras, umas no óleo do amor e da amizade, outras no azedume do ódio. 

Daí que, divisando bem menos horizontes, revisitamos os passos que galgamos e debruçamo-nos em nossa história amarelada pelos pingos do tempo, mas não destruída. 

Relembrá-la é ter sentimentos plenos de emoções. É rever amigos, reviver amores, chorar mágoas e lamentar dores, rir, rir sozinhos como loucos alucinados, mas degustando cenas gravadas nas longas estradas e, num átimo de tempo, vívidas, fresquinhas, como se as estivéssemos vivendo novamente.males que sofremos e os estragos que fizemos, se nunca foram resolvidos, abalroam-nos e vão nos matando por dentro, quais vírus de tamanha virulência. Pois, conviver consigo mesmo talvez não fora tão importante, não se constituíra prioridade de vida. 

Resgatamos dias de sol e escuridão de noites, palmilhamos percursos que gastaram nossos sapatos, adentramos trilhas que serpejaram certos momentos, sentimos o medo das encruzilhadas que arrostamos, ouvimos o troar das sandálias, somos tomados de suores frios, relembrando os becos que rasgaram nossas estradas. Aspiramos o ar saudável das margens verdejantes e floridas e o olor ozonizado das chuvas caídas, que fertilizavam roçados, várzeas e vazantes e rejubilavam vidas. 

Ouvimos o sussurrar de animais, o gorjeio de pássaros, admiramos a beleza das plumas coloridas de tantas aves, apreciamos o adejar de colibris e outros passarinhos. 

Memórias comprimidas, desfalecidas, que se erguem e tecem a nossa história.  Pare de reclamar se seu pai, mãe ou parente idoso lhe contam a mesma história várias vezes. Eles necessitam reviver sua história. Seu passado é o presente que lhe traz os amigos. E o presente não estoura o passado, mantém-no sempre presente, como uma eterna festa de congraçamento ou brinde de ano novo. 

Todavia, se os momentos reverenciados forem de dores, mágoas, remorsos e sofrimentos – história triste e cruel que construíram – os desequilíbrios, que sua lembrança gera, são algozes indomáveis que precisam, diuturnamente, de cuidados médicos e psiquiátricos. 

O envelhecer não muda, segue a vida, para uns, com mais maturidade, para outros, com as incongruências do verdor dos anos... Cenário de consequências irreversíveis.




ARTIGO - Cintilantes Estalactites e Estalagmites (VM)

CINTILANTES
ESTALACTITES E ESTALAGMITES
EDITORIAIS
DE GERALDO JESUINO
Vianney Mesquita*

 

Quando uma leitura eleva o espírito e inspira sentimentos nobres e corajosos, não há necessidade de outras regras para julgar o trabalho: é bom e feito por mão de mestre.

 JEAN DE LA BRUYÈRE
Moralista, filósofo e escritor satírico.
Paris, 16.08.1645; Versalhes, 10.05.1696.



Deleite imenso a mim remansou ao dar de rosto com a mais recente produção do professor da Universidade Federal do Ceará e artista plástico, acadêmico Geraldo Jesuino da Costa, conhecido e apreciado narrador de contos e outros substratos do engenho escritural, no âmbito do Estado e em ultrapasse ao contorno brasileiro.  Procedo agora a tênues comentários, jamais (*) a respeito do produtor do bem escoliado, sem, todavia, me aprofundar no cotejamento da sua obra no momento sob curta glosa, Estilhaços (Fortaleza: Imprece, 2025), porquanto somente a vi a socapa, com míngua de tempo para compartilhá-la. 

Dês que granjeei o inaugural convívio arcádico com o hoje escritor G. J. C., na Universidade Federal do Ceará, nos idos bem apartados de 1971, conservo-me entusiasta do seu modo característico de exprimir intenções literárias, plenamente distintas de outros produtores do nosso Estado, nomeadamente no que concerne à laboriosa e intricada convivência com a bitola do conto. 

Expressa singularidade (não é supérfluo acrescer) já remansa adicionada aos demais pressupostos registados no seu precioso portfólio – de docente do ensino superior, operador esteta disposto em insuperável plano, pai de família, amigo-irmão, pescador, narrador de chistosas estórias (inclusivamente as dos açudes), entornador de fluidos espirituosos em conluio com os aliados - bem assim de todas as coisas de supina qualidade, suscetíveis de ser fração dos créditos de um ser distinto, transposto ao estrado mais ordinário em curso na existência humana. 

Persevero, pois, na circunstância de admirante de seu estro singular, e tão erguido sob o espectro opinativo de terceiros, peculiarmente no patamar das miúdas narrações de Domingos Fernandes Trancoso (lembrei-me das “estórias de Trancoso”) e João Batista da Silva Leitão de Almeida Garret, isto desde a fileira de analistas exigentes e verdadeiros – como soem ser aqueles a judiciar os bens escriturais da notabilidade coestaduana sob escólio. Entrementes, os que não alcançam os desideratos do autor em alusão perfilham-se estrangeiros à possibilidade de estabelecer mensurações críticas a de tal modo exaltados bens artificiosos, retendo-se reservados e té calados, aliás, em proveito de consulentes a mancheias, nomeadamente os fregueses obstinados do inventor de Como Abraços (Fortaleza: Imprece, 2014). 

Sob o prisma do juízo analítico – isto admito em condição confessa – estaciono no intermeio dos mencionados expendedores de seus bens, vazados no espinhoso expediente das narrações ligeiras e concisas da verde agricultura de Moreira Campos, Alexandre Herculano e Branquinho da Fonseca, onde – seja exprimido – ele se inserta, sem, de sorte alguma, perigar assumir a lanterna de tão bem animoso campeonato das letras, pois constantemente postado nas primeiras posições (para mim, sem exagero, na primeira) sem qualquer pavor do mata-mata. 

Por expresso pretexto, em tempo algum, me afiz a elaborar esse estalão de escrita, o recurso dos short stories de Shakespeare e Dickens, bem como das nouvelles de Flaubert, Balzac e Anatole France, visto que, muita vez – toda vez, aliás – me descobria parecido com os contistas lidos, imitados e pastichados, é bem verdade, daí por que não chegava à editação da peça. Nunca publiquei uma, sequer, sob os regramentos de tal custosa craveira redacional...! 

Não me haverei de esquecer, evidentemente, do fato de que, na primeira ocasião, quem me fez imergir no Jordão literário nacional foi o preclaro contista brasileiro alvo deste comento, o batista de Sobre Livros - Aspectos da Editoração Acadêmica (Brasília, PROED; Fortaleza: Edições UFC, 1984), minha invenção librária estreante e, sem dúvida, carregada de defeituações. Dela, G.J. elaborou o Prefácio e o invólucro tipográfico, ocorrência a me larguear em honras e encher de ufania até os dias fluentes. E, então, prosseguiu ele, aparelhando volumes, escrevendo notações preliminares, quartas capas, orelhas, verba foramen, continentes estéticos insuperáveis e outros aprestos editoriais da minha colheita, e sempre preferido, também, mercê de seus misteres funcionais, pelo ror de cultores editoriais de Fortaleza e de tantos outros recantos, os quais, ainda hoje por ele demandam, com vistas a que proceda a esta conjunção de labores de alteado valor cultural. 

Relativamente a Estilhaços, não me impende, porém, neste passo, maiormente pelo pretexto referido em lance precedente (a falta de vista mais demorada ao mencionado proveito textual), assentar-lhe juízos tacháveis, secundado pelo deciso de não surripiar o hors d’ouvre dos lentes gejotianos antes do repasto principal conformado nos onze pedaços dos luzidios estalagmites e estalactites de chão, teto e parede dessa soberba gruta editorial. Muito particularmente – expresso tal sob letras maiúsculas – em relação à estampa ostentosa e literariamente dignificante de SUMILIANO, deixo o leitor deparar, sem dele fazer qualquer manchete! 

Demais disso, seria sobejante e delituoso eu esfregar a grosa nos estilhaços amoladíssimos de G.J., após a aplicação, à guisa de polimento para o leitor, de duas afiadíssimas e elucidantes Limas: Professor Fernando Lima, na primeira aba, e Mestra Hermínia Lima, nas initial verba que enroupam o volume. 

A modo de fecho, insisto, ainda, numa eterna ideação atinente ao jeito de tornear do nosso engenhoso literato, exprimida nalguns conceitos expendidos em discursos distintos e conjunturas diversas. Os bens amanhados por Geraldo Jesuino cursam opósitos às singelezas próprias dos estilos triviais, fogem do insosso, desprezam o irrelevante e correm léguas para se livrar do fútil,  ao conferir valia à aplicação, faustosamente diversificada, de todas as classes de palavras, jamais (*) dos verbos, com as multíplices e alternadas interpretações, desde os substantivos e adjetivos às interjeições, e em suas significações multifárias baixo a aquiescência de uma conjunção linguageira polissêmica e sincrítica, atuante no âmbito do código glossológico português.

 (**) Talvez seja necessário chamar atenção para o fato, certamente não consabido, de que a dicção jamais, duas vezes mencionada neste texto, conforma igual noção dos advérbios. Principalmente, maiormente, mormente, particularmente etc. 

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

ARTIGO - A Inexcedível Palestra do Prof. Raul Beco (VM)

 Inexcedível Palestra
do Prof. Raul Beco
 na Hora do Vernáculo – ACLP
(Vianney Mesquita)


Prof. Raul C. B. Beco


 Belo é modelar uma estátua e conceder-lhe vida. Sublime, entretanto, é delinear uma inteligência e admitir-lhe verdade. (VICTOR HUGO).

 

  

Em tempo nenhum havia divisado um lente tão loquaz – eloquente, no melhor senso conotativo que este vocábulo seja propício a receber – como o Prof. Raul Castro Brasil Beco, com o qual provamos estar ontem, na seção Hora do Vernáculo, durante a sessão de agosto-2025 (25.8), da Academia Cearense da Língua Portuguesa.      

Experimentamos o contentamento de acolher informações e opiniões consentâneas deste absolutamente soberano protótipo dos conhecimentos repartidos, assente em literatura da melhor felpa e em experiências pessoais de monta. Para quem o não via – somente escutava – pareceria, decerto, um professor de oitent’anos ou mais lendo um texto, a despeito de sua juventude, haja vista a elocução elevada e clara e subida, mas lógica e fácil de decodificar, fato demonstrativo de uma pessoa alumiada pela Providência prontificada a deitar tanta cátedra! 

Releva evidenciar a solidez do seu discurso, a certeza de suas doutrinações na ambiência esquisita das falsas etimologias do Código Lusitânico, no decurso do qual sequer repetiu termos ou dicções, e, nem ao menos, tergiversou em opiniões, tampouco resvalou nos entendimentos manifestos. 

Eis aqui, pois, o testemunho da exatidão! Era, então, como se estivesse lendo, diretamente, um texto, até preparado por outra pessoa, sem escorregar nas moções particulares expressas, e denotando intensivo conhecimento da matéria, pouco comum e de muita acreditação, malgrado sua dobrez e falsidade, por parte da maioria daqueles que se jungem ao estudo da Língua Portuguesa.

Configura, sem dúvida, o Prof. Raul Castro Brasil Beco um estalão de cânone da palavra encarcerada ao seu saber, tendo eu sobrado sob comoção, enquanto a plateia inteira remansou absorta com suas doutrinações mais do que regenciais. 

Tantam bonam invidiae mecum servo! 

Isto mesmo: Guardo no recôndido tão boa inveja!



domingo, 17 de agosto de 2025

NOTAS SOCIAIS DA ACLJ

WILMA RECEBE
LÚCIO
PELO ANIVERSÁRIO
DA SUA COLUNA SOCIAL 

Wilma Patrício, grande dama da sociedade cearense, ofereceu um almoço comemorativo, em homenagem ao jornalista veterano Lúcio Brasileiro, seu amigo de longa data, o qual, exatamente naquele último 13 de agosto, completava 70 anos de presença ininterrupta na imprensa, um recorde mundial. 


A ACLJ esteve representada nessa recepção em homenagem ao seu comendatário, Lúcio Brasileiro, no belo apartamento da anfitriã, na Praia de Iracema, pelo Presidente Reginaldo Vasconcelos e pelos Beneméritos Beto Studart e Graça Dias Branco.

O homenageado brindou os convidados com uma peça musical do seu repertório, coroando o encontro com mais esse talento diletante, enquanto o advogado Adriano Josino exibia o exemplar da autobiografia do Presidente Reginaldo, que lhe fora dedicado e autografado.

Lúcio, sempre muito lúcido e espirituoso, contava de alguém que apelidara carinhosamente a sua tradicional coluna de jornal com uma corruptela, “calúnia”, em referência jocosa às revelações picantes ou críticas que ela traz sobre sucessivas gerações da sociedade cearense. 

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DIAS
PARADISÍACOS
NA
FAZENDA BS
CHICA DOCE

O Benemérito Beto Studart reuniu grupo afetivo, no feriado desta última sexta-feira, para desfrutar o fim de semana prolongado na sua Fazenda Chica Doce, no Município de Pindoretama, e, por sugestão do amigo empresário José do Egito, antes passou com seus convidados para conhecer o excelente restaurante rural denominado Benjamim, no Distrito Camará, do Município de Aquiraz, em que ofereceu um lauto almoço. 

Ali se constatou um maravilhoso cardápio da culinária cearense, desde a buchada de bode e a panelada até a carne-de-sol muito macia, acompanhada de um impagável purê de macaxeira, e coberta com um fondue de queijo de coalho – passando por galinha à cabidela e cupim de boi derretendo-se na boca.

José do Egito, pessoa excecionalmente humana e expansiva, trouxe à mesa o jovem acordeonista Nonato Lima, músico local já internacionalmente projetado, o qual, além de peças do cancioneiro cearense e brasileiro, que toda a mesa cantou, executou a pedido, no seu instrumento, nada menos do que o Verão e o Inverno de Vivaldi. 

São duas peças musicais eruditas componentes das Quatro Estações, conjunto de concertos do compositor italiano Antonio Vivaldi, um dos grandes ícones da música barroca. São canções próprias para serem executadas com violinos, mas que foram magistralmente tocadas por Nonato na sanfona, encantando e comovendo todos os comensais do ambiente. 

Ao final, levantou-se um brinde à memória do Dr. Carlos Studart, o abnegado médico que deu vida e hoje dá nome ao popular hospital de Messejana, saudoso genitor do empresário Beto Studart, o qual está lançando a pedra fundamental de um novo busto do seu pai, este na Praça BS, encomendado ao prodigioso artista Edismar Arruda, o mago das esculturas compostas por peças automotivas de metal.





Dali a família e os convidados de Beto Studart saíram em caravana e entraram de maneira solene e ritualística nos portais da Fazenda Chica Doce, e foram apreciar o arrebol do crepúsculo no deque do principal manancial hídrico da propriedade, local que ele batizou de “Bica do Claudinho”, em homenagem ao empresário Cláudio Targino, um dos seus grandes amigos.

Na belíssima sede ajardinada e bem iluminada da fazenda se fez uma visita ao haras, antes de se montar uma roda noturna de bate-papo entre drinques e petiscos, aguardando o serviço do jantar, a cargo da culinarista da família, a Neca, acolitada na cozinha pela Santa. 

Nos dias seguintes, como de costume, Beto Studart se fez acompanhar na cavalgada pelos domínios da propriedade, montando exemplares de seu plantel de mangalargas marchadores, fazendo a vistoria dos pastos e do seu rebanho de nelores.

Entre os convivas, além da esposa Ana Maria, do seu filho Deda e de sua Filha Karine, com a Renata e o círculo pessoal de amizades delas duas (Giacomo e Iratuan, Daniela e Tiago, Juliana e Nathaly). Ainda o especialista em informática Ronaldo Nogueira, cunhado seu, e o já referido Cláudio Targino, com as suas respectivas consortes, Denise e Zena, e o jornalista Reginaldo Vasconcelos, Presidente da ACLJ.        

quinta-feira, 14 de agosto de 2025

POESIA - Soneto Comedimento (SN)

 VERSÃO PROSADA DO SONETO
COMEDIMENTO
(Sousa Nunes)

(SOUSA NUNES, Pres. da Academia Cearense da Língua Portuguesa e prof. do “Centro Universitário F.B.”, com o Reitor da Instituição, Prof. TALES DE SÁ CAVALCANTE, Pres. da Academia Cearense de Letras)

 

À turba não apraz o moderado.

(Francis Bacon, 1º Visconde de Alban [Bacon de Verulâmio], intelectual e polímata inglês. York House, 22.01.1561; Londres, 09.04.1561.

 

 

C O M E D I M E N T O

(Vianney Mesquita)


Ânimo de excecional carácter,
Condição de afáveis, divas graças,
Parêmia a invitar a alma mater
E à Humanidade conceder prolfaças.
 
O rol de temperanças, entretanto,
Deixa de se conglutinar às massas,
E ao singular só se ade, porquanto
Antrópicos quereres têm mordaças.
 
A prudência nem peja o orbe inteiro,
Ininterruptamente lindeiro
Aos contumazes locais do errado.
 
Segundo Bacon expressou, fagueiro,
No adágio conciso e verdadeiro,
“À turba não apraz o moderado”.
 

Análise Crítica do Soneto Comedimento

A decodificação, para a língua prosa, do soneto decassílabo lusitano Comedimento, de Vianney Mesquita, revela uma meditação ética e filosófica sobre a virtude da temperança, contraposta à tendência humana ao excesso e ao descontrole.

O poema, elaborado no formato clássico dos versos ditos “petrarquianos”, assume um tom que oscila entre o encômio da moderação como valor universal e a crítica à incapacidade das massas de reconhecerem sua importância.

A epígrafe de Francis Bacon – “À turba não apraz o moderado” – funciona como uma cravelha interpretativa, sinalizando que o discurso poético se apoiará na sabedoria proverbial para afirmar que o equilíbrio, embora essencial, é muitas vezes desprezado pela coletividade.


Título e Tema

título, Comedimento, sintetiza a ideia central das estrofes: a exaltação da temperança, da moderação e do equilíbrio como virtudes humanas raras, especialmente em contraste com a “turba” – metáfora para as multidões impulsivas, avessas ao caminho do meio. A designação indica um elogio à sobriedade, ao “ânimo de excecional carácter”, em oposição ao comportamento desmedido e aos “contumazes locais do errado” em que a maioria insiste em permanecer.

A epígrafe, da lavra de Francis Bacon – “À turba não apraz o moderado” – atua como eixo interpretativo. Funciona como uma sentença filosófica que resume o conflito: as massas raramente apreciam a moderação, preferindo o excesso e o extremismo. Os pés desta versificação, por conseguinte, não se limitam a uma descrição, pois, também, se posicionam em defesa da prudência e da virtude como forças que elevam o espírito humano, mesmo que pouco reconhecidas.


Linguagem e Estilo

A linguagem empregada pelo polímata palmaciano é marcada por uma dicção erudita e uma sintaxe trabalhada. Palavras como “prolfaças”, “parêmia”, “conglutinar” e “antrópicos reforçam o alçado tom dos versos e demonstram um compromisso com a riqueza lexical. Esse vocabulário, distante de ser meramente ornamental, sugere um distanciamento deliberado da communis opinio aquele mesmo da turba que o poema critica. 

O estilo consolida-se com base numa alternância entre afirmações elogiosas (às virtudes da moderação) e reflexões críticas (sobre a incapacidade coletiva de cultivar essas virtudes). O tom é filosófico, quase sentencioso, reforçado pelo emprego de expressões que evocam ideias universais, como “Humanidade” e “alma mater”.


Estrutura Argumentativa

O soneto é dividido em três momentos, seguindo a tradição clássica da configuração. 

Primeiro quarteto. A voz poética enaltece o “ânimo de excecional carácter” e a “condição de afáveis, divas graças”, associando a temperança a uma espécie de nobreza espiritual. A menção à “parêmia” – isto é, aos provérbios ou sentenças morais – sugere que o comedimento é um valor enraizado na sabedoria tradicional, capaz de beneficiar a humanidade. 

Segundo quarteto. Aqui se exprime o contraste: a moderação não é uma virtude popular, pois “o rol de temperanças [...] deixa de se conglutinar às massas”. O adjetivo “antrópicos” (relacionado à pessoa humana) e a ideia de “mordaças” nos “quereres” indicam que a natureza do Homo sapiens tende à limitação e ao conflito, afastando-se do equilíbrio. A moderação, assim, é divisada como virtude individual, rara e isolada. 

Primeiro terceto. A reflexão expande-se, acentuando que a prudência não “peja o orbe inteiro”, ou seja, não governa o mundo como deveria. A expressão “ininterruptamente lindeiro / aos contumazes locais do errado” sugestiona que a humanidade está sempre à beira do erro, insistindo em caminhos desviados.

Segundo terceto. O fecho do poema retoma a autoridade da epígrafe. A citação de Bacon funciona como chave para a interpretação final: “À turba não apraz o moderado”. O adjetivo “fagueiro” – que implica suavidade e clareza – reforça a concisão e a verdade do adágio. O soneto encerra-se, de tal modo, com uma síntese moral, quase aforística, que ecoa a voz do Filósofo inglês.

 

Tonalidade Crítica e Filosófica

Esta poesia alterna entre o elogio da moderação e a crítica à coletividade. Ao assinalar que “o rol de temperanças [...] deixa de se conglutinar às massas”, o eu lírico revela um certo pessimismo: as virtudes da prudência e do equilíbrio não são naturais à humanidade, que prefere o excesso, a paixão desmedida e a violência. As estâncias, então, cumprem ofício de denúncia e alerta, ao mesmo tempo em que enaltecem um ideal elevado e quase utópico.

 

Conclusão 

Comedimento é um soneto de constituição formal rigorosa em versos decassílabos e léxico sofisticado, características que reforçam sua função como peça filosófica e reflexiva. O poema estrutura-se como um discurso em defesa da temperança, tomando a epígrafe de Bacon como argumento central: a moderação, embora nobre e necessária, não é popular nem facilmente aceita. 

A vis estrófica está no equilíbrio entre formato e conteúdo: a linguagem erudita e o ritmo controlado traduzem, em termos poéticos, o mesmo comedimento que o escrito defende. Assim, a obra se destaca como um exercício de lucidez e crítica moral, mostrando como a poesia é passível de servir, transpondo arte estética, também, como instrumento de reflexão ética.

sexta-feira, 8 de agosto de 2025

NOTA ACADÊMICA - ACLJ Visita LCR

 ACLJ VISITA 
LCR 

A convite do empresário Fábio Brasil, CEO da Gráfica LCR, editora do Grupo Empresarial Christus, uma comissão da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo visitou a empresa, na tarde desta sexta-feira, dia 08 de agosto.

 

Os intelectuais convidados foram recebidos para um agradável “chá das três”, tiveram oportunidade de conhecer o grande parque gráfico da LCR, e de ouvir a sua história.

 

A gráfica teve sua gênese como mero departamento de mimeografia, depois de xerografia, do Colégio Christus, fundado em 1951 pelo Professor Roberto de Carvalho Rocha. 

Até que a LCR se converteu em uma moderna editora, componente do Grupo Christus, hoje grande complexo educacional de ensino – fundamental, médio e universitário.

 

Fábio Brasil agraciou os visitantes com brindes institucionais, e recebeu do Presidente Reginaldo Vasconcelos a sua autobiografia, “Arrebóis e Plenilúnios – 25.000 Dias”. 

Recebeu também do mesmo autor a biografia do jornalista veterano Lúcio Brasileiro, tradicional cliente da LCR, comendatário da ACLJ, obra realizada sob os auspícios do Membro Benemérito Beto Studart.

O grupo de acadêmicos de letras, liderado pelo confrade Francisco José Façanha Bozoka, estava composto pelo presidente da entidade, Reginaldo Vasconcelos, pelo seu secretário-geral, Vicente Alencar e pelos titulares Humberto Ellery, George Tabatinga, Roberto Bomfim e Sávio Queiroz Costa. 

Acompanhou os visitantes, a seu convite, o renomado piloto de caça João Vianney Gonçalves Júnior, oficial aviador da Força Aérea Brasileira,  consultor nacional em aeronáutica, e especialista em Inteligência Artificial, inclusive na sua aplicação ao processo judicial moderno.