sábado, 11 de outubro de 2025

CRÔNICA - Paixão Lusitana (AV)

 Paixão lusitana
Adriano Vasconcelos* 

 

A conheci na pós-adolescência, lá pelos 17 anos. Era irmã de dois colegas de colégio, embora ela mesma estudasse em outra escola, essa gerida por religiosas dedicadas ao ensino de moças.

Bonita, pele muito alva e ornada com lindos e pequenos olhos escuros, na minha cabeça de jovem não concebia ter vindo do continente africano, onde, em filme, víamos seus naturais, todos da raça negra. 

Mas Moçambique, de onde emigrara com a família, havia sido até então colônia portuguesa, e descobri então o porquê daquele sotaque e daquela brancura.

Apesar de cidadãos portugueses, sua família, ao deixar a ex-colônia, optou por vir para o Brasil, trazendo hábitos africanos e aquele gostoso acento lusitano, que me cativou. Não só a mim, mas a toda rapaziada próxima, sendo ela sempre motivo de desejos e de comentários juvenis. 

Apesar de proximidade com a família, a qual frequentava sob a meia-desculpa de recapitular a lição do dia com seu irmão, nunca ousei revelar minha paixão pela moça de sonho e de neve, que me fazia delirar, com seu jeito meigo, e, principalmente, aquele sotaque d’além-mar. 

Mudei de colégio, de amigos, de paixões. Nunca mais a vi. Após muitos anos, ambos já adultos, nos cruzamos em um shopping de Fortaleza. Como não me reconheceu, chamei-a pelo nome. 

A beleza da juventude se transformara em beleza da meia idade, porém aquele sotaque da imigrante portuguesa se fora, transformando sua voz na de uma conterrânea qualquer, e frustrando minha memória diante da bela mulher, agora sem o diferencial sonoro pelo qual me apaixonei na juventude.


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