quarta-feira, 27 de maio de 2015

CRÔNICA (VM)


Em Tempo de Viajar nas Calças”
Vianney Mesquita*


Na mocidade, são as viagens uma parte da educação. Na senescência, um componente da experiência. (FRANCIS BACON).


Viagem pedagógica empreendida à Cidade de São Sebastião, tirante escorrego de lembrança, nos finais dos anos 1970, nos levou, a mim e os jornalistas, meu compadre Godofredo Pereira de Sousa, e a repórter Rosânia Farias para um treinamento na TV Educativa do Rio de Janeiro, a fim de conformar, em modus operandi como unidade nacional, os programas informativos das estações de TV afiliadas ao SINRED – Sistema Nacional de Radiodifusão Educativa, conduzido por aquela emissora carioca, da Fundação Roquette Pinto.

Jornalistas de televisão educativa de todo o País  como nós da então TV Educativa- canal 5, hoje, TV Ceará – participaram da dita reciclagem, com o melhor aproveitamento, em razão do excelente planejamento efetivado pela Direção nacional do SINRED – ainda nas mãos de autoridades castrenses, pois não se havia efetivado, ainda, na plenitude, o projeto de abertura política tão anelado pelos segmentos profissionais e populares, sujigados pelos Ai-s e atravancados por uma legislação, ainda vigorante, constituída quase à ponta das botas.

As aulas ocorreram, em parte, em um centro de treinamento da Universidade Estácio de Sá, nas proximidades da cidade do Rio de Janeiro, bem como no Hotel Marialva, localizado na Lapa, na esquina da avenida Gomes Freire de Andrada com rua da Relação, onde as atividades se desenvolveram por uma semana. 

Ali, conheci, entre outros, os jornalistas Nahum Benjamin Sirotski (hoje, com 90 anos e vivendo em Tel Aviv), Luís Carlos Bittencourt, Leda Nagle e Mounir Safatli, Recigrid Rodrigues Campainha (Amazonas) e o conterrâneo Hamilton Alcântara. Com este mantive muito contato, notadamente no que diz respeito às molecagens do Ceará dos anos 1950, especialmente, em relação aos tipos populares de Fortaleza, às estórias engraçadas, como, por exemplo, a vaia ao sol na praça do Ferreira, após dias de chuva, e os apupos ao cantor Cauby Peixoto, quando, paletó róseo, escorregou e caiu com as pernas abertas na frente do Cine São Luís, para gáudio da canalha e, no então presente, recheio futuro do nosso passado. 

Lembramo-nos da estória do Bem-bem, que vendia refresco no Centro de Fortaleza, o qual chegou a visitar Paris, com grande sacrifício e a instâncias dos cordiólogos de ofício, ainda hoje existentes, à exaustão, no Ceará moleque. Essa negrada, após seu retorno da Cidade-Luz, insistiu em que ele substituísse, no cartão de visitas, o seu nome para Bien-Bien – Garapière de Paris, objeto de mofa eterna.

Sempre apreciei por demais as viagens, tanto de mero lazer como a mistura com as de teor universitário, havendo procedido a bom número desses périplos com sentido pedagógico, no Brasil, Argentina, Uruguay e Peru, defendendo trabalhos acadêmicos, bem harmonizadas ao que prescreve na epígrafe desta estória o filósofo e político inglês, autor do Novum Organum (21.01.1561-09.04.1626).


Uma vez jubilado por aposentação – e cá se completa o acima reproduzido pensamento de Francis Bacon  passei a empreender excursões, pelo Brasil e também ao Estrangeiro, aí, às vezes, três por ano, como à Colômbia e Europa quase inteira – Rússia, Espanha, Portugal, Inglaterra, França, Suíça, Itália, Bélgica e mais e mais, conhecendo e curtindo extraordinárias cidades, algumas de nomes pouco referidos aqui, como Gant e Bruges (Bélgica), Cartagena de las Indias e Zipaquira (Colômbia), Haia, Roterdan e Madurodan (Países Baixos), San Petesburgo e Moscou, Berlim, Assis e Siena, Porto e Póvoa do Varzim ... e tantas outras.

Por motivos diversos, a não ser pelo Brasil, a última jornada mais distante ocorreu por França, Holanda e Bélgica, durante 12 dias, em novembro de 2012, havendo cancelado uma, no final do ano passado, a Israel e Jordânia, em razão de atos de terror de gravidade ocorridos no primeiro citado país da Ásia.

Agora, a vontade de viajar é imensa, já estando acertada uma para vários lugares da Europa Ocidental, a ocorrer, Deus querendo, em novembro, com a mulher, meus irmãos e as mulheres, amigos e cônjuges, em número de 12 pessoas.

Em razão desse imenso desejo (por mim expresso) de viajar, retomo a figura do Hamilton Alcântara, que foi há muito tempo embora para o Rio de Janeiro. É filho do Casco Escuro, alcunha do Professor Tancredo Halley de Alcântara – porque bem moreno, e também havia com essa denominação uma cerveja, na época vendida no Ceará, objeto de muita publicidade nos meios locais de comunicação coletiva. 

O tempo foi 1962 e Tancredo postulou vaga para o Senado Federal, concorrendo pela coligação das oligarquias - UDN-PSD-PSP – tendo sido derrotado pelo “Calila”, Carlos Jereissati (PTB), para a Câmara Maior do Poder Legislativo nacional.

No citado treinamento que descerra esta narração, num dia, pela manhã, conversava com o Hamilton Alcântara e, já por volta das oito e meia, à espera do demorado desjejum, ele quase não mais para de rir, ao lhe dizer que estava “em tempo de tomar café nas calças” – moto a que recorri para titular esta crônica.


Dá uma saudade!

   
*Vianney Mesquita 
Escritor e Jornalista. 
Professor adjunto IV da Universidade Federal do Ceará. 
Árcade titular e fundador da Arcádia Nova Palmaciana; 
acadêmico titular das Academias Cearense da Língua Portuguesa e 
Cearense de Literatura e Jornalismo. 
Membro do Conselho Curador 
da Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura, da U.F.C.

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