quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

CRÔNICA - (In) Suspeição (EOS)


(IN) Suspeição
Edmar de Oliveira Santos* 


Favela é densa de barraco, de gente sem título, de beco para andar, de lama a escorrer, de subida e descida que dispensa academia. Nela tem suspeição: Quem sobe? Quem desce? Quem é você, meu irmão?



Cara de mais um, cara de ninguém, quando por sorte se “salva” um, com certeza já morreram cem. Veja lá!  É lugar curioso, de agitação frenética que empolga visitação. Bem verdade que não em todas!

– Para, para aí! Encosta! Mora onde? Em que comunidade? É suspeito!

– Tem carteira de trabalho assinada? Faz o quê? Operário padrão! Tá bom, passa aí.

Um carro, uma casa, um condomínio, tudo de luxo! Entra e sai – bairro é nobre – Sai da favela, se esconde no luxo, ninguém te percebe, a luxuosidade proporciona insuspeição! Será mesmo?

Nesse estilo tudo é amplidão. Difícil saber quem mora ao lado; não interessa, basta saber que tem condição de estar ali. Não deve ser interessante também saber que condição é essa!

– Boa noite! Documentação, por favor! Onde mora? Na comunidade? Até mais doutor!

A discrepância do ter e não ter; do ser e não ser, vai causando cegueira racional. Generalidade é burrice, nos ensina a cidade mais que a filosofia. Vemos ricos “pobres” buscando aventura na favela e “pobres ricos” morando em condomínio de luxo.

Clausura na comunidade, no vai e vem das ruas caminhando a pé; vez por outra se agacha quando um estampido foi ouvido. Clausura de condomínio, de shopping Center, lugares legais, melhor ficar dentro do que fora – sei lá, pode ter tiro na rua.

Deixa a vida nos levar! Pois, sejamos ricos ou pobres, como diz a música, “o velhinho sempre vem!”. Seja de preto ou de branco!


CONVITE - Medalha Boticário Ferreira (AM)

 

CRÔNICA - Cego do Amendoim (TL)



CEGO DO AMENDOIM
Totonho Laprovitera*


O sol tinha acabado de se por quando, no Mercado dos Peixes, eu, Erick e Ferruccio nos deparamos com um jovem cego, vendedor de amendoim.

Apresentado pelo Luís “Rei dos Cornos” – que foi reconhecido só pelo aperto de mão – pra início de conversa, afável, o deficiente visual logo se mostrou boa-praça e de bem com a vida. Daí, puxando cavaco, travamos um leve e bem-humorado bate-papo.

– Você é cego de nascença? 
– indagou Ferruccio.

– Não, doutor. Eu enxergava, mas sofri uma pedrada na cabeça quando era pivete e, quando virei adulto, comecei a ter dor de cabeça, a minha vista foi embaçando, embaçando, até que fiquei cego.

– Mas você não procurou um médico? – inquiriu Erick.

– Procurei, mas quando já era tarde demais.

– Tarde demais? – perguntei.

– Sim, porque o glaucoma já havia consumido minha visão.

– Diga pra eles o que você era, antes de cegar  – pediu Luís.

– Ah, eu era garçom e dos bons! Mas, perdi a visão, então, fui obrigado a largar a profissão, e para sobreviver eu hoje vendo amendoim.

– E tem mais, mesmo sem ver, ele conhece qualquer cédula! – glosou Luís.

– É mesmo? – perguntou Ferruccio.

– É, sim, senhor – rindo.

– Pois então vamos fazer um desafio. Eu vou lhe dar umas cédulas pra você segurar. As que você identificar serão suas. Tá valendo?

– Tá valendo. Sério.

Ora, foram quatro cédulas – 2, 5, 10 e 50 reais, não nessa ordem – e o cego não errou uma. Quer dizer, acertou e embolsou todas!

Aí, fiquei curioso de saber qual a técnica usada por ele para identificar as notas.

– Amigo, você as reconhece pelo tato, naturalmente.

– Sim.

– Por alguma saliência ou aspereza?

– Não, senhor, pelo tamanho.

Pois é, muitas vezes eu penso que tem é cego que, mesmo sem ver, enxerga.



terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

COLUNA - Nº 1233 - 27.02.2018 (VA)



COLUNA DO VICENTE ALENCAR

Nº 1233 - TERÇA-FEIRA
27 de Fevereiro de 2018
FORTALEZA
CEARÁ
BRASIL

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Escreva para a coluna:
vicentealencar25@yahoo.com.br


POEMA EM ORDEM ALFABÉTICA - Abecedário Aliterante (MC - VM)



ABECEDÁRIO ALITERANTE
Márcio Catunda*
Vianney Mesquita*



RESUMO

Exercício de versificação em estâncias decassilábicas portuguesas, com o emprego da aliteração e de outros tropos linguísticos. Seu produto configura 23 quartetos, tendo por base igual número de letras do alfabeto da Língua Portuguesa – uma quadra para cada letra (sem k, y e w) com suporte na literatura de metrificação poética reconhecida no Brasil e em Portugal, conhecimento obtido ao longo do tempo, sem, no entanto, particularizar nenhum autor, embora sejam indicados alguns na Bibliografia para demanda por parte dos leitores (AZEVEDO, 1970, 1997; CAMPOS, 1960; NASCIMENTO, 1995;  e CARVALHO,1991). Em razão de, na peça, poder alguém enxergar os estilos preciosista e bestialógico, descarta-se essa possibilidade, com explicações plausíveis.

PARA ACESSAR A ÍNTEGRA DO ARTIGO E O ABECEDÁRIO ALITERANTE
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ARTIGO - A Enrascada (RMR)



A ENRASCADA
Rui Martinho Rodrigues*



A dívida pública cresceu tanto que está levando a União, os Estados Federados e os Municípios à insolvência. Gastamos mais do que as receitas públicas permitem. As elevadas despesas dos últimos anos, durante os quais chegamos ao descontrole da dívida, não supriram, porém, as necessidades dos serviços públicos, porque gastamos muito, porém, pessimamente.

Temos necessidade de fazer frente a despesas crescentes nos setores de segurança pública, saúde, pesquisa nas áreas de ciência e tecnologia, assistência social e outras prioridades inadiáveis. Uma grande parcela dos orçamentos públicos está comprometida com o item pessoal. Ainda assim precisamos de mais servidores em inúmeros setores.

A enrascada está no fato de precisarmos gastar mais, e ao mesmo tempo precisarmos cortar despesas. Seria possível aumentar a arrecadação, a despeito da já elevada carga tributária? Teríamos algum efeito recessivo, depois de uma sofrida crise da qual ainda nem saímos plenamente? Poderíamos continuar na rota do endividamento crescente e acelerado, por um prazo necessariamente longo? Certamente teríamos de pagar pesados juros que agravariam o círculo vicioso do endividamento, limitando gravemente a nossa capacidade de investimento.

Cortar despesas, quando a fome por verbas é aguda, além de produzir efeitos danosos nos campos econômico e social, é uma tarefa dificílima, do ponto de vista político. Temos um teto constitucional para os gastos. Não temos perspectivas de um súbito aumento da arrecadação. Temos uma situação calamitosa em grande parte dos serviços públicos. 

A convergência de todos estes fatores prenuncia uma crise financeira e econômica e uma zona de turbulência política, institucional e social. A condução do País em meio a tamanho desafio se fará no momento em que não temos líderes nem partidos representativos e as instituições estão desmoralizadas.



segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

ARTIGO - Talvez em Nome do Povo (AS)



Talvez em Nome do Povo
Arnaldo Santos*



Este título tomei emprestado do livro recém-publicado pelo Professor Doutor Rui Martinho Rodrigues, para trazer à reflexão o acordo político com o Senador Eunício Oliveira, Presidente do Senado Federal, com vistas às próximas eleições. 

Alinhavado pelo governador Camilo Santana e corroborado pelo ex-governador Cid Gomes, referida aliança, de tão pragmática, desorientou a oposição e produziu divergências, até no interior do grupo que apoia o Governador. 

O presidenciável Ciro Gomes, e o deputado federal André Figueiredo, presidente estadual do PDT, que fazem parte da aliança, reiteradas vezes, reverberaram contra esse arranjo eleitoral, com críticas nem um pouco lisonjeiras.

Por mais contraditório que nos pareça o tal acordo (e o é), sobretudo quando se examinam as relações de hostilidades entre o Senador e os irmãos Gomes, deve ser lembrado o fato de que acordos da espécie a História nos legou uma penca, cada um mais esdrúxulo do que o outro.

Na República Velha, por exemplo, é emblemática desta realidade a política do café com leite (1898/1930), como ficou conhecido o combinemos engendrado pelas oligarquias de São Paulo e Minas Gerais, com o Governo Federal, para que os candidatos a Presidente da República, durante aquele período e de modo alternado, fossem escolhidos entre os políticos desses dois Estados. 
Histórica e contemporaneamente, no acordo entre PSD e UDN, na política do nosso terreiro, que ficou conhecido como União pelo Ceará, (1962), corria até sangue entre esses dois partidos, e essa combinação resultou na escolha, pelo voto, do Governador Virgílio Távora, com vistas a pacificar o Estado.

Mutatis mutandis, paixões, motivações e interesses à parte, uma aliança na perspectiva de um acordo é um pacto entre as partes envolvidas objetivando a construção de fins comuns; e esses arranjos são da essência política, em qualquer democracia. Adversários de ontem, por mais hostis que tenham sido, em uma determinada conjuntura, representam apenas o mal menor. Na política não há espaço para virtuosos.  

Em sã consciência, ninguém pode obscurecer a projeção do Senador Eunício Oliveira, no cenário político nacional, pela posição que ocupa.

Desconhecer sua importância, especialmente como mediador dos interesses do Estado, seria uma tentativa ilusória de negação da história. A propósito, em uma conversa informal com o Senador, ouvi dele um relato muito substantivo no que refere à liberação de recursos em favor do Ceará, em 2017.

A meu sentir, o que está equivocado não é a aliança com o Senador Eunício, e sim a omissão dos fundamentos que embasaram o acordo. Na falta de um debate transparente a respeito da composição, sobra a ideia de que se trata de uma engenharia meramente eleitoral (Eleitoreira?).

Em ultrapasse aos interesses eleitorais, objetivando suas reeleições, o Governador Camilo Santana e o Senador Oliveira deveriam inaugurar outra prática política no Estado para o estabelecimento desse acordo.

Minha sugestão é de que sejam listados e publicados na imprensa, por via de uma nota pública, todos os grandes projetos de interesse do Ceará, que fundamentaram o acordo, com os quais o Senador Oliveira se comprometeu a defender.

Sem que essas informações sejam disponibilizadas para a população, prevalece o que sugere a denominação dada a esta análise.


domingo, 25 de fevereiro de 2018

CRÔNICA - Acho que Vou Querer uma Sopa (VM)



[...] ACHO QUE

VOU QUERER UMA SOPA!
Vianney Mesquita*


      
A fome é o melhor cozinheiro. (Anônimo).

Muito me contenta verificar o fato de que, vez por outra, abica a nau de um cronista novo no porto expressivo, e já bem rico, configurado no jornal eletrônico da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo. Aqui, desde 2013, publico crônicas, artigos, poemas e escritos de conteúdo mais pesado, conforme o são os da área científica.

Também sou leitor radicado do blog, cujas matérias, em sua maioria, são objeto da minha admiração e, muitas vezes, vibro e me comovo com seus teores bem meditados, expressos por pessoas de alteado talento literário, veio artístico e capacidade opinativa – aliás, seja isto manifesto, de passagem – tal sucede com a maioria dos seus colaboradores.

A propósito, salvante escorrego de lembrança, é a quarta oportunidade que diviso para ler, com duplicado comprazimento, textos de Edmar de Oliveira Santos, com quem não experimentei, ainda, o prazer de estabelecer conhecimento. São escritos, a igual tempo, inteligentes, profundos e leves, fato denotativo de que é detentor dos melhores cabedais intelectivos, evidentemente, com escolaridade esmerada, bem como prontidão sorvida no decurso de sucessão da escola da vida.

Dele apreciei a crônica Aceita um Café?, publicada ontem, e me envolvi profundamente com suas estórias, haja vista o fato de me açularem a memória, trazendo-me de volta fatos da puerícia e juventude, os quais me fizeram retornar à Palmácia, onde morei desde que nascido. Trouxe-me à evocação, na Fortaleza dos anos de 1960-70, entre outros, o Pega-Pinto do Mundico, a Miscelânea, Novail, Casas Pernambucanas, A Espingarda e, principalmente, o Abrigo Central, derrubado em 1967 para construir o verdadeiro caixão em que se transformou a Praça do Ferreira, felizmente reformada, depois, para a configuração arquitetônica tomada até a atualidade.

No Abrigo Central (que muitos caipiras e caiçaras cearenses chamavam aubrigo), ficavam vários cafés e lanchonetes, incluindo o estabelecimento do Pedão da Bananada, paredro da torcida do Ceará, chefe emérito dos seus simpatizantes, que a cambada do Fortaleza (a carniça, em represália) já chamava de urubus.

Dois fatos pitorescos – o primeiro tanto gracioso quanto histórico – sucederam no Aubrigo. Ocorreu de Moreira Campos (José Maria), o maior contista do mundo, ter conduzido, para ali tomar um cafezinho, o lexicógrafo e lexicólogo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, celebrado intelectual alagoano, que preparava, naquele momento, mais uma edição do conhecido hoje como Dicionário Aurélio. Holanda, extraordinariamente atilado, captava tudo o quanto era de regionalismo para verificar o que poderia adentrar seu léxicon.

Quando o Professor Moreira Campos disse – “Dois cafés ...!”, o atendente gritou para a moça que preparava o produto: “Duas louças”! Então, Buarque de Holanda, incontinenti, sacou da Compactor e escreveu: CEARÁ – CAFÉZINHO – LOUÇA.

E, hoje, louça é sinônimo perfeito de cafezinho, no padrão de regionalismo cearense, insertado que foi no famoso glossário pelo próprio autor.

Meu colega de Universidade Federal do Ceará e amigo de pescarias, o hoje psicólogo e psicanalista Sidcleiton Viana Jucá, era funcionário do BNB, trabalhando no prédio do Cine São Luiz (o Cinema era em baixo), Praça do Ferreira. Uma vez ele desceu para saborear o café do Aubrigo. Ali na merendeira, cujo nome não me ocorre agora, se vendia tudo o quanto era de merenda – bolachas, biscoitos, bolos, sopas, pastéis et reliqua. Quando sorvia uma louça, chegou o Ciro, seu colega de meninice no Pacoti (vizinho à minha Palmácia).

Ciro tinha chegado do Pacoti havia pouco, no mixto do Fariinha, que estacionava na Praça da Sé, na frente do Café Catedral, e estava com muita fome, pois, às três da tarde, quebrado como arroz de terceira, ainda não havia almoçado. Cumprimentou o Sid, conversaram miunças, conversa vai, conversa vem, até que o Sid falou: “Ciro, é servido um cafezinho? O rapaz pacotiense não titubeou e, de imediato, falou: – ACHO QUE VOU ACEITAR UMA SOPA!


sábado, 24 de fevereiro de 2018

ARTIGO - A Cegueira dos Paradigmas (RV)


A CEGUEIRA DOS PARADIGMAS
Reginaldo Vasconcelos*



Aos meus amigos, os Professores Rui Martinho Rodrigues e Álder Teixeira, dois grandes pensadores, em opostas trincheiras ideológicas.



A “cegueira dos paradigmas” se observa, por exemplo, na absurda resistência que os agnósticos desenvolvem, mesmo entre os mais lúcidos, em relação à existência de Deus, que é evidente.

Sem Deus todos os valores humanos e postulados lógicos ruiriam, e a existência consciente do próprio pensador perderia o sentido ontológico, porque o dom da consciência individual, cerne da personalidade, é antagônico ao caos e à negação do anabolismo.

Mas a cegueira dos paradigmas também se verifica na espantosa dificuldade que os místicos encontram, ainda mesmo os mais cultos, em entender que Deus não tem um contorno antropomórfico, nem uma essência antropanímica, que se enfurece e se aplaca, que premia ou castiga.

Deus se constitui apenas em um intuito universal energético que executa um grande projeto lógico incognoscível, movendo uma imensurável mandala geométrica, do qual todas as coisas da existência são fractais.

Todas as coisas  são partes imbricadas do grande processo divino, coisas dentre as quais o ser humano é a única a se perceber e determinar, porque se consegue comunicar consigo mesmo, através do pensamento, e com os demais, por meio da palavra – e por isso tem a faculdade de se conectar com o Absoluto e melhor evoluir no sintagma da existência – mas também de se desviar e corromper. 

Mas Rui Martinho Rodrigues alvejou em seu mais recente artigo deste Blog o específico fenômeno dos ideólogos doutos que continuam perseguindo um intangível arco-íris, contra todas as evidências mais solares de que não é viável o éden social que seus mentores intelectuais conceberam e propalaram.

A conjectura humanitária desses mestres socialistas, convertida em um teorema brilhante, tentada na prática não resistiu à realidade. Mas, como se estivessem dotados de antolhos filosóficos, os discípulos perseveram na busca de uma abismal utopia – palavra do latim cuja tradução literal é “lugar impossível” – a não ser no campo imaginário.

Defendem esses pensadores que Álder Teixeira representa que “a esquerda é formada por aqueles que se preocupam com os pobres”, enquanto “a direita seria composta por aqueles que defendem os ricos” – definição pueril atribuída a Norberto Bobbio, apud Noam Chomsky – certamente encontrada em algum livro infantil que este último cometeu, vertendo o fabulário das histórias de Trancoso, que remete ao “tempo em que os bichos falavam”.

Sim, porque no mundo adulto é o contrário: a esquerda é composta pelos que odeiam os ricos, e a direita por aqueles que amam os pobres, dando-lhes empregos e recolhendo tributos com os quais o Estado promove o bem comum. Notai, não é a pobreza, mas a riqueza do livre mercado que produz em grande escala os alimentos, e as motocicletas, e os aparelhos celulares, cada vez mais baratos, a que os pobres têm acesso – e o fazem largamente.

O grande mito das esquerdas é a de que a riqueza produz pobreza, ou que seja por ela responsável. Não. A riqueza é reprodutiva e distributiva, de modo que na verdade ricos e pobres são como o fio azul e o fio vermelho que juntos produzem a luz da lâmpada. Fora disso é a escuridão. Fora disso é a miséria. É notar que há desafortunados lugares no mundo em que somente existem pobres, mas não pode haver sociedade onde todos sejam ricos.

Ora, de todas as qualificações imagináveis em relação ao ser humano, existem as definitivas, como a dos euros e dos afros, dos nipos e dos cinos, bem como a dos componentes dos quatro ou cinco gêneros sexuais atualmente admitidos – entretanto riqueza e pobreza são condições absolutamente circunstanciais e relativas.

O conceito de pobreza e riqueza é relativo porque os pobres cearenses são ricos para os pobres indianos, por exemplo, enquanto os ricos do Brasil são pobres ante os sheiks do Catar. De outro lado, a condição financeira não deflui de um determinismo do destino, e, em tese, não é definitiva nem estanque. Todos os descendentes dos antigos ricos do Bairro Jacarecanga em Fortaleza estão hoje entre modestos cidadãos, enquanto os atuais ricos da Aldeota foram pobres, ou de pobres descendem, há duas ou três gerações.
                   
Sim. As pessoas nascem belas ou feias, hígidas ou não, árabes ou nórdicas, e forçosamente assim o serão a vida toda, mas ninguém é condenado a ser pobre, nem proibido de ser rico, a Deus querer. Tudo é uma questão de sorte e mérito. O resto se resolve com as políticas humanitárias, as obras pias e as iniciativas caridosas. No mais, tudo é paradigmática cegueira.

Então, como defender a classe dos que hoje são mas ontem não foram, e amanhã não serão mais? Lutando para que eles não sejam, para que outros venham a ser? Não. Somente o gênio individual e o trabalho coletivo, remunerado conforme o descortino e o desempenho de cada qual,  eliminam a pobreza e produzem riqueza, o que não compete jamais a impraticáveis teorias messiânicas.

Tão cegos são os esquerdistas brasileiros que, sendo eles mesmos geralmente pessoas honestas, que ascenderam a boas castas sociais pelo estudo e pelo trabalho, pela sorte e pelo mérito, no entanto desprezam as questões éticas e morais em favor de seus estalões imaginários.

Insistem eles em que Lula da Silva foi o mais virtuoso presidente do País, “a viva alma mais honesta do Brasil”, em virtude de ter continuado, mantido e aprofundado programas sociais – entretanto esquecendo-se de que sob seu comando houve Waldomiro Diniz, André Esteves, Daniel Dantas, Antônio Palocci, José Genuíno, Delúbio Soares, João Vacari Neto, Henrique Pizzolato, Sérgio Sombra, José Dirceu, Sérgio Cabral, dentre outros “aloprados” e “cuequeiros” em geral.




SHOW TUBE BRASIL



Sob o poder de Lula nos veio Dilma, e com ela Temer, chefe do enclave peemedebista no Governo, do qual faziam parte Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima, Henrique Eduardo Alves e quejandos, gente que quase quebrou a Petrobrás, e assaltou outras estatais por meio dos cargos que indicavam – e quanto a isso não há dúvida, porque muitos confessaram, delataram os outros, indicaram as contas, devolveram dinheiro.

Então, como o Lula pode ser essa maravilha de pessoa e de político? Aliás, ele mesmo um belo exemplo de “mobilidade social” – embora sendo um péssimo exemplo de enriquecimento ilícito, já que era um nordestino paupérrimo e enriqueceu de repente a sua prole, ele próprio tentando ocultar patrimônio mal havido, como a polícia revelou.

Lula e Dilma não marcaram sua passagem no poder com grandes obras que promovessem o progresso do País (ao contrário do que fizeram os governos militares) – até porque estiveram preocupados em dotar outras nações de estradas e portos construídos com recursos brasileiros, geralmente ditaduras bananeiras sul-americanas e da África, todos mancomunados com grandes empreiteiros.   

Mas, ainda que lhes demos o crédito de terem incrementado políticas sociais já existentes – o Bolsa-Família em continuação ao Bolsa-Escola; o Minha Casa Minha Vida inspirado na velha COHAB; o FIES dando sequência ao Crédito Educativo – e dessa forma granjeado eleitoreira simpatia popular, entretanto nada disso justifica terem se aliado ao que havia de pior na política brasileira – de Sarney a Collor, de Jucá a Calheiros, de Barbalho a Maluf – quando foram eleitos sob a promessa de combater a corrupção.

É bom lembrar que por salvar a vida da moça que se afogava no oceano, mesmo assim o herói não adquire o direito de logo após seviciá-la. O PT não salvou a Pátria, e ainda estuprou as suas finanças.



CRÔNICA - Aceita um Café? (EOS)


Aceita um café?
Edmar de Oliveira Santos*



Seis da manhã, o fogão aquece um recipiente com água em ebulição que sopra um vapor quente e faz soar um apito de seu bico esguio e torto. Enquanto isso, ao lado, na mesa de madeira envernizada, rodeada por seis banquetas da mesma cor, enquanto outro recipiente com a boca amordaçada por um saco espetado por duas varetinhas; aguarda em silêncio o fim do soar agudo que vem do fogão.

O saco de algodão é preenchido de café em pó que era preparado lá mesmo. O grão havia sido torrado no tacho que ficava no quintal da casa, sobre uns tijolos afastados pela lenha que queimava até que ficassem pretos como jabuticabas; depois, amassados em um pilão de madeira. A água quente e vaporosa lavava o café que escorria pelo saco ao fundo do bule, momento em que exalava o odor intenso, que ao longe, convidava à degustação.

Essa cena um tanto bucólica, e que nos aguça uma memória afetiva e nos remete aos lares do campo ou de uma cidadezinha, por lá mesmo ficaram e, mesmo lá, já não se aprecia tal dinâmica.

Não é, em hipótese alguma, que o café tenha perdido sua importância. Pelo contrário, ele até se avantajou no status social. Prova disso é que, hodiernamente, faz parte da cena de reuniões executivas importantes, preparado em máquinas eletrônicas, com roupagens em sachês e sabores diferenciados com misturas e tric-trics.

A sociedade brasileira, assim como a velha praxe de se fazer café, se transformou de maneira tal, que os órgãos de nossos sentidos já não têm mais tempo para apreciar tais minúcias deliciosas da vida cotidiana, que nos preenchiam o tempo, nos embalavam a mente e as conversas em roda.

Infelizmente vivemos o tempo da angustia existencial, onde só pensando na segurança que não temos para viver, perdemos o hábito de parar e apreciar despreocupadamente um cafezinho entre amigos. Restou-nos apenas a saudade!




COMENTÁRIO:

Realmente, saudades das farinhadas e dos “Beijus”, nos fornos à lenha...

Marcos Teles


sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

ARTIGO - Não Era a Economia? (RMR)


NÃO ERA A ECONOMIA?
Rui Martinho Rodrigues*



A inflação brasileira alcançou níveis civilizados. Os juros são os mais baixos já vistos por toda uma geração de brasileiros. A economia volta a crescer, sinalizando o fim da recessão em menos tempo do que em Portugal, Grécia, Espanha e outros países que viveram uma crise semelhante.

Até o desemprego parou de crescer e começa a declinar mais cedo do que se esperava, por ser sempre a última coisa que se recupera após uma recessão. A lavoura apresenta um volume de produção extraordinariamente elevado, valendo-se mais do aumento de produtividade do que do aumento da área plantada. A balança comercial tem obtido resultados favoráveis, aumentando ainda mais as já expressivas reservas de divisas.



É a economia que determina o humor dos eleitores? Não, todo determinismo é equivocado. A economia é um fator politicamente importante. Não tem, todavia, o poder de influenciar, sozinha, a política. Todos os indicadores econômicos favoráveis não evitam o recorde negativo de popularidade do presidente.

A recuperação econômica inevitavelmente é lenta e o eleitorado não compreende isso. A cegueira dos paradigmas faz com que até pessoas letradas e bem informadas achem compreensível que treze anos de governo petista não tenha sido suficiente para equilibrar o endividamento herdado do governo FHC, apesar da economia mundial ter ajudado  mas acham imperdoável que dois anos não sejam suficientes para a recuperação plena da economia brasileira.

As reformas são outro fator importante para a formação da opinião pública ou publicada, como diria Churchill (1874 – 1965), conjunto complexo de variáveis que escapam ao entendimento da maioria dos brasileiros; contraria a ideologia hegemônica; fere poderosos interesses corporativos; necessariamente retira vantagens, pois não se faz ajuste de contas sem dor.

As redações ideologizadas dos órgãos da grande mídia, escolas, parte significativa do clero e demais formadores de opinião, não compreendendo ou mentindo deliberadamente, fazem campanha contra a economia ortodoxa, a única que dá resultado. A elite suicida permite que as suas empresas de comunicação, ou por ela financiada com os seus anúncios, assim como as escolas onde os seus filhos estudam, sejam aparelhadas.

Foi criado, apesar de tudo, o teto de gastos, que talvez não seja possível implantar, devido à situação calamitosa das contas públicas e aos problemas políticos. As reformas administrativa, tributária e previdenciária não foram feitas. Mas, nem um mágico as faria, nas atuais circunstâncias.

A corrupção generalizada do mundo político impacta fortemente na popularidade do Governo, envolvendo a pessoa do presidente e dos seus colaboradores mais próximos. O Macunaíma está revoltado com as práticas políticas, ainda que a economia apresente melhoras.