PRECISA-SE DE
UMA VOVÓ
Assis Martins*
Precisa-se, com urgência, de uma senhora idosa, bem
velhinha, de preferência que tenha o cabelo bem nevado, como daquelas vovós
antigas que a gente encontrava nas cartilhas, filmes e histórias da carochinha.
É necessário ter todos aqueles atributos que hoje nos dão saudade: a voz meiga,
os olhos cheios de ternura e com o dom de compreender os nossos defeitos, a
qualquer hora. Esses predicados serão suficientes para fazer a felicidade de um
pobre cristão carente de afeto, que busca em cada esquina o refúgio e o consolo
da voz da experiência.
Quando vocês
encontrarem algum anúncio semelhante a este, saibam que é, com certeza, de um
amigo meu, cujo nome não vem ao caso, intransigente defensor dos costumes
antigos. Ele é radicalmente contra o gosto atual das pessoas idosas de pintarem
o cabelo, cuidarem da pele e da postura, enfim, de darem uma retocada no
visual.
Não concordo com suas
posições e argumento que acho muito bonita a atitude das pessoas, que, apesar
da idade avançada, alimentam a autoestima, seja com a indumentária ou o físico.
É gratificante ver, pelas áreas de lazer da cidade, venerandas senhoras e
sisudos senhores, sozinhos ou em grupos, às vezes sob as ordens de um instrutor,
realizando atividades físicas e lúdicas com o maior entusiasmo.
Essas cenas, hoje tão
comuns, eram inadmissíveis no passado. Os idosos, aliás, os integrantes da
melhor idade, procuram assimilar tudo veiculado pelos media, tanto nos atos de vestir e calçar, quanto no aspecto da
estética, da beleza física.
É formidável ver uma
senhora setentona frequentando academia, andando aprumada, cabelo arrumado e o
astral lá nas alturas. Sem essa do casal de velhinhos ficar confinado nas
alcovas, remoendo lembranças e transformando a vida a dois numa eterna liça!
A ciência operou
grandes saltos na busca de uma vida mais saudável e, a cada dia, avança mais na
peleja contra o envelhecimento humano, por meio de um sub-ramo científico novo
– a Gerontologia, a qual estuda os fenômenos psicológicos, fisiológicos e
sociais relacionados ao envelhecimento do ser humano. Acolheu, também, uma
especialidade médica para examinar e tratar as patologias ligadas à decadência
humana advinda da idade cronológica.
Muitas novidades
surgem em todas as áreas. São tratamentos intracelulares, drogas para combater
os radicais livres e prevenir a longevidade das células, distintos métodos de
hidratação da pele para diminuir manchas e rugas, próprias da idade.
Contou-me o amigo,
Prof. Vianney Mesquita, que, revendo uma dissertação de mestrado acerca de
assuntos gerontológicos, deparou a fala de uma senhora de 89 anos que, indagada
pelo pesquisador sobre o que é ser velho, respondeu: qualquer pessoa com cem anos ou mais, que vive reclamando de dor em
todo canto do corpo, não come, não dorme direito e vive tomando meizinha ...
O grande perigo dessa
época de Viagra, Cialis e outros estimulantes
milagrosos é a propagação de doenças sexualmente transmissíveis por um velhinho
mais afoito, o que era outrora "privilégio" dos jovens.
Meus argumentos não
conseguem mudar a opinião do meu amigo, que vai mais além, acentuando que até
os clássicos infantis serão mudados. Por exemplo, a Vovó de Chapeuzinho Vermelho não será salva pelos caçadores,
ela própria liquidará o lobo mau com potente golpe de caratê!
O cúmulo a que
chegou foi dizer que o explorador espanhol Ponce de Leon, descobridor da Flórida, obcecado a vida toda para encontrar a água da Fonte da Juventude, não foi tão infeliz no seu
intento, porquanto conseguiu ainda, pouco antes de
morrer, inventar um genérico: a tintura para cabelos.
*Assis Martins
Funcionário da U.F.C.
Cronista e Ilustrador.
Bacharel em Geografia e Tecnologia e Gestão do Ensino Superior
pela Universidade Federal do Ceará.
Eis uma reflexão bem humorada!! Todos os dois tipos são interessantes: a vovó modelo antigo, e a vovó moderna - contanto que ambas tenham muito carinho e atenção para dar aos seus queridos...
ResponderExcluirParabéns, Assis, pela crônica!
Abraços,
Karen R.