O LOBO DO HOMEM
Reginaldo Vasconcelos*
"Lupus est homo
homini non homo" (Titus Maccius Plautus - 230-180 a.C.)
Quem assistiu ao primeiro episódio da série
cinematográfica americana “O Planeta dos Macacos”, de 1968, lembra que o protagonista, um
astronauta, vivido pelo ator Charlton
Heston, acidentalmente viaja no tempo e aporta na Terra do futuro,
dominada por macacos, que escravizam seres humanos, os quais desaprenderam a
falar.
No
filme se observa que os símios, embora inteligentes e falantes, dotados de
grande boçalidade, se colocam no centro do universo planetário, considerando
que os demais seres, inclusive os humanos, como animais inferiores,
despersonalizados, não são sujeitos de direitos.
O
argumento da história, retirada do livro homônimo do escritor francês Pierre Boulle, escrito em 1963, impõe uma
reflexão grave sobre a concepção humana tradicional de que subjugar a natureza e os
outros seres vivos é apanágio de uma única espécie, aquela capaz da comunicação e do
raciocínio.
O
antropocentrismo, que é essa tendência de considerar a superioridade absoluta
do homem enquanto espécie, vem sendo mitigado ao longo do tempo, como
consequência mesma da evolução moral e espiritual da sociedade, com repercussão
jurídica, embora a diversidade cultural ainda apresente resistências,
notadamente em regiões mais atrasadas do Planeta.
Não
se admite mais a exploração “desumana” de animais nos circos, por exemplo, e há
movimentos contra o uso cruel de cobaias nos laboratórios, enquanto alguns
animais domésticos ganham status de
“pessoas”, credores de carinho e respeito, objetos de atenções sociais e de
excepcionais cuidados médicos.
No
campo alimentar, entretanto, a humanidade demorará muito para superar a
necessidade de abater animais para suprir a sua ração de proteína, essencial
ao seu organismo. A caça e a pesca foram praticadas por milênios, sem
restrições, mas isso vem se tornando inviável, em função do crescimento
demográfico.
Nessa
mesma linha, mesmo entre os homens, uma hierarquia ética se impõe: primeiro se
protejam, de forma incondicional, os cidadãos idôneos, e somente depois se
cotejem e apliquem as prerrogativas humanitárias dos delinquentes em geral.
Assim,
se o indivíduo revela disposição de atacar a integridade de inocentes, em
qualquer medida, precisa ele ser reprimido com energia, indiferentemente de sua
condição social, mental ou etária, até com letalidade, se flagrantemente
necessário.
Principalmente,
o predador da cidadania deve ser submetido a custódia estatal imediata, seja ele
gente ou bicho, adulto ou criança – não para que expie sua culpa penal pelo sofrimento –
mas até que não traga mais nenhum perigo à sociedade.
No
mundo todo, o Direito Penal ainda traz a mesma lógica da empalação e do açoite,
do suplício e das masmorras, com o fito de disciplinar o infrator
atual, e, a um só tempo, exemplar o eventual futuro delinquente, para que,
temendo o castigo, ele se abstenha de sua sanha delitiva.
Nos países desenvolvidos a privação da liberdade e a pena de morte prevalecem
como punição máxima e como soluções civilizadas, contudo é a filosofia medieval da
vingança social pela tortura psicológica e pela extinção física que permanece
latente nessas práticas modernas.
A verdade é que, vendo
bandos de meninos vagabundos atacarem cidadãos de bem e trabalhadores honestos
pelas ruas do Brasil, deixemos à
parte essa questão jurídica brasileira sobre as leis penais e a sua execução.
Ao contrário do que discutem com grande volúpia os penalistas, o foco central do Estado deveria ser a pessoa de bem e a sua segurança, e não o criminoso e o seu castigo.
Ao contrário do que discutem com grande volúpia os penalistas, o foco central do Estado deveria ser a pessoa de bem e a sua segurança, e não o criminoso e o seu castigo.
A priori não
interessa como, quando, quanto e a quem sejam aplicadas as penalidades, mais ou
menos rigorosas, para nos determos sobre um fato insofismável: os agressores
precisam ser imediata e eficientemente segregados pela máquina governamental repressiva, para que se evitem novas vítimas, para que se garanta a incolumidade de inocentes.
Diante
disso, não interessa toda essa infindável discussão sobre a redução da maioridade
penal; a respeito do desarmamento da população civil; sobre a constatação
da tibieza das penas cominadas e a grande flexibilização do seu cumprimento; sobre a
grita pelos direitos humanos dos delinquente e dos presos.
Na
verdade, nada disso supera a importância urgente de manter os cidadãos a salvo
dos bandidos, de separar o joio do trigo, de proteger os homens dos lobos, sem espaço para as infindáveis e
inócuas lucubrações filosóficas, sociais, políticas e jurídicas sobre o sexo
dos anjos, no campo criminal. Delinquiu com violência? É prender e deixar preso – seja quem for, tenha que idade tiver – até que, seguramente, ele não
traga mais perigo à cidadania e possa vir a ser devolvido à sociedade. Innocens sacra res est.
*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ
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