sábado, 31 de dezembro de 2022

MENSAGEM DE FIM DE ANO - Entre Acelejanos (RV)

ENTRE
ACELEJANOS
Reginaldo Vasconcelos* 

 

Ricardo Cavalcante, atual Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), Membro Benemérito da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo (ACLJ), enviou-nos um elegante cartão de natal, que os Correios somente entregaram neste último dia do ano – portanto os augúrios de feliz natal já se confirmaram, mas os votos de um venturoso 2023 ainda nos reforçam as esperanças.


 Ricardo e Rosângela     

Totonho e Elusa

Exultamos ao constatar que a bela ilustração mariana do cartão saiu dos pincéis mágicos do artista acelejano Totonho Laprovitera, o que exalta o simbolismo do gesto e a importância da mensagem, toda ela entre confrades da ACLJ, o que é estimulante e alvissareiro. Gratidão ao Ricardo, saudações ao Totonho, dois dos grandes orgulhos de quantos integram a nossa confraria alencarina. 


ARTIGO - Hegemonia e Ortodoxia (RMR)

 HEGEMONIA
E ORTODOXIA
Rui Martinho Rodrigues*

 

 

O movimento político e cultural impulsionado pelo Iluminismo se aproximou do completo êxito. Secularizou a cultura. A política como engenharia social e antropológica, dirigida por sábios semelhantes aos reis filósofos de A República de Platão (428/427 a.C. – 348/347 a.C.) dominou os meios intelectuais e artísticos. 

Pesquisa sociológica, histórica, a reflexão política, filosófica e até teológica, sofreram influência da ideia de uma ordem concebida por sábios, levando Raymond Aron (1905 – 1983) a cunhar a expressão “ópio dos intelectuais”, na obra assim intitulada.

Os iluministas lançaram mão do enciclopedismo para difundir a ideia da engenharia social e antropológica. O advento dos jornais também foi usado para este fim. O surgimento de jornais tem sido associado a uma onda de revoluções, com destaque para a Francesa, de 1789.

 

A Sociedade Fabiana, surgida na Inglaterra, na década de 1880, reuniu intelectuais e líderes de diferentes áreas com o objetivo de promover o socialismo. O título invoca a memória do general e ditador romano Quinto Fabio Maximo (275 a.C. – 203 a.C.), que ganhava batalhas sem travar combates decisivos, fustigando o adversário com escaramuças, desgastando-o até obter vitória. Nem é preciso lembrar a influência do Iluminismo. 

Os fabianos não queriam cargos no governo. Pretendiam mudar o pensamento da sociedade, algo semelhante ao que Mao Tsé Tung (1893 – 1976) expressou ao dizer que tinha como objetivo a conquista de corações e mentes; György Lukcás (1885 – 1971) disse, em um dos seus pronunciamentos, ter como objetivo a conquista da cultura; Antônio S. F. Gramsci (1891 – 1937) declarou o seu pensamento sobre a inutilidade que seria, no ocidente, tomar o palácio de inverno (aludindo ao que foi feito na Revolução Russa), dizendo ser necessário obter a hegemonia ideológica, na obra Os Intelectuais e a Organização da Cultura; Louis Althusser (1918 – 1990), por seu turno, na obra Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado, dedicada inteiramente ao desafio da hegemonia ideológica. Os frankfurtianos todos dedicaram-se ao problema da indústria cultural e ao domínio da cultura. 

A análise das transformações culturais e políticas do momento deve começar pelo sentido em que usamos as palavras ideologia, hegemonia, guerra cultural. Este último aspecto guarda relação com os conceitos de liberdade, igualdade, bem-estar social, segurança jurídica e justiça. Um pequeno ensaio como este só pode oferecer uma degustação do desafio de tentar compreender o tempo presente. 

Ideologia expressava um conjunto de conceitos e explicações que orientavam escolhas políticas e sociais, pessoais ou coletivas. Adquiriu o sentido de uma percepção ou discurso distinto do conhecimento epistemologicamente válido, fundado na razão e nos fatos. Servir a um poder ou projeto de poder, legitimando-o, é o seu objetivo. (Dicionário de ciências sociais, FGV. Coordenado por Benedicto Silva). Hegemonia, para os estoicos, era a razão que anima e governa o mundo, merecedora do poder e do domínio sobre tudo (Dicionário de Filosofia; Nicolas Abbagnano).

 

Guerra cultural sofre objeção de quem argumenta contra a banalização da palavra guerra. Carl P. V. G. Clausewitz (1780 – 1831), na obra Da Guerra, definiu guerra como a continuação da política por outros meios. Aceita a proposição do general prussiano, o corolário do seu conceito também é válido: política é uma guerra travada por outros meios. Guerra é um conjunto de meios para alcançar um fim contrariando a resistência de opositores. 

Clausewitz distinguia guerra real de guerra absoluta. Real é a observável na experiência histórica. Absoluta é a pertencente ao mundo das ideias e concepções abstratas. Guerra cultural não banalizando o conceito, cabe perfeitamente na concepção de guerra absoluta do pensador citado. Visa impor uma mudança cultural, política e econômica radical, valendo-se de todos os meios para submeter a resistência.

O conjunto de conceitos e explicações que orientam escolhas políticas, posto a serviço de um poder ou projeto de poder (ideologia), impacta em tudo, influenciando a visão de mundo. A política é impactada pela ideologia no que concerne à liberdade, igualdade, bem-estar, justiça e segurança jurídica. No campo político e ideológico, omissão, informação parcial, satanização do outro, negação e adulteração de dados alternadamente com o discurso abstrato, conceitos indeterminados e promessas sedutoras são armas largamente usadas. 

A manipulação  seja como doutrinação, como catequese ou outra forma de proselitismo, pode ser flagrada no magistério e na mídia quando ideias ou modelos apresentados não são submetidos ao contraditório. A falta de objeção às visões e aos autores ministrados é imperdoável. Teoria do valor trabalho versus teoria marginal do valor; liberdade de agir e de fazer versus liberdade de ser; igualdade de todos em tudo (sem exemplo histórico, abstração utópica) versus igualdade de todos em algo (perante a lei, não na lei); igualdade de alguns em tudo (os reis filósofos de Platão) versus igualdade de alguns em algo (menores, gestantes, idosos, aposentadoria, serviço militar para homens).

 

Não fazer distinções como estas, apresentando propostas vagas, baseadas em conceitos indeterminados é uma poderosa tática de proselitismo. No conto Teoria do Medalhão, de J. M. Machado de Assis (1839 – 1908), um pai ensina o filho a fazer sucesso valendo-se, entre outras coisas, do discurso vago, que permite a qualquer um entender como algo com que concorda. 

Bem-estar é outra arma na guerra cultural. É um conceito indeterminado. Abraham H. Maslow (1908 – 1970) definiu uma hierarquia de necessidades que qualificou como básicas, roteiro da plena realização. O psicólogo esqueceu a subjetividade. A hierarquização das necessidades é apresentada por ele como um dado objetivo. 

O prato de comida, o celular da nova geração, a roupa de marca e tantas outras coisas não exercem atração conforme uma hierarquia definida de necessidades, embora existam tendências. A subjetividade das necessidades faz do bem-estar uma sequência interminável de desejos. A transformação da cupidez em direito legítimo e a sua frustração como opressão é uma poderosa arma no campo da guerra política no campo cultural. 

Criamos uma sociedade de inimputáveis, já que a opressão entendida como aspiração não realizada por culpa de terceiros exclui a responsabilidade individual. Quem oprime é o outro. O sucesso é responsabilidade do Estado provedor e da sociedade. A liberdade de ser, ao excluir o sentido do dever, introduz a instabilidade da modernidade líquida (Zygmunt Bauman, 1925 – 2017) e com ela a incerteza e a insegurança.

 

A desorientação se agrava quando se pensa que “livre pensar é só pensar” (Millôr Fernandes [Milton Viola Fernandes], 1923 – 2012). O pensamento é uma alvenaria. Os seus tijolos são conceitos e dados cimentados por rigorosa vigilância epistemológica. Não basta pensar sobre inflação quando não se conhece um conjunto de saberes como a teoria quantitativa da moeda, a elasticidade-preço etc. Não basta pensar as relações sociais sem distinguir a teoria de estratificação social baseada na origem da renda versus teoria de estratificação baseada na quantidade de renda (posição no mercado). Pensar exige estudo prévio. 

A hegemonia é ortodoxia. Sataniza a divergência como ignorância ou má-fé, projetando no outro a própria condição. Os que resistem à catequese passam à condição de insensíveis, preconceituosos ou fascistas. A exitosa guerra cultural ocupou os sindicatos, as escolas, a mídia e o aparato estatal. Mas nunca é tarde para defender a liberdade de agir, a igualdade de todos em algo, a liberdade de consciência e a paz da segurança jurídica, do governo das leis.


segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

CRÔNICA - O Natal (RMR)

O NATAL
Rui Martinho Rodrigues* 

 

O Natal é uma das grandes festas do Ocidente, ligada à tradição do cristianismo histórico, ao lado da páscoa, que é da tradição judaico-cristã e de outras festas confessionais e seculares. Originária da festa dedicada ao deus Sol, no solstício de inverno (do hemisfério norte), foi assimilada pelo cristianismo histórico após Constantino, para estimular a conversão de povos pagãos, no Século III. 

Ressignificada, a festa passou a evocar o nascimento de Cristo. Menciona-se o nascimento na cidade de Belém, na manjedoura, a chegada dos magos (mas os evangelhos sinóticos só dizem que eles eram magos, sem mencionar a sua condição de reis, não lhes cita os nomes e diz que todos eram do Oriente, sendo os únicos documentos que mencionam estes adoradores de Jesus, que a História Secular não menciona). 

O livro de Salmos diz que reis adorarão a Cristo, mas não diz quando, podendo ser por ocasião da segunda vinda. A anunciação, a fuga para o Egito e outros fatos ligados ao momento do nascimento do aniversariante são sempre lembradas na data comemorada. 

A secularização da cultura ocidental transformou o Natal em uma festa laica. Isso provocou em muitos um sentimento de nostalgia, que em alguns se torna melancolia pela ausência do sentimento de fé e falta do componente sobrenatural. A boa notícia (evangelho) da chegada do Salvador e o apelo ao arrependimento, na mensagem “... arrependei-vos, porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3; 2). A boa nova é “Porque pela graça sois salvos por meio da fé; isso não vem de vós; é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie” (Efésios 2; 8-9). 

O Natal, todavia, começa muito antes. No livro de Gênesis, 3; 14-15 o Senhor diz, dirigindo-se a serpente: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente [da serpente] e a sua semente [da mulher]: esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”, profecias que se cumpriram na cruz. 

Ali, por ocasião da queda, quando o homem decidiu ser autônomo, chamando a si o juízo do bem e do mal, quando adquiriu a consciência de suas imperfeições (viu que estava nu) e errou o alvo. Ai começa o natal, na forma de promessa messiânica feita pelo Deus piedoso, não pelo Senhor enfurecido de interpretações largamente divulgadas. “Então fez o Senhor Deus para Adão e sua mulher túnicas de pele e os vestiu” (Gênesis 3;21), em atitude piedosa. 

Comer do fruto do conhecimento do bem e do mal foi o pecado original. Pecado (do grego hamartia, verbo que significa “errar o alvo”, Novo Dicionário da Bíblia, de John Davis) gerou consequências desastrosas. A promessa messiânica tem o significado de uma remissão do pecado, para que o homem deixe de errar o alvo e escape das consequências da tentativa de fazer aquilo para o que não tem aptidão: juízo moral. 

O Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (João 1; 29) faz com que deixemos de errar o alvo. Como o Messias (no hebraico), ou Cristo (no grego) faria isso? João 3; 16-17 responde: “porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu seu filho unigênito, para que todo aquele que Nele crê não pereça, mas tenha vida eterna. Porque Deus enviou seu filho ao mundo, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por Ele”. 

O grande presente de Natal foi dado na origem dos tempos. A natividade foi o anuncio da boa nova ou boa notícia (origem grega da palavra evangelho) que era o cumprimento da promessa messiânica, com o nascimento do Cristo (o ungido) da profecia feita pelo próprio Deus no Gênesis.

PRECE DE NATAL - Vicente Alencar

 PRECE DE NATAL
Vicente Alencar*

Meu Senhor,
toda a humanidade crê em ti,
como Gaspar, Belquior e Baltazar
também acreditaram.
 
Meu Senhor,
nesta data do teu aniversário,
que a paz,
a humildade, as virtudes de cada um
construam com maior brilho,
com mais amor,
a esperança na Ressureição
e em um mundo melhor!
 
Meu Senhor,
que seu manto de paz,
na alegria de Nossa Senhora
e na sabedoria de São José,
possa nos levar ao Messias.
Que o caminho de todos nós
leve-nos à verdade e à vida
como ensinaste.

Meu Senhor,
na Glória de Deus,
na Glória de Deus,
ajudai-nos a todos.
Amém.




sábado, 24 de dezembro de 2022


 

MENSAGEM DE NATAL - Evento Nobre (PN)

 EVENTO NOBRE
Pierre Nadie*

 

“RECEBA, NESTE NATAL, A PAZ QUE OS ANJOS ANUNCIARAM ÀQUELA NOITE AOS HOMENS DE BOA VONTADE”. (Pier Giorgio Liso)


Quanta alegria inspira-nos o Natal!

Desde criança, aprendi a amar tudo o que concerne aos arranjos e preparativos do advento desse Menino, chamado Jesus, ao mesmo tempo, humano e divino. O presépio continua a me fascinar e a ansiedade dos presentes fazia-me dormir cedo e pôr os chinelos debaixo da rede. Papai e mamãe iam à missa do galo, naquela época, à meia noite. E, quando chegavam, punham os presentes debaixo de nossas redes e acordavam-nos. 

– Papai Noel acabou de passar por aqui, dizia-nos papai.

A gente pulava da rede e era uma só alegria. 

Papai deixava-nos brincar algum tempo, enquanto mamãe preparava uma frugal ceia: café e bolo. E, logo depois, íamos dormir para voltar, na manhã de Natal, a partilhar, mutuamente, com os amigos os presentes. Todavia, somente depois de participar da Missa, na Matriz ou na Catedral de nossa cidade. 

Papai Noel era um mito agradável e nos empolgava, embora soubéssemos quem nos dava os presentes. Simpática sua figura, não me substituiu a fé no Cristo, tampouco diminuiu a confiança em meus pais. 

Menino Jesus, a razão de ser do Natal. Assim, éramos doutrinados. 

Cresci e ainda gosto de Papai Noel. Ele habita meus sonhos da infância que guardo, carinhosamente, no mais recôndito de mim. O vermelho de seu traje é sinal de vida, de amor e de cuidado, tanto que é frontispiciado pela alvura da paz, da inocência, da verdade.

 

Hoje, a figura de Papai Noel, manchada pela usura comercial e censurada por religiosos, além de nos lembrar São Nicolau, vejo-o ao lado do Menino Jesus: os dois momentos extremos da vida – a criança que vem, princípio da vida, e a velhice que vai, após cumprir sua missão. O Menino inicia a história principal de nossa Salvação, plenificada na morte e ressurreição. Missão completa, céu reaberto, resgate garantido. 

Minha estima do Natal fora sempre representado pelo nascimento de Jesus e nada tem ofuscado a grandeza desse evento. 

Meus pais me ensinaram que era preciso acompanhar esse Menino, na Sua história, pois, o amor que sentíamos por Ele era bem menor que o amor dEle para com a gente. Esse Menino seria adolescente, jovem e sofreria as agruras da crucifixão para nos resgatar o Paraíso perdido. Seu nascimento, momento de alegria, se transformaria em dor de morte e morte de cruz, para, em seguida, nos empolgar e extasiar com Sua ressurreição.

O Natal é-me evento nobre e vibrante e, cada vez, amo-o mais ainda, sobretudo, porque todo seu valor advém da Ressurreição, da Páscoa de Jesus: este o seu significado maior. 

Desejo a você uma Feliz comemoração natalina, nos passos do Nazareno. 


quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

CRÔNICA - Nobre Missão (PN)

 NOBRE MISSÃO
Pierre Nadie* 

 

Sonhos, quem não os tem? Sonhos, quem os realiza? 

Hoje, 20 de dezembro, volto-me, mente e espírito, para contemplar um sonho, pelo qual dei toda a minha vida e emprestei todas as minhas energias. 

Um sonho sonhado na minha profunda intimidade, e realizado no convívio com tantos outros, colegas, amigos e amigas, que tal desiderato uniu – e o tempo não apagou os rastros de amizade e de respeito. 

Hoje, faz 46 anos de amor por esta profissão tão sublime quanto humana, tão nobre quanto vital. Tivemos bons mestres, respeitáveis e competentes. Constrangimentos e percalços aconteceram, porém jamais nos desencorajaram. Ao contrário, fortaleceram nossa garra de luta, pois, sem sentido, a vida perde o sabor e, sem ele, vai-se a razão de ser. 

Fomos diplomados médicos em 1976. De lá até o fim de nossos dias, somos médicos, curadores de homens e mulheres.

 

Alguns já nos deixaram, e esses, missão cumprida, merecem todo respeito e solidariedade. Numa outra dimensão eles repousam. Porém, sua história permanece conosco. Deixaram-nos, sim, mas não se foram: sua memória e seus feitos jamais morrerão. 

Guerreiros, fomos à luta. Travamos seis anos de batalhas para alcançar o objetivo almejado. Talvez a mais ingrata tenha sido no segundo semestre do quinto ano de Medicina. Uma reforma atingiu-nos de cheio e manchou a unidade processional de nossa caminhada turmal: dividiu-nos, estressou-nos e nos instou a sair de semestres para uma pedagogia de créditos. Desestabilizou-nos a unidade acadêmica, porém, não conseguiu desacreditar nossa amizade. 

Fizemos nossa hora. Continuamos unidos. Continuamos médicos e médicas. Aguerridos, somos vencedores e vencedoras. Nossos aplausos são nossos pacientes, que tangeram nossas mãos em nossa obra curativa. 

Deus nos abençoe a todos! 

(Em 20 de dezembro de 2022)

sábado, 17 de dezembro de 2022

CRÔNICA - Um Pedaço do Ceará (WI)

Um pedaço do Ceará
Wilson Ibiapina*
 

Quem acha que São Paulo está abarrotado de cearenses não conhece o Acre. O deslocamento para o cantinho do Brasil, que faz divisa com o Amazonas, Rondônia, Bolívia e Peru começou bem antes, no século dezoito. 

O historiador Arruda Furtado diz que foram três as causas determinantes das migrações encaminhadas para o Acre. A primeira, provocada pela seca. A segunda, a atração do eldorado amazônico e, a terceira, o espírito aventureiro do cearense. 

O escritor Artur Reis registrou que “em março de 1879 já tinham entrado em Manaus mais de seis mil retirantes cearenses”. José Carvalho de Souza, que nasceu na serra da Meruoca, e que viveu mais de 130 anos, foi o cearense mais velho a habitar o Acre.  

O território boliviano virou brasileiro depois que foi invadido por seringueiros em busca de mais espaço para extrair látex. A mão de obra necessária para a expansão da fronteira e o consequente aumento das produção foi fornecida pelos cearenses que fugiam da seca e se alistavam como soldados da borracha.

 

Depois de duas  revoltas apareceu o gaúcho Plácido de Castro. Na época com apenas 27 anos de idade, liderou uma forte revolução, vencendo as tropas bolivianas, e proclamando, pela terceira e última vez, o território independente do Acre. 

O território do Acre, que depois virou Estado da Federação, continua habitado por cearenses e seus descendentes. Desse novo pedaço do Brasil saíram pessoas importantes, que se destacaram nacionalmente. Entre eles o jornalista Armando Nogueira, o poeta Thiago de Melo, o médico Adib Jatene, o Coronel Jarbas Passarinho e o ambientalista Chico Mendes.


Há pouco tempo, o cineasta Pedro Jorge de Castro foi a Xapuri fazer uma palestra. Num restaurante, o garçom puxou conversa:

– O Sr. é  de onde mesmo? 

– Sou do Ceará, respondeu o cineasta. E o garçom encerrou a conversa: 

– Ah!, pensei que fosse de fora.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

CRÔNICA - Gorbachev e o Papa (WI)

  

NOTA ACADÊMICA - Assembleia Geral Ordinária

  ACLJ
ÚLTIMA ASSEMBLEIA
GERAL ORDINÁRIA
DE
2022

 

A Academia Cearense de Literatura e Jornalismo realizou, na noite deste último dia 08 de dezembro, no Palácio da Luz, com pompa e circunstância, a sua Assembleia Geral de final de ano.



 



Iniciando a solenidade com o toque do trompete triunfal pelo arauto oficial Jean Navarro, seguido da execução dos Hinos Nacional e da ACLJ, pela Banda de Música do Exército, a abertura dos trabalhos foi declarada pelo Presidente Emérito, Rui Martinho Rodrigues. 

A PALAVRA DO ANO 

Em seguida foi definido, segundo critério próprio, o termo “Mentira” como a palavra do ano de 2022, inclusive suas cognatas, todas as conjugações do verbo mentir, notadamente o adjetivo “mentiroso”, como também a expressão do inglês “fake news”, que se traduz no mesmo âmbito semântico. 

O concurso “A Palavra do Ano”, que se repete em vários países e idiomas, promovido por instituições lexicográficas diversas, procura eleger o termo mais empregado no período anomalístico, às vezes um neologismo ou estrangeirismo que se tenha tornado recorrente e vicioso, ou um vocábulo banal a que se tenha dado novo sentido semântico e se tenha aplicado exaustivamente nos discursos, nos debates, na imprensa e nas redes sociais da Internet.

O Dicionário On Line de Português, por exemplo, elegeu “Democracia” como a sua palavra do ano, enquanto para o britânico Cambridge Dictionary,  "Homer" foi a palavra do ano para todo o Reino Unido – termo do beisebol, um dos esportes nacionais da Inglaterra.

Já para o Dicionário Oxford a palavra do ano é composta, e seria “Goblin Mode”, (jeito duende), que remete ao modo de vida desleixado que muitos assumiram ou revelaram durante a pandemia.

Para a “Sociedade da Língua Alemã”, uma espécie de academia de letras nacional daquele país, a palavra do ano naquele idioma seria “Zeitenwende, dando um significado pejorativo para “nova ordem mundial”, que para eles está relacionada às causas e efeitos da guerra da Rússia contra a Ucrânia.  

O CEARENSE DO ANO

Na mesma solenidade, cumprindo a tradição, foi agraciado com o título de Cearense do Ano o Senador Eduardo Girão, por ter sido o nosso conterrâneo que mais se destacou no cenário nacional, liderando a bancada nordestina no Parlamento Brasileiro. Seu nome foi proposto pelo nosso decano Cássio Borges, representado por seu filho, também acadêmico titular, Marcos André.


O concurso “O Cearense do Ano” não tem qualquer inflexão graciosa ou conotação política, pois, mediante a propositura de nomes de cearenses que tenham sobressaído no âmbito estadual, nacional, ou internacional, é eleito aquele que objetivamente tenha tido maior projeção social, em sua área de atividade.

POSSE DE BENEMÉRITA CONSORTE

Recebeu o título de Benemérita Consorte Dona Consuelo Dias Branco, a Primeira-Dama do Empresariado Cearense, honraria a que tem jus na sua condição de esposa sempiterna do nosso imortal Ivens Dias Branco, grande mecenas da ACLJ. 

A Benemérita foi representada pelo seu Assessor de Comunicação, o jornalista Edilson Araújo, comendatário da ACLJ, que recebeu o diploma e a pelerine de torçais negros, correspondentes à láurea, para repassá-los a Dona Consuelo, que convalesce de um pequeno acidente.

POSSE DE TITULARES 

Tomou posse na Cadeira de nº 29 da quadraginta numerati da ACLJ, que tem como patrona a escritora Rachel de Queiroz, a advogada, professora e literata Manoela Queiroz Bacelar, e, na Cadeira de nº 36, patroneada pelo musicista Alberto Nepomuceno, o advogado e músico César Barreto.


O nome de Manoela, aprovado pela Decúria Diretiva, fora proposto pelo acadêmico Wilson Ibiapina, que a saudou em projeção de vídeo enviado de Brasília, onde reside, e de onde não pôde vir por conveniência de saúde, e o acadêmico Sávio Queiroz Costa, lhe fazendo as vezes, cumpriu a formalidade da entrega do diploma. O marido dela, Ricardo Bacelar, lhe pôs sobre os ombros a beca ritual.

César Barreto, por seu turno, teve aclamação plena, após ter tido seu nome proposto pelo acadêmico Luciano Maia, que lhe passou às mãos o diploma, enquanto sua mulher, Dona Isabel Tereza, lhe vestiu a pelerine.

POSSE DE HONORÁRIOS 

Conquistaram a dignidade de Membros Honorários o repórter fotográfico Luís Carlos Moreira e o médico e youtuber João Flávio Nogueira, pela sua importante atuação jornalística em espaços da Internet. 


Luís Carlos recebeu o diploma das mãos do proponente de seu nome, o acadêmico Adriano Vasconcelos, e a pelerine lhe foi vestida pela sua mulher Adriana; João Flávio recebeu o diploma do Presidente Reginaldo, que propusera seu nome para integrar a confraria, tendo lhe vestido a beca a sua consorte Taís de Fátima.


TRIBUTO A AUGUSTO PONTES 

A solenidade foi coroada com um tributo à memória do intelectual Augusto Pontes, falecido em 2009, professor, compositor, boêmio, filósofo aplicado, exímio frasista, que foi um dos mentores do chamado “Pessoal do Ceará”.

 

Esse grupo era composto por jovens artistas sônicos cearenses demandaram ao Sudeste entre as décadas de 70 e 80, para fazerem sucesso nacional. Dentre eles o Ednardo, o Fagner, o Belchior, o Fausto Nilo, a Amelinha, o Rodger Rogério e a Téti – dentre outros.

 

Ednardo, idealizador da homenagem, compôs, em parceria com Calé Alencar, uma nova canção para lançar durante o evento, o “Maracatu Augustus”, cuja execução foi exibida no telão do auditório, entremeada com trechos de entrevista prestada pelo próprio Augusto Pontes.

 

Ao final foi outorgada a Comenda Augusto Pontes, láurea instituída pela ACLJ para agraciar os componentes daquele grupo de artistas ainda não distinguidos com a Medalha Evaldo Gouveia, concedida em solenidade de maio deste ano a quatro deles. Receberam a Comenda Augusto Pontes desta vez o compositor Rodger Rogério e a cantora Téti – ela representada pelo filho do casal, Pedro Rogério. Fez a entrega da comenda e do diploma o acadêmico Ulysses Gaspar, um dos entusiastas da homenagem.


FALARAM

Falou o Presidente Emérito, Rui Martinho Rodrigues, na abertura e no encerramento dos trabalhos;


Falou o Presidente Reginaldo Vasconcelos, para registrar o advento da “Arcádia Alencarina”, um departamento interno da ACLJ, composto por quinze acadêmicos titulares que decidiram se congregar para subvencionar a confraria como um todo, constituindo, simbolicamente – numa comparação somática védica – o coração e o cérebro do organismo da entidade. Os árcades, a partir de 04 de maio do próximo ano, reunir-se-ão formalmente uma vez por mês, em caráter privado, vergando fardão acadêmico, e as suas reuniões e deliberações serão divulgadas na redes sociais oficiais da instituição na Internet; 

Falou César Barreto, em seu nome e em nome dos demais empossandos, em fala simpática e metalinguística, citando o Padre Vieira, sobre  as características ideais de um discurso,  em conteúdo e duração, pautando dessa forma, com muito bom humor, os oradores que o seguiram;

Falou Edilson Araújo, apresentando agradecimentos em nome de Dona Consuelo;

 
 

Falou Amaro Pena, em nome do compositor Raimundo Fagner, que estando no Rio de Janeiro enviou mensagem em vídeo apresentada no telão do auditório. Amaro Pena recebeu pelo Fagner a Medalha Evaldo Gouveia, que este esteve impossibilitado de vir receber pessoalmente, desde maio, por compromissos de trabalho;


Falou Pedro Rogério, em nome dos seus pais agraciados, Rodger e Téti, apresentando uma oratória de altíssima qualidade, erudita e emocionada; 

Falou também o Ednardo, referindo saudosamente ao amigo e parceiro Augusto Pontes, e agradecendo à ACLJ pela homenagem a ele prestada.

Encerrando a solenidade, após o tradicional brinde com vinho do Porto, ouviu-se o Cântico Acelejano, composto por Evaldo Gouveia para ser a "Canção da Academia", cantado e tocado por César Barreto, com letra de Reginaldo Vasconcelos e Poty Fontenele.







Nossa comemoração de ontem foi inspiradora, plena de afeto, carinho, lealdade e justiça.

O afeto se revelou desde a chegada dos acadêmicos, com inúmeros abraços fraternais e a imediata criação de receptiva atmosfera acolhedora. 

O carinho se expressou através dos novos confrades e homenageados, que não se pouparam em declará-lo como atributo da nossa Academia. 

A lealdade tomou o recinto com a promissão regimental assumida por todos e encaminhada pelo novo confrade César Barreto, que falou pelos novos. 

E a justiça repousou na grandeza das homenagens aos valorosos nomes da nossa terra. 

Impressionou-me sobremaneira a profunda rapidez da poética ednardeana. 

Ao chamar o comendatário Ednardo à tribuna, o confrade Vicente Alencar passou-lhe a palavra: 

“Ednardo, a palavra é sua.” Ao que ele elaborou num átimo: “A palavra é nossa, a palavra é plural!”.

Aluísio Gurgel do Amaral Júnior 


Fotos: ACLJ e Balada In