sábado, 30 de maio de 2015

CRÔNICA (VM)

QUEM DÁ CONTA DA HERMA?!
Vianney Mesquita*

A saudade é um parafuso/Que, quando sua rosca cai,/Só entra se for torcendo/Porque batendo não vai/Depois que enferruja dentro/Nem destorcendo não sai! (JOSÉ EURÍCLEDES FORMIGA. YS. João do Rio do Peixe, 19.06.1924 – São Paulo, 09.06.1983. Trabalhou na Gazeta de Notícias, de Fortaleza-CE).


No recuado 1968, desfrutei a sorte de haver sido escolar do Colégio Municipal Filgueiras Lima, malgrado a velada repressão no ano do malfadado AI-5, matriculado no terceiro ano colegial, como se chamava então. O prédio fica aos fundos do Colégio Paulo Sexto, da rede estadual, no que se transformou o antigo Matadouro Modelo, localizado no centro nervoso do Jardim América, Bar Uirapuru numa esquina e, na outra, a Casa Dois Apóstolos, de material de construção, propriedade dos irmãos Pedro e Paulo. Quem passava por ali o fazia ligeiro, espantado com o fartum de tecido orgânico vacum apodrecido, mau cheiro só desaparecido totalmente após alguns verões pesados.

É tanto que, no citado 1968, os pretinhos Coragyps e Cathartes  ainda se empoleiravam nos pontos mais altos de ambos os colégios (bem mais no Paulo VI), pois não se haviam esquecido dos lautos regabofes com os quais se regalavam em suas permanentes visitas àquele rico manancial alimentar. Somente depois de uns dez ou mais anos, foi que eles se desvaneceram no tocante ao retorno daquelas amplas possibilidades alimentais e, a pouco e pouco, abandonaram suas costumeiras torrinhas.

E eis que o progresso decepcionou a Natureza mais uma vez (como o faz amiúde), em proveito do movimento antropocêntrico e detrimento do moto biocêntrico, hoje em curso nos estudos de sustentabilidade da vida humana, animal e vegetal, em franco desenvolvimento em todo o Mundo, objeto temático de cimeiras internacionais a respeito de meio ambiente. 

Contíguo ao prédio novo, no qual se instalara em 1966 o Municipal pois este houvera deixado o edifício onde hoje é a sede do Instituto do Ceará – Histórico, Geográfico e Antropológico – o Colégio Paulo VI tinha instalações descansando sobre terras impregnadas de gordura animal e tecidos orgânicos decompostos. 

Uma vez, por volta das nove da noite, no intervalo imediatamente anterior à última aula, eu e alguns colegas divisamos no quintal do antigo abatedouro, de cima de uma arquibancada erigida para exibição de tourada, uma fonte do chamado igni fatuus – fogo fátuo – chama azulada, em geral, ocorrente em pântanos,  cemitérios e locais onde há grande quantidade de glicerídeos de ácidos graxos – que deixou a turma em rebuliço.

A despeito de haver demorado bem pouco tempo no Colégio, pois nem cheguei ali a terminar o Científico, sou pessoa testemunha da existência de excepcionais professores – André Pinheiro (filho do Dr. Edmilson), Jeovah Lima, Dona Marieta, Pedro Augusto Timbó Camelo, entre outros – bastante assíduos e competentes, sem improvisação didática, cumpridores dos horários e, sobretudo, amigos dos estudantes, pois também sob a mira dos alcaguetes da gloriosa, que, sem ninguém saber, se infiltravam nas conversas com o fito de dedurar alguém à Direção.

Punctum Saliens do Colégio Municipal Filgueiras Lima é, sem nenhuma dúvida, o imprescindível busto do educador e poeta Filgueiras Lima (Lavras da YMangabeira, 21.05.1909 – Fortaleza, 28.09.1965), na entrada do Estabelecimento, onde está gravada uma divisa a expressar o pensamento desse extraordinário mestre e emérito fundador de escolas (350), relativamente à conduta em sala de aula e fora dela, tendo ele como o próprio cânone: Ensino como quem reza: com a alma genuflexa.

De quando em vez, em especial quando trato de meu período de escolar secundarista, memorizo, saudoso, o pouco e precioso tempo em que transitei por essa modelar Casa de ensino, fundada em 1949, por João Ramos de Vasconcelos César, e instalada em 2 de maio de 1951.

Há uns poucos dias, por solicitação do pai de um aluno, meu amigo, fui apanhar o rapaz no Municipal, onde experimentei desagradável surpresa, ao adentrar o Colégio: o busto de Filgueiras Lima foi dali removido, sem tir-te nem guar-te, e ninguém me soube informar, naquele ensejo, a razão ou desrazão desse ato insólito.

Quero crer, prefiro acreditar – realço – que alguém tenha realmente mandado providenciar uma reforma, proceder a uma limpeza, operar qualquer coisa, a fim de depois fazer retornar a herma ao seu lugar, pois essa peça é fundamental para o enredo histórico do Estabelecimento e, acima de tudo, se trata de uma obra artística que é recheio dos equipamentos da cultura imaterial, próprios de instituições do seu jaez.

Impõe-se repô-la, imediatamente, ou impende a Diretoria oferecer uma explicação plausível para o fato, estando longe de mim apelar para o pensamento de que haja sido furtada, como fizeram várias vezes com a estátua do General Sampaio aqui em Fortaleza, com a Taça do Mundo ganha pelo Brasil em 1958 e tantas outros delitos culturais ocorrentes em terra onde não há dirigentes.

O povo de Fortaleza apela, pois, para a Direção do Colégio, a Secretaria de Educação do Município de Fortaleza e outras instâncias de poder, para que a herma seja devolvida ao seu lugar, onde estava há 49 anos e de onde jamais poderia ter saído!

Assiste razão ao romancista e dramaturgo de França, Alain-René Le Sage, para quem todos gostam das coisas alheias. Este é um sentimento geral, mas a única diferença é a maneira de o fazer. Se assim o fizeram, ainda é tempo de se arrepender. 

De tal modo, a população intenta imediatamente saber: QUE FIM LEVOU A HERMA DE FILGUEIRAS LIMA?!


*Vianney Mesquita 
Escritor e Jornalista. 
Professor adjunto IV da Universidade Federal do Ceará. 
Árcade titular e fundador da Arcádia Nova Palmaciana; 
acadêmico titular das Academias Cearense da Língua Portuguesa e 
Cearense de Literatura e Jornalismo. 
Membro do Conselho Curador 
da Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura, da U.F.C.

sexta-feira, 29 de maio de 2015

NOTAS JORNALÍSTICAS

1
FIEC ANIVERSARIA 
E CONDECORA INDUSTRIAIS

Ocorreu na noite de ontem, 28 de maio, no La Maison Coliseu, no bairro Dunas, em Fortaleza,  a festa comemorativa ao Dia da Indústria, coincidindo com os 65 anos da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC).

Durante o evento o presidente da FIEC, Beto Studart, 10º Membro Benemérito da ACLJ, outorgou a três empresários locais a Medalha do Mérito Industrial, a mais alta condecoração da entidade.

Os homenageados foram Humberto Fontenele, do Grupo Irmãos Fontenele, Ivens Dias Branco Júnior, de M. Dias Branco, e Pedro Lima, da indústria de café Três Corações.

Em suas falas, Beto Studart referiu as dificuldades por que passa a economia do País, que afeta o setor industrial, causadas principalmente pela corrupção generalizada na política brasileira.

Entretanto, teve o cuidado e a elegância de ressalvar as exceções que indicam a regra, frisando que nestas exceções se inseriam os políticos presentes. Compunham a mesa de honra os chefes dos Executivos Municipal e Estadual. Também enobreciam a bancada com a sua presença o ex-presidente da FIEC Roberto Macedo e S.Exa. a Desembargadora Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, Dra. Iracema do Vale.

Exibiu-se vídeo institucional de cada um dos homenageados. Humberto Fontenele referiu-se ao saudoso pai Florêncio, que veio do interior para educar os filhos na Capital e iniciou o negócio de exportação de cera de abelha e carnaúba, e de couros e peles.

Humberto teve que assumir a empresa aos 16 anos, quando o pai faleceu, que ele então expandiu sobremaneira, diversificando a atividade para a curtição do tegumento bovino e ovicaprino, bem como a cajucultura, visando a produção e o beneficiamento de castanha de caju, sempre com vistas ao mercado exterior.

Ivens Dias Branco Júnior exibiu uma bela produção cinegráfica de várias das grandes plantas industriais de M. Dias Branco, enquanto o empresário Pedro Lima discorreu sobre as origens norte-rio-grandenses da família e do negócio, citando os pais, os irmãos e os filhos, alguns dos quais se expressaram no vídeo sobre a empresa.

A ACLJ esteve representada no evento por dois de seus acadêmicos titulares, Hermann Hesse e Reginaldo Vasconcelos, e por quatro de seus Membros Beneméritos.

São eles o ex-governador Lúcio Alcântara, o empresário Ivens Dias Branco (com Dona Consuelo) e o empresário Igor Queiroz, na imagem, ao lado do jornalista Egídio Serpa  além do próprio anfitrião, o atual Presidente da FIEC, Beto Studart. 

A Academia Cearense de Letras também se fez representar por seu ilustre presidente, José Augusto Bezerra, com sua esposa, Dona Bernadete. 


As imagens que ilustram esta nota são das colunas sociais virtuais Balada In, do jornalista Pompeu Vasconcelos, e FRISSON, do portal CNEWS, conforme as respectivas assinaturas.   

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2
JÚLIO PONTE PARA A OAB
UMA CANDIDATURA QUE DESPONTA

O advogado Paulo Maria de Aragão, Titular Fundador da ACLJ, recebeu em seu apartamento na Av. Beira Mar, na noite deste dia 27 de maio, um grupo de professores e de concludentes de Direito das Faculdades Cearenses – FaC, em torno de José Júlio da Ponte Neto, Coordenador do Curso de Direito da referida instituição de ensino superior.


















Alunos: Patrícia Brasil, Paulo Bezerra, Aline Eunice, Cesariny Campos, Franciane Prado, Isteffany Brito, Gardênia Santiago, Anastácio Mesquita, Ivan Fellipe, Luana Barros, Iran Alves (concludente e proprietário da Costa Mendes delicatessen), Cláudio Cid e Marcel Peixoto. Os professores são: Roberto Silvio, Paulo Aragão e Júlio Ponte.

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O fito da reunião era manifestar apoio ao Professor Doutor Júlio da Ponte, atual Presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Ceará – CAACE, que é pré-candidato à Presidência da Ordem dos Advogados do Brasil, OAB, Secção Ceará, em certame previsto para o próximo novembro.






Na imagem, na mesma reunião, tendo ao centro Júlio Ponte, da esquerda para a direita o anfitrião, os juristas Djalma Pinto e Rui Martinho Rodrigues e o advogado e jornalista Reginaldo Vasconcelos, todos confrades da ACLJ. Na sequência, o causídico Gabriel Cavalcante Neto, especialista em Direito Imobiliário, e o Professor Roberto Sílvio. O acadêmico e também advogado Adriano Vasconcelos fez a foto.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

CRÔNICA (VM)


Em Tempo de Viajar nas Calças”
Vianney Mesquita*


Na mocidade, são as viagens uma parte da educação. Na senescência, um componente da experiência. (FRANCIS BACON).


Viagem pedagógica empreendida à Cidade de São Sebastião, tirante escorrego de lembrança, nos finais dos anos 1970, nos levou, a mim e os jornalistas, meu compadre Godofredo Pereira de Sousa, e a repórter Rosânia Farias para um treinamento na TV Educativa do Rio de Janeiro, a fim de conformar, em modus operandi como unidade nacional, os programas informativos das estações de TV afiliadas ao SINRED – Sistema Nacional de Radiodifusão Educativa, conduzido por aquela emissora carioca, da Fundação Roquette Pinto.

Jornalistas de televisão educativa de todo o País  como nós da então TV Educativa- canal 5, hoje, TV Ceará – participaram da dita reciclagem, com o melhor aproveitamento, em razão do excelente planejamento efetivado pela Direção nacional do SINRED – ainda nas mãos de autoridades castrenses, pois não se havia efetivado, ainda, na plenitude, o projeto de abertura política tão anelado pelos segmentos profissionais e populares, sujigados pelos Ai-s e atravancados por uma legislação, ainda vigorante, constituída quase à ponta das botas.

As aulas ocorreram, em parte, em um centro de treinamento da Universidade Estácio de Sá, nas proximidades da cidade do Rio de Janeiro, bem como no Hotel Marialva, localizado na Lapa, na esquina da avenida Gomes Freire de Andrada com rua da Relação, onde as atividades se desenvolveram por uma semana. 

Ali, conheci, entre outros, os jornalistas Nahum Benjamin Sirotski (hoje, com 90 anos e vivendo em Tel Aviv), Luís Carlos Bittencourt, Leda Nagle e Mounir Safatli, Recigrid Rodrigues Campainha (Amazonas) e o conterrâneo Hamilton Alcântara. Com este mantive muito contato, notadamente no que diz respeito às molecagens do Ceará dos anos 1950, especialmente, em relação aos tipos populares de Fortaleza, às estórias engraçadas, como, por exemplo, a vaia ao sol na praça do Ferreira, após dias de chuva, e os apupos ao cantor Cauby Peixoto, quando, paletó róseo, escorregou e caiu com as pernas abertas na frente do Cine São Luís, para gáudio da canalha e, no então presente, recheio futuro do nosso passado. 

Lembramo-nos da estória do Bem-bem, que vendia refresco no Centro de Fortaleza, o qual chegou a visitar Paris, com grande sacrifício e a instâncias dos cordiólogos de ofício, ainda hoje existentes, à exaustão, no Ceará moleque. Essa negrada, após seu retorno da Cidade-Luz, insistiu em que ele substituísse, no cartão de visitas, o seu nome para Bien-Bien – Garapière de Paris, objeto de mofa eterna.

Sempre apreciei por demais as viagens, tanto de mero lazer como a mistura com as de teor universitário, havendo procedido a bom número desses périplos com sentido pedagógico, no Brasil, Argentina, Uruguay e Peru, defendendo trabalhos acadêmicos, bem harmonizadas ao que prescreve na epígrafe desta estória o filósofo e político inglês, autor do Novum Organum (21.01.1561-09.04.1626).


Uma vez jubilado por aposentação – e cá se completa o acima reproduzido pensamento de Francis Bacon  passei a empreender excursões, pelo Brasil e também ao Estrangeiro, aí, às vezes, três por ano, como à Colômbia e Europa quase inteira – Rússia, Espanha, Portugal, Inglaterra, França, Suíça, Itália, Bélgica e mais e mais, conhecendo e curtindo extraordinárias cidades, algumas de nomes pouco referidos aqui, como Gant e Bruges (Bélgica), Cartagena de las Indias e Zipaquira (Colômbia), Haia, Roterdan e Madurodan (Países Baixos), San Petesburgo e Moscou, Berlim, Assis e Siena, Porto e Póvoa do Varzim ... e tantas outras.

Por motivos diversos, a não ser pelo Brasil, a última jornada mais distante ocorreu por França, Holanda e Bélgica, durante 12 dias, em novembro de 2012, havendo cancelado uma, no final do ano passado, a Israel e Jordânia, em razão de atos de terror de gravidade ocorridos no primeiro citado país da Ásia.

Agora, a vontade de viajar é imensa, já estando acertada uma para vários lugares da Europa Ocidental, a ocorrer, Deus querendo, em novembro, com a mulher, meus irmãos e as mulheres, amigos e cônjuges, em número de 12 pessoas.

Em razão desse imenso desejo (por mim expresso) de viajar, retomo a figura do Hamilton Alcântara, que foi há muito tempo embora para o Rio de Janeiro. É filho do Casco Escuro, alcunha do Professor Tancredo Halley de Alcântara – porque bem moreno, e também havia com essa denominação uma cerveja, na época vendida no Ceará, objeto de muita publicidade nos meios locais de comunicação coletiva. 

O tempo foi 1962 e Tancredo postulou vaga para o Senado Federal, concorrendo pela coligação das oligarquias - UDN-PSD-PSP – tendo sido derrotado pelo “Calila”, Carlos Jereissati (PTB), para a Câmara Maior do Poder Legislativo nacional.

No citado treinamento que descerra esta narração, num dia, pela manhã, conversava com o Hamilton Alcântara e, já por volta das oito e meia, à espera do demorado desjejum, ele quase não mais para de rir, ao lhe dizer que estava “em tempo de tomar café nas calças” – moto a que recorri para titular esta crônica.


Dá uma saudade!

   
*Vianney Mesquita 
Escritor e Jornalista. 
Professor adjunto IV da Universidade Federal do Ceará. 
Árcade titular e fundador da Arcádia Nova Palmaciana; 
acadêmico titular das Academias Cearense da Língua Portuguesa e 
Cearense de Literatura e Jornalismo. 
Membro do Conselho Curador 
da Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura, da U.F.C.

NOTA ACADÊMICA


SHIRAN MILTON MOREIRA
COMENDADOR DA ACLJ
RECEBE A MEDALHA BOTICÁRIO FERREIRA


A Câmara Municipal de Fortaleza realizou nesta terça-feira, 26 de maio, às 19h30, no Auditório Ademar Arruda, uma solenidade para a entrega da Medalha Boticário Ferreira ao professor de Judô Milton Nunes Moreira. A autoria da proposta de outorga foi da vereadora Germana Soares (PHS). 
Milton Nunes Moreira nasceu no dia 24 de Janeiro de 1917 em Fortaleza, e, portanto, conta 98 anos. Na juventude trabalhou como sapateiro, alfaiate, instrutor de Jiu-Jitsu, e a partir dos quarenta anos de idade passou a dedicar a vida ao ensino do Judô.
Em 24 de Janeiro de 1967 criou o Centro de Judô Cearense, que depois foi renomeado para Academia Judô Clube Sol Nascente, nome que a instituição tem até hoje.
Milton Moreira é faixa preta de judô, em 9º Dan, o mais elevado grau dos professores, correspondente à faixa especial vermelha e branca, que identifica os “mestres dos mestres”, os quais recebem o título honorífico de “Shiran”, concedido pela Confederação Brasileira de Judô. 
A Outorga da referida comenda, além de prestigiar a figura do nosso professor, prestigiará todos os praticantes do Judô em atividade, assim como a memória daqueles que faleceram durante esta caminhada, da existência do Judô em nossa cidade”, afirma a vereadora na justificativa da proposta da homenagem.
O judô, arte marcial criada pelo japonês Gigoro Kano no início do Século XX, palavra que se pode traduzir do japonês como “modo gentil”, difere das demais artes marciais porque não visa jamais contundir ou machucar, mas apenas tirar o equilíbrio e conter no solo o contendor. 

O judô é prática profundamente educativa para as crianças pequenas, repercutindo no caráter dos futuros adultos praticantes, em virtude da filosofia oriental preconizada pelo criador da modalidade.

Por exemplo, ensinam os mestres de judô a cada um de seus alunos infantis que o dojô (local de treinamento) representa o mundo, e o adversário representa ele mesmo, na sua luta pelo autocontrole vida afora. A reverência ao mestre, a disciplina nos treinos, a elegância dos rituais, o respeito ao adversário tudo isso são corolários nobres do judô.

Na última reunião da Decúria Diretiva da ACLJ o nome de Milton Moreira foi proposto pelo jornalista Vicente Alencar para receber a Comenda Educador Edílson Brasil Soares, reservada aos velhos pedagogos locais, inclusive os que ao longo da vida transmitiram a gerações de cearenses práticas artísticas e desportivas saudáveis, e outros saberes que não constam dos currículos escolares. A propositura foi acatada unanimemente.

A outorga oficial do referido título, e a entrega da correspondente medalha ocorrerão em Assembleia Geral Ordinária da Academia, em 26 de novembro próximo, no auditório da Associação Cearense de Imprensa – ACI, no Centro de Fortaleza.

CRÔNICA (AF)

Graças a Deus!
Altino Farias*



Um fio, uma agulha: difícil passar um por outra. Nova tentativa frustrada. Afinou o fiapo de linha com saliva, e mesmo assim não conseguiu. Olhos gastos, mão trêmula, pensar distante.

Iria cerzir roupas do filho que, desempregado, procurava nova oportunidade de servir a um senhor e precisava boa apresentação. Sem grana para roupas novas, o jeito era arrumar as que tinha. E ela estava ali para isso. Mais uma vez dentre tantas. Aliás, por toda a sua vida.

Enfim, linha na agulha, e logo um dedo furado. Não usava dedal há tempos. Até antes mesmo de o falecido partir para outra. Mais um costume que ficara para trás. Sangue!

Parou. Lágrimas! O sangue trouxe-lhe à memória uma porção de acontecimentos. Coisas da vida de todo mundo, de qualquer um, nada especial.  O tempo ficou congelado por alguns instantes.

Sangramento estancado com o cuidado de não manchar a roupa a consertar, o trabalho seguiu em frente. Um ponto aqui, uma lançada ali, uma aparada em fios soltos, mais um jeitinho de mãe, um leve sorriso. Pronto!

Foi dormir com a ponta do dedo um pouco dolorida, mas nem lembrava mais da agulha a lhe perfurar a pele, apenas queria sonhar com um novo e lindo dia, ainda que a própria vida lhe estivesse por um fio.

Mais uma manhã por vir. Preocupações, pequenas alegrias, dores, limitações, lembranças e mais um “graças a Deus”. Quem sabe teria o privilégio a mais um dia completo, com direito a agulhas a lhe furar as pontas dos dedos e cerzidos perfeitos.


*Altino Farias
Engenheiro Civil - Empresário - Cronista - Blogueiro
Editor do jornal virtual Pelos Bares da Vida
Titular da Cadeira de nº 16 da ACLJ

CRÔNICA (AM)


CAPISTRANO E A PRAÇA
Assis Martins*
                                                                                                          

O verdadeiro dever da História é expor fatos e medidas, e deixar observações e conclusões à liberdade e ao juízo de cada um. (FRANCIS BACON).


Um dos maiores expoentes da historiografia brasileira é, sem dúvida, o nosso coestaduano, de Maranguape-CE (Columinjuba), João Capistrano Honório de Abreu. Foi o mais importante escritor das décadas iniciais do século XX, grande estudioso da História do Brasil, da nossa Geografia e das línguas indígenas. Na sua época, talvez tenha sido a visão crítica mais lúcida dos fatos históricos.

Segundo comentaristas contemporâneos, era um tipo de homem que se enquadrava na categoria de estranho, tanto pela negligência no vestir - tinha sempre uma aparência desleixada - quanto na aversão pelos títulos, honrarias e instituições. Recusou-se até a entrar para a Academia Brasileira de Letras.

Acho que a Prefeitura Municipal de Fortaleza aproveitou o desleixo do Escritor para colocar seu nome e estátua numa das praças mais desprezadas e sujas da Cidade, a da Lagoinha, local onde se encontra a famigerada feira dos malandros, locus de encontro de marginais e ponto prostitutas, desembocadura de objetos roubados e reduto de vendedores informais, tangidos de outros logradouros citadinos.

E eis o nosso mestre, de pé, no meio daquele caos estabelecido. As suas pernas servem de apoio para a amarração de lonas que cobrem toscas barracas, enquanto outras estruturas capengas se equilibram junto ao seu pedestal, dificultando aos passantes a visão da figura ilustre.

Durante o dia, há um constante cruzamento de gente honesta com vivaldinos e aproveitadores no comércio de todo tipo de mercadoria: calçados, roupas, alimento para todos os gostos, desde milho cozido e panelada crua, até marmitas prontas, misturadas com mil bugigangas.

Ao pé da estátua do celebrado autor da Capítulos da História Colonial, além  do movimentado vaivém, também há dramas anônimos, como o epílogo do romance de Dolores e Zequinha. Foi briga feia, com xingações mútuas! E, se não fosse a intervenção de amigos, a coisa teria descambado para o noticiário policial. O amor deles começara havia dois anos quando se conheceram, coincidentemente, à sombra de outra estátua, a de D. Pedro II, na praça da Sé, onde trabalhavam como feirantes.

Não foi amor à primeira vista, e sim a prazo, pois fazia tempo que se cruzavam, quase sempre pela manhã, na hora da grande disputa por um melhor lugar para a exposição das mercadorias. Em pouco tempo, já tinham juntado os pequenos haveres e dividiam o mesmo espaço; ela com os seus bordados e ele com todo tipo de miudezas. As escapadas do Zequinha e a ciumeira da Dolores deram início a constantes pegas que tiveram o desfecho na cena de quase pugilato da praça da Lagoinha.

Como essa história, outras se juntam a essa roda-viva da miséria. Aqui, um sapateiro diligente espalha seus instrumentos de trabalho na calçada e se vira como pode no atendimento aos poucos clientes; mais além, um esperto banca o jogo da pretinha, com um olho no freguês e o outro na possível chegada da polícia; a vendedora de marmitas não tem tempo para ouvir as gaiatices dos malandros, e por aí continua a ebulição daquele universo...

Quantos casos serviriam de tema para estudos de sociólogos e literatos!

No centro da Praça, tal qual uma ilha cercada de pobreza e lixo, nosso Capistrano alonga um olhar sobre aqueles tristes destinos, enquanto da sua base saem cordas que seguram barracas malfeitas e provisórias, em cujo abrigo labutam seres acostumados com a sujeira e sem qualquer perspectiva [...]

Nota: Ilustração do saudoso Audifax Rios.


*Assis Martins 
Funcionário da U.F.C.
Cronista e Ilustrador. 
Bacharel em Geografia e Tecnologia e Gestão do Ensino Superior 
pela Universidade Federal do Ceará.

ARTIGO (PMA)

A POESIA COTIDIANA
Paulo Maria de Aragão*


Lia-se, certa vez, que “a felicidade é uma pausa na inquietação da vida”. A felicidade é feita de pequenos momentos. A vida é breve. O epicurista Horácio "Odes" (I, 11.8), no sentencioso carpe diem, insta-nos a aproveitar o dia com trabalho, dedicação e nobreza, cumprindo deveres para com os nossos iguais e para com o Estado.  

A pérola inspirativa horaciana celebrizou-se no filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, exortada pelo professor John Keating aos seus alunos: alentava-os de que o sentimento crítico, criativo e pensante aprimorava vidas, estimulando-os na leitura, nas paixões e nos escritos poéticos. Emoldurava a poesia e o romance como uma das formas de exaltação do amor e de entender o absolutamente nada da matéria que se desfaz com a transitoriedade existencial.

As rosas são belas e extasiam ao desabrochar, mas exigem cuidados com as ervas daninhas e pragas para não murcharem de súbito. Tudo passa... A poesia não suaviza apenas na palavra escrita ou verbal, manifesta-se ainda nas inspirações cotidianas, exteriorizadas nas mais diversificadas nuanças. Uma triste pausa aos que, em genuflexo, acreditam que a moeda compra a felicidade  ilusão bancada por um deus inútil e enganoso.

A vida é dádiva a ser fruída em todos os momentos e de formas fecundas. O exercício das ciências não se deve cultivar com soberba ou tendenciosidade. O ideário carpe diem leva-nos a questionar pessoas brônzeas, enfermas pelo ódio, inveja e aquelas que se dizem poder tudo na vida entregues à hediondez. Decadentes e mumificadas vagueiam robotizadas de ouvidos acurados no tilintar das moedas e no alarido falso de aplausos. Outras, retratam a escória corrupta e de corruptores. “Sociedade dos Poetas Mortos” fez história e contrapõe-se à insolência dos que abalam os alicerces morais da sociedade.

Seria utopia? Talvez, mas o é pelo amor fraternal e romântico que se dignifica, dissociado da idolatria e do endeusamento. As palavras e ideias podem mudar o curso da história. Os homens, cujos desejos são ilimitados e as ambições desmedidas, entregam-se ao desespero, como o fez o imperador macedônico Alexandre Magno, ao lamentar a falta de reinos para conquistar.

Por ser finito e irrecuperável, o tempo não deve ser desperdiçado. Se curtos os momentos, exultem-se os sentimentos. A sabedoria exorta que devemos considerar as coisas boas por sua intensidade e não pelo tempo que duram. Ora, esse é o real espírito carpe diem: aproveitar cada detalhe na sua essência. A beleza deve ser contemplada, mas não erigida a valor supremo, pois, como tudo ao nosso redor, um dia ela acaba.

Relembrem-se as palavras do carismático professor Keating: “carpe diem, carpe diem...” ao recomendar aos discípulos aproveitarem o dia com muito amor  aprendendo a pensar por si mesmos  símbolo imorredouro e inconfundível de fé, antes que o tempo voraz os consumisse.


* Paulo Maria de Aragão 
Advogado e professor 
Membro do Conselho Estadual da OAB-CE
Titular da Cadeira nº 37 da ACLJ

ARTIGO (RMR)

A TEMPESTADE PERFEITA
 Rui Martinho Rodrigues*



A economia está num pântano: gestão temerária, imprevidência e convicções improdutivas. Faltam investimentos. Serviços de saúde, educação e transporte sucateados. A segurança pública se encontra em triste situação. Políticas sociais não encontram amparo financeiro necessário à sustentabilidade. A desindustrialização ameaça. 



A inflação ataca. A recessão arreganha os dentes. Os juros mais altos do mundo se associam às tarifas públicas em disparada. A carga tributária já não comporta acréscimos. A austeridade não encontra apoio no cenário político.

Não existem lideranças. Falta credibilidade. Falta iniciativa. Falta proposta. Falta razoabilidade aos aspirantes à liderança. Temos uma proposta para sanear finanças, tarefa de bombeiro diante do incêndio. Mas não temos nada para além do sinistro. A governabilidade está ameaçada. Não temos propriamente um presidencialismo de coalizão, mas de cooptação. Os partidos se dissolveram. As lideranças assim consideradas optaram por substituir a fundamentação em evidências pelo convencimento e os aplausos fáceis. A sociedade foi convencida de que o bem-estar social pode ser alcançado, bastando para tanto ter vontade política, conforme o mais puro voluntarismo.

Isso serviu para satanizar governos e próceres do passado e para embasar promessas fáceis, como a “modicidade tarifária”. Surfar na prosperidade vinda de fora, aproveitando a herança favorável deixada pelos “vilões” que sacrificaram a própria popularidade no altar do equilíbrio das finanças públicas, completou o convencimento da maioria da sociedade de que milagres fazem parte do mundo da economia.

Falou-se muito em milagre no tempo em que o Brasil cresceu a taxas superiores a dez por cento ao ano. Mas tínhamos altas taxas de investimento e sabíamos de onde vinham os recursos: superávit fiscal, embora a carga tributária fosse muito mais baixa, e empréstimos. A atual crise foi gestada por um quadro muito mais milagroso. Não tínhamos investimentos; infraestrutura ruim; e recursos humanos qualificados escassos. A economia sofria intensa reprimarização. Mas tínhamos “pleno emprego”, embora os saques do seguro desemprego fossem altos. O consumo explodia e a renda aumentava, sem que a produtividade justificasse tal coisa. Isso é que era milagre!

O mais grave é falta de solução no horizonte. Temos um governo que se passa por oposição e uma oposição que se passa por governo. Assim, não temos oposição nem governo. Temos insatisfação na sociedade, sem termos quem a represente, nem canais institucionais para encaminhá-la. Empurrar com a barriga, usar paliativo, minorar os aspectos mais dramáticos da crise e culpar alguém pelas dores do ajuste é o que está posto. Com a proximidade das eleições as medidas de austeridade serão varridas, a gastança voltará e tudo continuará como dantes no quartel de Abrantes?

A tempestade perfeita é a crônica de uma morte anunciada. A solução, porém, ainda não foi apregoada. Não com credibilidade e razoabilidade.


*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado 
Historiador - Cientista Político
Presidente Emérito da ACLJ 
Titular da Cadeira de nº 10