segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

ARTIGO - Cultura, Religião e Política (RMR)

CULTURA,
RELIGIÃO E
POLÍTICA
Rui Martinho Rodrigues*

  

Religião e política se relacionam desde sempre. Crimes contra o Estado, na Grécia Antiga, era um delito religioso contra a divindade protetora do Estado (Arno Dal Ri Júnior, em “O Estado e seus inimigos”). A legitimidade fundada na representação popular afastou o direito divino dos reis e contribuiu para o advento do Estado laico. Guerras religiosas, causando severas perdas humanas e materiais, desencorajaram o argumento confessional como base da legitimidade política. O falibilismo de John Locke (1632 – 1704, “Cartas sobre a tolerância”), abriu caminho para o reconhecimento da divergência e da alternância de tendências políticas no Poder. 

O Estado laico, porém, não veio proibir manifestações confessionais, mas tornar livres todos os cultos, dissociando-os do processo de legitimação da política e da obrigação de seguir algum culto adotado pelo Estado. A Revolução Francesa, feita contra o trono e o altar, favoreceu o deísmo, em detrimento do teísmo, promovendo a descristianização da França (Dicionário crítico da Revolução Francesa, de Mona Ozouf, 1931 – viva; e François Furet 1927 – 1997). 

A tolerância foi praticada pela Revolução Gloriosa de 1688, na Inglaterra. A Revolução Francesa prometeu fraternidade, mas abusou da guilhotina e, embora seja vista como laica, praticou o proselitismo deísta, reprimindo o teísmo, introduzindo assim uma religião civil, política ou secular. Usamos a categoria teórica religião de Thomas O’Dea, 1915 – vivo, “Sociologia da religião”), que conceitua religião como uma cosmovisão dotada de radicalidade, totalidade e transcendência. Estes três atributos podem prescindir do teísmo e até do deísmo. 

A proposta de tolerância e inclusão de um certo laicismo de hoje, como a “fraternidade” e a “liberdade” revolucionárias dos franceses, que abusou da guilhotina e reprimiu o teísmo cristão, prega tolerância, diversidade e a inclusão, mas procura limitar a cidadania de cristãos, como se estes cidadãos não pudessem exercer plenamente a cidadania. A ética da responsabilidade e a ética da cidadania (Karl E. Maximilian Weber, 1864 – 1920), a primeira na vida privada e a segunda no exercício do múnus público, conciliam a participação de cristãos com o Estado laico. A representatividade política, esteio da legitimidade democrática, só tem a ganhar com a participação na vida pública de cidadãos integrantes dos diversos grupos sociais, inclusive das correntes confessionais. Grupos confessionais estatisticamente sub representados nas instituições democráticas, não constituem ameaça. Exclui-los da cidadania plena não se harmoniza com a democracia. 

O Estado laico é garantia de liberdade de culto para todos os grupos confessionais. Não pode ser invocado para restringir a liberdade de consciência ou discriminar negativamente algum grupo específico. Na França, atualmente, em nome do Estado laico, retiraram uma cruz de um monumento e os estudantes foram proibidos de usar símbolos religiosos. O trânsito de veículos, porém, pode ser proibido para a realização de cultos islâmicos. A quebra da isonomia revela a discriminação oculta sob o argumento laico.

Não se pode questionar a crença de postulante a cargo público. Até a obrigação de serviço militar respeita a objeção de consciência (lei 4.375/64) e isso nunca foi contestado. Na sabatina de um indicado para o STF, não se discutia tal coisa. Não se debate a filiação confessional dos atuais ministros do STF, nem sequer no tocante às religiões civis, que tratam de concepções políticas. Uma maioria parlamentar confessional, que optasse pelo desarmamento civil ou por abolir a pena de morte, teria a legitimidade da democracia representativa. O laicismo não afasta a representatividade, dentro dos limites das garantias constitucionais. A cultura da intolerância e da exclusão não se insinua só no meio das religiões eclesiásticas. As religiões civis são até mais intolerantes e excludentes.

 

PREFÁCIO - Língua-Mãe do Código Lusitano (VM)

LÍNGUA-MÃE
DO CÓDIGO LUSITANO
[Prefácio de S.P.Q.R. – Latim Jurídico, de A. C. Campolina – Belo Horizonte-MG]
Vianney Mesquita* 





 
 

Somente o influxo da arte comunica durabilidade à escrita; só ele marmoriza o papel e transforma a pena em escopro. [RUI BARBOSA de Oliveira]. 

 

Constitui registo lamentável, fator impeditivo do estudo etimológico do Português – uma das mais destacadas codificações neolatinas e precursora da Língua de Hélio Melo e Carlos Drummond de Andrade – o fato de haver sido a disciplina Latim retirada do currículo médio brasileiro, carreando prejuízo formidando para o exame mais acurado do Regramento luso-linguístico, no que concerne à formação vocabular, ao conhecimento da Gramática Histórica, alcance do desenvolvimento humano, não só atinente às diligências linguísticas, mas também compreendendo, pela expressão da História, todo o trajeto da espécie humana pela Mãe-Terra (Arnold Toynbee). 

Na sua aurora, o Código Latino, procedente de vários patois praticados no Lácio e que se ajuntaram para constituir uma codificação maior, perfazia somente um dialeto itálico, praticado na Roma e em toda a mencionada Região latina, bem como no vale do rio Tibre. 

Num magnífico crescendo, já feito língua, o Latim granjeou enorme expansão, apropriando e modificando falares parecidos e assimilando codificações estranhas da Península Itálica, vindo a instituir um dos brotos da família indo-europeia, sendo, contudo, ao juízo dos estudiosos, menos flexível do que a língua grega, com sufixos pesados e sem riqueza vocabular. Para indenizar tais imperfeições, entretanto, essa conjunção expressional é robusta, clara e concreta, adaptando-se à enunciação das leis, sentenças morais e inscrições. 

O de caráter puro foi falado apenas na Roma Antiga, assim mesmo pela população do Lazio, particularmente de Roma, tendo se tornado, no entanto, a língua oficial de todas as nações submetidas e a única literária, salvante o Grego. 

No derradeiro estádio, de linguagem morta, o Latim foi sempre a codificação oficial da Igreja Católica, Apostólica Romana, não apenas no âmbito do Estado da Cidade do Vaticano, mas, também, em todo o orbe terrenal, acrescendo-se o fato de que as produções científicas, filosóficas e teológicas remansaram quase exclusivamente redigidas nessa craveira idiomática, até os Oitocentos e muitas até os Novecentos. 

Como curiosidade histórico-linguística, fartamente inventariada, na sua maioria, em obras de domínio público  havendo registos de controvérsias, entanto já aquietadas – o texto latino mais antigo descansa numa legenda, datada em 500 anos a.t.p. (antes do tempo presente), insculpida na célebre Fíbula de Ouro de Preneste, a Palestrina atual, cidade do Lazio, Província de Roma, hoje com 16.469 habitantes. 

Peça depositada no Museu Etnográfico Pré-Histórico Luigi Pigorini, de Roma, a Fíbula foi mostrada em 1887, pelo arqueólogo Wolfgang Helbig. Advieram dúvidas, através dos tempos, acerca da veracidade da informação da Fibule Praenestina, todavia, conforme adiantei há instantes, o assunto restou pacificado em 2011, mediante estudo de Edilberto Formigli e Danielle Ferro (e equipe), dando conta, em definitivo, da verdade expressa pelo mencionado arqueólogo alemão (1839-1915). 

As fíbulas são broches que unem duas partes de um vestuário, tendo sido numa delas que o artesão escreveu, em palavras grafadas da direita para a esquerda, Manius me Fecit Numerio = Manos (o artesão) me fez para Numerio (o cliente). 

A Língua latina possui subdivisões, como nos exemplos sequentes. 

– Latim clássico, ao compreender a produção de escritores no tempo dessa erudição, de mais ou menos 75 a.t.p. a 200 do t.p. , hoje ainda usado nas gramáticas e dicionários. 

– Latim popular ou vulgar, base dos sistemas glotológicos neolatinos modernos, de sintaxe mais simples, falado pelas classes populares. 

– Baixo Latim ou Latim bárbaro – experimentado em fala e escrita depois da queda do Império Romano e no curso da Idade Média, com termos latinos e vocábulos estranhos, gramaticalmente indisciplinado. 

Com efeito, uma vez procedidas a estas aligeiradas informações históricas – consoante reclamado quando feri esses comentários – em decorrência de uma reforma adulterina procedida na educação nacional, cujo mentor de bestunto tão estreito escuso-me de referir, foi o ensino da Língua e Literatura Latina proscrito dos curricula do antigo Curso Ginasial, fato representativo de incalculável prejuízo ao culto, cultivo e aprimoramento da última flor romana, de Olavo Bilac. 

Língua-mãe, também, de vários outros ordenamentos glossológicos – línguas, idioletos e patois – deriva do Latim a maior parte das formações vocabulares do Português e das mencionadas ordens linguísticas, motivo por que o estudo, entendimento e diacronia do Idioma patrial tem como fontes inexauríveis as sistematizações românicas, ora oficialmente inacessíveis à massa, porquanto banida das escolas como matéria basilar. 

Há, contudo, no Brasil, alguns dos seus discípulos que não acataram a espúria determinação e embatem-se diuturnamente pelo retorno do Latim às grades curriculares dos estabelecimentos, no entanto, até agora, sem ressonância nas oitivas moucas das autoridades de instrução do País. 

Um desses poucos – o que conheço e de cuja amizade me ufano de privar – é o Prof. Antônio Carlos Campolina, filho do mestre ubaense José Dias Campolina, coluna de retidão e de sabedoria e que tem no rebento, cuja pátria também é Ubá-MG, o continuador de sua obra de lente do Latim, em São Paulo, em Minas Gerais e em alguns estados do Nordeste. 

Qual o último abencerrage de François-René Auguste de Chateaubriand, Campolina, desde alguns anos, se larga da sua BH por Minas Gerais inteira, Ceará e Piauí e, ultimamente, pelo Estado do Paraná – procurando, com os raros cursos que monta, sensibilizar, mediante contatos pessoais após longuíssimos chás de cadeira, sem “um café” nem “uma água” e via imprensa, as “autoridades” a reintroduzirem a matéria nas escolas, num mourisco trabalho apostolar em favor de matéria que jamais morreu. 

Somente ele sabe as necessidades pelas quais transita, as evasivas e grosserias que ouve, os parcos dinheirinhos que às vezes nem recebe, o sofrimento, enfim, em favor de uma disciplina absolutamente necessária como propedêutica das matérias de Língua, Literatura e Cultura brasileira e portuguesa. 

Pelo que de útil e agradável denota, a obra do professor Antônio Carlos Campolina – S.P.Q.R. Latim Jurídico – um livro recomendado pela OAB-MG – chega ao leitor noutra e renovada edição, comprovando o alcance admirável que o volume representa para as pessoas ávidas pelo estudo do Latim em todo o Brasil. 

O livro S.P.Q.R. – Latim Jurídico representa a exteriorização de peleja do Professor Antônio Carlos Campolina nessa queda de braço desigual, batalha ainda não vencida; mas, na certeza de um dia atravessar o Rubicão, ele já teve a ensancha de exprimir, como o fez Júlio César: – Alea jacta est! E depois a Farnaces II, rei do Ponto, perto de Zela, no ano 47: – Veni, vidi, vici! 

Já veio, viu e haverá de vencer – é o que todos os seus amigos, ex-alunos e admiradores esperamos. 

Faz anos que a sorte está lançada, entretanto, os dados dessa ludicidade de bozó e caipira tão custosos ainda não caíram...

O tempora, o mores! 

 

sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

NOTA ACADÊMICA - Reunião de Natal da ACLJ

 ACLJ
REUNIÃO NATALINA


Doze acadêmicos da ACLJ se reuniram na noite de terça-feira, dia 21, na Tenda Árabe, para assinar a Ata de conclusão do II Census ad Lustrum, e para marcar a primeira oportunidade de se comemorar o natal, superados os maiores rigores sanitários da pandemia de Covid.



Além do Presidente Reginaldo Vasconcelos, estavam presentes o Secretário-Geral Vicente Alencar, o Primeiro e o Segundo Secretários Altino Farias e Adriano Jorge e o Diretor-Tesoureiro Paulo Ximenes, completando a Diretoria da ACLJ.

Além deles, o Membro Correspondente Dennis Clark, em visita a Fortaleza, além dos acadêmicos Djalma Pinto, Amaro Penna, Humberto Ellery, Sávio Queiroz, Pedro Araújo e Edmar Ribeiro, o que por acaso perfez o exato número dos apóstolos de Jesus.

Essa analogia sugere que haja no grupo quem represente Judas Iscariotes, aquele capaz de beijar e trair, o que não se verifica neste caso. Esse seria o décimo terceiro, dentre aqueles que confirmaram presença e se omitiram. 

Aliás, registre-se a justificada ausência dos Decuriões Arnaldo Santos, acometido de gripe, Rui Martinho Rodrigues, em viagem rodoviária a Sergipe, com a Professora Josefina, e Aluísio Gurgel, com a sua mulher em visita à filha que mora no Qatar. 

Também justificaram ausência Cândido Albuquerque e Vianney Mesquita, ambos comprometidos com a confraternização de natal da Reitoria, e o convidado Marcelo Melo, nosso comendatário, que se recupera de uma apresentação musical em praia próxima, trabalho que o deixou afônico e esgotado. 

Especialmente a confreira Luciara Aragão, que, impossibilitada de comparecer, passou antes para deixar votos de feliz natal e deixar presentes ao pé da árvore de natal – ouro, incenso e mirra.         

Todos os presentes falaram sobre a importância histórica do evento natalino, que evoca o clima de família e de amizade, o espírito de solidariedade humana e de enlevo espiritual, com inspiração nos preceitos cristãos. 

 





Pedro Araújo fez uma bela homilia, e Humberto Ellery disse um soneto autoral narrando liricamente o momento do nascimento de Jesus, quando Maria iria parturir um dos mais importantes mensageiros das forças anabólicas do Universo, e fê-lo em modesto ambiente, sobre um humilde comedouro de animais.
 

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O Berço do Rei
Humberto Ellery


 O casal de judeus bateu à porta
De pensões, estalagens, residências, 
Em busca de abrigo. Mas quem se importa de hospedar judeus, sem referências?
 
A Mulher, em gravidez adiantada, anunciou que o Nascimento estava perto. 
O Homem, sem pensar em nada, 
Saiu em busca de um lugar coberto. 
 
De repente um abrigo de animais.
Um telheiro a proteger vacas e bois.
Naquele abrigo se alojaram em Paz. 
 
Onde nasceu uma criança loura. 
Tanta pobreza que o Rei dos Reis
Teve por berço uma manjedoura.

 


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MINHA MENSAGEM DE NATAL
Pedro Bezerra de Araújo

Todos os anos, comemoramos o Natal, que acontece no final de dezembro, abrindo as portas de um sempre novo ano. 

O nascimento de um menino único e especial, na história da humanidade, que pisou nosso solo, sentiu nossas alegrias, nossas dores, nossas emoções e presenciou nossas fraquezas, nossos erros e nossos pecados. Este menino é o aniversariante de 25 de dezembro. Não importa a efetividade da data, senão o evento. 

Qual o anúncio dos anjos: “Pax in terra hominibus bonae voluntatis”, a celebração é dirigida às pessoas de boa vontade, que queiram aderir à vinda deste Redentor. Ele recebeu presentes – ouro a simbolizar Realeza, incenso a falar de Divindade e a mirra a significar Imolação. 

Muitos mortais buscam ser reis e deuses, porém, somente Deus – eterno e imortal – quis ser Homem, conviver conosco e nos abrir portas de paz, de amor, de fraternidade, de esperança e de fé. Ele não é um presente, Ele está presente, faz-se presente na vida de cada um de nós, mantém-nos a todos e à irmã natureza, com todas as suas criaturas. 

A fragilidade de uma criancinha, deitada numa manjedoura, num cocho e ladeada de animais, contrasta com o ‘poder’ dos homens, que escraviza, injusticia e miserabiliza. Ele veio para todos, para ser alimento de nossa fé, de nossa esperança, de nosso amor. 

Ele veio nos assegurar que o céu começa aqui e agora. O aniversário marcante de sublimidade excepcional nos propicia momento de olhar para esta Criança, fazer uma avaliação da atenção e do abrigo que Lhe temos dado em nossa vida, do valor que esta Criança tem, de verdade, no nosso dia-a-dia, de tal modo que nossos sorrisos, nossos abraços, nossas ofertas natalinas não se desgastem na ebriedade de copos cheios, no prazer de corpos vazios e na mesquinhez de ideologias assolapantes e cruéis.

Este menino é o mesmo Jesus da crucifixão e da ressurreição: nossa Páscoa. 

Deus nasce e renasce cada dia que Lhe abrimos a porta de nossa mente e a janelas de nossos corações: trocamos, então, o egoísmo pela fraternidade, o ódio pelo amor e a guerra pela paz! 

Feliz Natal às pessoas de boa vontade!


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A experiência gastronômica da noite se constituiu nas opções de arroz de camarão e arroz de carneiro, dois risotos característicos das praias e dos sertões do Ceará, respectivamente, preparados com grande esmero culinário. 



        

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

CONTO - Condolências (RV)

 CONDOLÊNCIAS
Reginaldo Vasconcelos*



 

Querido afilhado.

Venho de parabenizar-te nesta data, pelo privilégio de teres privado tão longamente com o Haroldo, durante vinte três anos e seis meses, toda a tua idade de hoje. 

Homem íntegro, boa praça, bom poeta, excelente pescador de caniço, grande conselheiro, inigualável paciência com mulheres e crianças, por mais tempo foi ele meu amigo que teu pai, mas teve contigo muito mais intensa convivência. Ele se foi e tu estás triste. Eu sei e compreendo. Acredite: nada é mais natural e previsível. 

Contudo, deves lembrar-te de que a morte não celebra exclusividade com ninguém. Todos nós, cedo ou tarde, chegaremos a ela. É uma questão de tempo. E isso não é nenhuma tragédia. Esperemos que lá, mais perto de Deus onde talvez esteja agora, o Haroldo possa mexer nos cordões do destino para que, por cá, não experimentemos nós muitos e grandes sofrimentos. 

O sofrimento, sim, é extraordinário e desnecessário. A morte, ao contrário, é a coisa mais banal do mundo. Se o nosso Haroldo estivesse sofrendo agora sofreríamos com ele, porque o sofrimento não tem lirismo e não tem graça nenhuma. Mas a morte, que é a negação da matéria, é pura poesia. 

Sentiremos falta dele? Certamente. Mas, tu que o conheceste tão bem, que sabes do seu ânimo e do seu gênio, podes estar com ele em pensamento. Podes confidenciar-lhe fatos e podes consultar-lhe opiniões. Se fores honesto e isento, receberás as respostas certas, as mesmas que receberias dele em vida. Provocarás discussões, ouvirás conselhos, contarás anedotas e até obterás dele aquela sua maravilhosa gargalhada. 

Por outro lado, temos que nos conservar vivos por mais tempo. Temos que viver por ele. Há uma hipótese de que através de nós os nossos grandes afetos que partiram possam vir gozar a vida. Penso que talvez cada um deles nos deixe na alma uma delegação expressa para desfrutar as benesses todas em seu nome. Se de fato estiverem dormentes sob a terra, e não brilhando no infinito... Ora! Dentro de nós eles não morrerão nunca. 

“Cerveja que tomo hoje é apenas em memória” – como diz o poeta mineiro. Na verdade, já faz tempo que não tenho prazeres por mim mesmo. Desde que grandes amigos se foram, é sempre por eles que me regalo. Sento-me numa mesa servida com linguiças Maranguape, fritas, cebola refogada, mando vir uma Brhama muito fria e então faço a convocação usando uma antítese, brincando com o amigo que se foi e que não vejo: “Sente-se Leonardo, e vamos sofrer um pouco!”. 

Ora se não foi pelo meu tio Luciano que pisei pelas calçadas geladas da Europa, que ele conhecia melhor que minguem, dos livros e dos filmes, mas que nunca visitou porque tinha medo de avião! 

Já vi viúvas encolerizadas com os maridos por tê-las deixado, e até entendo. Entretanto, não concordo com os que nutrem compaixão pelos que morrem. A piedade é para os vivos, que encontram o sofrimento, e não para os mortos. Portanto, não te apiades do Haroldo. Também não tenhas dó de ti mesmo, que isso não faz sentido algum. 

Há trinta anos tínhamos quatro avós, há sessenta tivemos oito bisavós, há noventa dezesseis tataravós, e essa conta chega a milhares entre os contemporâneos de Cabral. Vai aos milhões da antiguidade à pré-história. Todo esse contingente nasceu, viveu e procriou para que pudéssemos viver hoje. 

Venceram pragas, pestes, feras, mares, guerras, fomes, para que pudéssemos vir aqui. Se tivermos pena de nós mesmo feriremos todos eles. Todos somos, pois, vitoriosos. Mesmo que vivamos um só dia já seremos um grande troféu da humanidade. E nós temos cumprido a nossa missão. Então, onde há júbilo não cabe compaixão. 

Por fim, transmita à comadre as minhas condolências, que somente a ela é cabível condoer-se. Não há palavras que possam confortá-la. A morte do Haroldo lhe traz novamente as dores de um parto, e executado às avessas, como outro poeta concebeu, pois por muito longo prazo ela ficará pesadamente grávida de mágoas e lembranças. A menos que mais cedo, sendo a comadre ainda jovem e formosa, apareça alguém minimamente competente para proporcionar-lhe a délivrance. 

De tua parte, como filho, caberá desincumbi-la das obrigações do matrimônio, que ela tanto honrou, desfeito apenas pela morte, conforme querem as Escrituras. Falo de homem para homem: além de mãe, ela agora é uma mulher carente e livre. É preciso abstrai-la do santo hábito de Maria para enxergá-la em carne e osso. A virtude não é privilégio dos solitários, e a solidão é um dos grandes castigos da velhice. 

Receba a benção do padrinho.

  

Entrementes, quanto a mim, nesse particular, nada tenho a fazer. Eu e o Haroldo tínhamos um pacto realmente, firmado desde o movimento estudantil, quando apostávamos a liberdade e a vida contra os poderes federais: se um de nós sumisse, o outro lhe assumiria a companheira. Contudo, o compromisso está vencido. Não poderia mesmo trazer a comadre à minha cama e fazer aquela ironia, brincando com o amigo que se foi e que não vejo: “Deite-se conosco Haroldo, e vamos sofrer um pouco”.


Nota do autor. Esse conto exótico, em forma epistolar, e com um adendo do autor que não se integra na missiva, compunha uma lista tríplice para um concurso no Ideal Clube de Fortaleza, em 2013. A comissão não selecionou  este texto, que permaneceu inédito até hoje, quando então foi encontrado entre alfarrábios. 

20.12.2021.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

CRÔNICA - Manoel, Hector e Muitos Outros... (TSC)

 MANOEL,
 HECTOR E
MUITOS OUTROS...
Tales de Sá Cavalcante* 

 

A vida do Manoel Lima poderia gerar um livro.  De bem com a vida, tinha pouca escolaridade e muita inteligência. Suas “tiradas” seriam momento hilariantes do sonhado livro. Trabalhava para a nossa família como caseiro na Prainha do Canto Verde, no Litoral de Beberibe (Ce). 

De certa feita, direi as cédulas do bolso e, a cada serviço necessário, entregava-lhe a respectiva importância, bem como o seu salário. Quando observei que todas tinham se ido, pilheriei: 

– E agora, Manoel? O dinheiro acabou. 

Imediatamente veio o seu comentário: 

– Não, Doutor. Assim que chegar à Fortaleza o Senhor pega outro bolinho de dinheiro. 

Ao saber do seu ingresso numa nova seita, provoquei-o a testar sua fé e disciplina: 

– Manoel, será que, na hora do dízimo, se você der menos que o estabelecido, Deus vai notar? 

E veio a rápida resposta: 

– Deus está ouvindo a nossa conversa. 

Manel, como era chamado, gostava de tomar “umas”. Após separar-se da mulher, passou a tomar também “outras”. E “outras”. Em certo dia, ouvi do fiel caseiro:

– Deixei de beber. 

– Por quê? – indaguei – ao que ele respondeu: 

– Quando a gente bebe, a grana não dá. 

Depois de algum tempo, encontrei-o “mais pra lá do que pra cá”. Perguntei-lhe o porquê da volta à bebida e ouvi: “Cheguei à conclusão de que, se eu beber ou não a grana não dá”. 

Uma vez, a prosa ficou triste. Deu-se ao lhe arguir se havia passado fome na infância. Ao ouvir um forte “sim”, inquiri: 

– E o que você fez? 

Mais forte ainda ouvi: 

– Nada. 

Relembrei esse diálogo ao me emocionar com o tocante cartão de natal do “guri” Hector, meu conterrâneo, por ser do Rio Grande do Sul, terra de minha mulher Jaqueline. Ele não pediu brinquedos ao Papai Noel, senão carne para passar o natal com a família.

O Ceará também tem seus “Hectors sem carne” e seus “sem-tudo”. Com uma riqueza inferior ao do Rio Grande do Sul, estamos num crescendo ao contrário deles. É que, há muito tempo, somos felizes em escolher bons gestores públicos, o que não ocorreu por lá, na maioria das últimas eleições. Vem aí 2022. O Ceará, que já é modelo na educação pública e privada, pode igualmente sê-lo na votação.

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

RESENHA - Reunião Virtual da ACLJ (13.12.2021)

  REUNIÃO VIRTUAL DA ACLJ
   (13.12.2021)




PARTICIPANTES

Estiveram reunidos na conferência virtual desta segunda-feira, que teve duração de uma hora e meia, 07 acadêmicos.   

Jornalista e Advogado Reginaldo Vasconcelos, o Bacharel em Direito e Especialista em Comércio Exterior Stênio Pimentel (Maricá - RJ), o Advogado e Sionista Adriano Vasconcelos, o Médico, Professor, Filósofo e Latinista Pedro Bezerra de Araújo o Agrônomo, Pesquisador e Professor Luiz de Morais Rego Filho, o Juiz Emérito, Professor e Advogado Aluísio Gurgel do Amaral Júnior (Doha - Qatar)  e o Agrônomo e Poeta Paulo Ximenes.
  

TEMA DE ABERTURA

Na abertura da reunião desta segunda-feira, o tema foi o II Census ad Lustrum da ACLJ, processo quinquenal de reestruturação da entidade, que está em curso do dia 05 ao dia 20 de dezembro. É o resgate de uma prática adotada pelos governantes da Roma Antiga, que vigorou por muitos séculos. 




OUTRO TEMA DISCUTIDO

Na sequência, se debateu a campanha vacinal no Brasil, a eficácia das vacinas experimentais, a juridicidade da vacinação compulsória, em face das normas constitucionais e dos preceitos democráticos, bem  como a obrigatoriedade do passaporte sanitário, considerando a excepcionalidade e o estado de emergência provocado pelo ataque pandêmico de uma doença desconhecida da ciência.

 

PERFORMANCE  CULTURAL

Aluízio Gurgel leu um poema que ele compôs no voo entre o Brasil e o Qatar, aonde foi visitar a filha Janaina, advogada, e o neto infante, Benjamim, que lá residem, onde o seu genro grego foi exercer a sua profissão, e lá esse núcleo familiar se radicou. O poema, como o título denuncia (Duas Mulheres), é de inspiração uxório-filial. 




DEDICATÓRIA 

A reunião virtual da ACLJ realizada nesta segunda-feira, 13 de dezembro, foi dedicada a dois membros da ACLJ.



Ao empresário Beto Studart, nosso Membro Benemérito. que realizou, na última quinta-feira, dia 09, o evento denominado "BS Christimas", na Praça BS, no BS Design.


Essa festa teve como convidadas especiais pessoas que tiveram deficiência auditiva, e após se submeterem a implantes auditivos e próteses, ouviram pela primeira vez um show com músicas natalinas.



 

Ao Magnífico Reitor da UFC Cândido Albuquerque, nosso Membro Titular Fundador, pelo lançamento de um projeto tecnológico inovador, uma plataforma própria para o diploma digital. 

Nesta segunda-feira, dia 13, o Reitor Cândido Albuquerque assinou o primeiro lote de diplomas digitais, inaugurando o resultado de uma iniciativa revolucionária de sua gestão à frente da UFC.