UM BALANÇO DA MODERNIDADE
Rui Martinho Rodrigues*
A modernidade é laica. Adotou o
codinome de humanismo para fugir da inquisição, ocultando o seu antropocentrismo.
Dessacralizando o mundo permitiu o estudo de cadáveres e a busca de explicações
naturais para a realidade. Graças a ela a liberdade de consciência desabrochou
à sombra do laicismo. A ciência e a tecnologia se desenvolveram. O direito
divino dos reis desapareceu. As liberdades políticas se fortaleceram. A economia
adotou a racionalidade que resultou em prodígios na produção de bens e
serviços. Visar o lucro, mudar de patrão e emigrar deixou de ser pecado.
a Segurança jurídica e a democratização, como a liberdade
de consciência e de expressão foram então beneficiadas. Empreendimentos puderam deslanchar. Trocas específicas, sistema de preços, mercadorias facilitaram o cálculo
econômico, viabilizando investimentos.
Produtividade e economia de escala reduziram custos. Surgia a economia capitalista: propriedade privada dos meios de produção, trabalho livre e assalariado, produção para o mercado, lucro como motivação.
Produtividade e economia de escala reduziram custos. Surgia a economia capitalista: propriedade privada dos meios de produção, trabalho livre e assalariado, produção para o mercado, lucro como motivação.
Modernidade reunia conceitos
universais e uma gnosiologia com verdade e erro discerníveis. A lógica
aristotélica era prestigiada, embora a Física do estagirita tenha sido
substituída pela newtoniana. A busca das universalidades levou a Revolução Francesa
a proclamar uma declaração dos direitos do homem, não dos franceses. Todos eram
iguais perante a lei, sem igualdade na lei, em atenção à realidade;
particularismos do Direito Medieval foram repudiados.
Modernos eram Newton; o princípio da
impessoalidade e da publicidade dos atos administrativos; o Estado laico,
baseado na neutralidade axiológica; as distinções entre a verdade objetiva de
proposições singulares, conjecturas das generalizações teóricas, erro e mentira.
Isso antes que o relativismo gnosiológico e ético da pós-modernidade
transformasse tudo numa geleia geral.
A modernidade reduziu o analfabetismo,
a mortalidade infantil, a fome endêmica, empurrou o escravismo para a esfera do
crime e liquidou o colonialismo. Aumentou a escolaridade média, a expectativa
de vida, popularizou os bens e serviços que representam conforto e qualidade de
vida. Mulher, criança, deficientes físicos, doentes mentais e minorias
comportamentais ganharam status mais
favorável. Todos os indicadores de qualidade de vida melhoraram como tendência
das sociedades modernas.
O determinismo reducionista e
economicista levou a mudança do nome: a sociedade moderna passou a “sociedade capitalista”,
como se a economia capitalista automática e necessariamente tornasse a
sociedade toda capitalista, conforme preleciona Martin Kriele.
Os benefícios da modernidade nos campos da ciência, tecnologia, instituições
jurídicas e políticas, o crescente acesso ao conforto material foram negados.
Dizia-se que havia pauperização. Os fatos desmentiram o empobrecimento. Então o
desfrute de comodidades passou a “consumismo”. O bem-estar da modernidade
passou a “conquista” de lutas políticas, como se tais lutas não tivessem sido
viabilizadas pela modernidade.
A “novilíngua” confundiu modernidade
com cupidez e falta de escrúpulos, embora tais coisas existissem séculos antes
da modernidade e do “modo de produção capitalista” engendrado por ela.
Don Quixote precisa de um vilão para
combater e uma Dulcineia para salvar.
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