A UTOPIA
Rui Martinho Rodrigues*
Apresentada como um norte para um
mundo melhor, uma sociedade apolínea, as utopias são sedutoras. Formulá-las é
tarefa de intelectual. Ele é o salvador, é o intelectual ungido, como diz
Thomas Sowell. Não segui-lo é considerado sinal de desorientação.
Nenhuma utopia confessa o que pretende
fazer com a dissidência, não admite a existência de divergência. Acha-se ela
própria tão maravilhosa ao ponto de ninguém resistir aos seus encantos. Quem
não acolhe os seus objetivos é ignorante, é alienado. Deve ser doutrinado.
Persistindo a resistência é malvado. Deve ser destruído. É obstáculo à
realização do maravilhoso projeto. Mas utopias não falam nisso. A única utopia
sincera o bastante para dizer o que fará com os dissidentes é a celestial, que
confessadamente reserva o inferno para eles.
Não obstante a presunção de
superioridade moral e intelectual dos utopistas, lhes falta experiência
histórica bem sucedida ou não seria utopia. A existência dos projetos de
salvação supostamente laicos não vai além do mundo onírico. As maravilhosas
promessas, porém, têm o condão de legitimar, como base na pseudoética dos fins,
os meios mais torpes. Todas as grandes indignidades se fizeram em nome de
causas maravilhosas. Só as utopias têm o poder de matar milhões.
Elas têm o DNA das revoluções.
Oferecem um mundo novo e melhor. Apesar de nada começar do zero. A “grande
solução” anda de mãos dadas com a violência e o controle, para remover os
obstáculos ao “mundo melhor”. Os seus arautos apontam culpados, propõem
castigos, têm horror ao contraditório. Daí a ideia de controle “social” da
mídia. Revolucionário é golpista. Não cabe distingui-los dos golpes sob a
alegação de que têm a “chave da história” para o “mundo melhor” e são altruístas.
A tal chave da história, além de colecionar fracassos, é ideológica, não é científica. O suposto altruísmo é camuflagem para o que
Nietzsche chamou de "vontade de potência". É sede de poder. É justificativa do
totalitarismo.
(Publicado na edição de 30.06.2015 do Jornal O Povo)
(Publicado na edição de 30.06.2015 do Jornal O Povo)
*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Polític
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