segunda-feira, 13 de julho de 2015

ARTIGO - O Sanatório Geral (RMR)


O SANATÓRIO GERAL
Rui Martinho Rodrigues*

A desorientação da sociedade é crescente. A pós-modernidade é relativista no plano cognitivo e no axiológico. É lugar comum dizer que não existe verdade, sem distinguir entre verdade lógica, objetiva, moral e ontológica. Alguns acrescentam o adjetivo “absoluta”, como ornamento da frase. As imposturas denunciadas na obra de Alan Sokal e Jean Bricmont, “Imposturas intelectuais”, deram uma aparência de razão ao relativismo laxista.

A impostura faz da Física relativista e da teoria quântica fatores de validação do relativismo. É o sofisma platônico do mito da caverna. Consiste em desqualificar o senso comum, que muita vez é bom senso, para intimidar a resistência da sociedade às teses mais absurdas. O golpe funcionou. Tornamo-nos niilistas, hedonistas e desorientados.

Sem compromisso com a lógica, amparados na impostura, adotamos o moralismo “politicamente correto”, intolerante e conflitivo, em nome da tolerância e da paz. Acirram-se os conflitos, desqualifica-se quem resiste aos “novos gestores da moral”, que curiosamente, são relativistas, niilistas e hedonistas. O senso comum e a experiência histórica são maliciosamente confundidos com preconceito, embora se trate de juízo moral concernente  ao que se sabe o que seja. Registre-se que preconceito é um juízo de valor referido a algo que não se conhece. Por isso é pre + conceito, por ser anteposto à experiência.

Justifica-se a irresponsabilidade enquanto se repudia a austeridade. A Grécia, seguindo a desorientação relativista, gasta mal o dinheiro dos outros. Mas acha injusto pagar pelo desfrute. Lógica pós-moderna ou “quântica”. Portugal, Espanha e Itália fizeram ajustes, equilibraram as contas e estão crescendo. 

Nós parecemos querer seguir a Grécia. A cada dia acrescentamos gastos na conta da “Viúva”, sem o cuidado de identificar a fonte das despesas. Valemo-nos de sofismas contábeis para afirmar que as contas estão equilibradas. As nossas dívidas e despesas atuais não decorrem de investimentos em estradas, indústria de base e hidrelétricas, configurando despesas de capital. Agora são as despesas correntes que estão na origem do desequilíbrio das contas públicas. 

Adotam argumentos sequenciais, fundados no bem-estar social prometido. Desprezam, porém, as formas historicamente capazes de promover o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, franqueando os seus benefícios a parcelas cada vez maiores da sociedade; que reduziram o analfabetismo e a mortalidade infantil; maior tempo médio de escolaridade; maior acesso aos bens e serviços, mais liberdades individuais e mais garantias para as minorias. Estas contradições se “resolvem” com a Física relativista. O fundamento de resultado não ampara, na experiência histórica, as teorias do desfrute sem esforço e o sucesso pleno para todos.

Sem nenhum constrangimento em contradizer-se, adotam-se uma legitimação baseada no imperativo categórico kantiano, na qual o dever vale por si mesmo, independentemente das consequências do seu cumprimento, mesmo sendo sequencialistas. A situação é vista por Norberto Bobbio como perigosa, por engendrar uma demanda explosiva de direitos, implodindo as instituições.

*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Político

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